Em busca da carta perfeita
Levantamento feito por EXAME RESERVA mostra quais são os restaurantes brasileiros com as melhores adegas
Da Redação
Publicado em 12 de outubro de 2010 às 18h15.
No restaurante Fasano, templo sagrado da alta gastronomia paulistana, o estoque de 4 500 garrafas de vinho está confinado em um espaço especialmente projetado para receber as bebidas. Ali, temperatura, umidade e luminosidade são rigorosamente controladas. O chão é revestido de madeira mole para que qualquer preciosidade que por ventura escorregue das mãos do sommelier não se quebre. No Cantaloup, também em São Paulo, a adega faz parte da decoração e do charme da casa. A estrutura foi construída com dois móveis de 5 metros de altura por 4 de largura, protegidos por uma porta de vidro duplo com vácuo no meio para evitar que a diferença térmica com o ambiente externo embace sua superfície. No Locanda della Mimosa, em Petrópolis, no Rio de Janeiro, o proprietário, Danio Braga, escavou um buraco de 8 metros abaixo do solo onde cabem 30 000 garrafas. "Quando se faz uma adega, a regra é pecar pelo excesso, nunca pela carência", diz Braga. O espaço acabou se tornando um dos mais visitados do restaurante. "Todos são bem-vindos, desde que entrem acompanhados e sem carregar saca-rolhas."
O Fasano, o Cantaloup e o Locanda são apenas alguns exemplos de restaurantes que têm devotado ao vinho atenção especial. Não só o armazenamento e a seleção das bebidas se tornaram um cuidado indispensável em restaurantes de primeira linha como a velha filosofia de cobrar margens exageradas por cada garrafa está em baixa -- embora ainda longe de ser extinta. Para ajudar na tarefa de beber bem fora de casa -- sem necessariamente pagar caro demais por isso --, EXAME RESERVA avaliou alguns dos melhores restaurantes do país. Nessa empreitada, contou com a Associação Brasileira de Sommeliers (ABS). O primeiro passo foi escolher os estabelecimentos que guardam em suas adegas os melhores rótulos. Dessa seleção inicial saíram dez restaurantes. O passo seguinte foi comparar os preços do que é servido nesses estabelecimentos com o que o consumidor paga nas importadoras pelos mesmos produtos. Na média, a diferença ficou em 45%. Os vinhos mais caros têm margens proporcionalmente menores (34,6%) e os rótulos de maior demanda são, em média, 56,3% mais caros nos restaurantes.
MISTURA EQUILIBRADA
O destaque do levantamento ficou por conta da rede Rubaiyat, comandada por Belarmino Fernández Iglesias Filho, com três unidades em São Paulo. Para gerenciar suas 10 000 garrafas (média de dez unidades por rótulo), a rede tem uma equipe de oito pessoas dedicadas ao trabalho -- um quarto do pessoal administrativo. "É preciso verificar os estoques, retirar da carta o que estiver em falta e negociar os preços com os fornecedores", afirma Iglesias Filho. Já agraciada com prêmios como "a melhor carta de vinhos", de Veja São Paulo, e Best of Award of Excellence, da revista americana Wine Spectator, a rede tem uma combinação imbatível: carta ampla e rigorosamente selecionada (1 000 rótulos de todas as regiões do mundo) e preços supercompetitivos. Segundo o proprietário, a margem cobrada pelas garrafas varia de 10 a 25 reais. Embora a reportagem de EXAME RESERVA tenha encontrado variações ligeiramente maiores em alguns casos, como a do argentino Catena Malbec, um dos campeões de venda da rede (84 reais no restaurante e 54 reais na importadora), entre os dez vinhos de maior saída do grupo Rubaiyat, a margem média foi de 24 reais. Há exemplares em que o preço dos restaurantes chega a ser praticamente igual ao da importadora. O chileno Escudo Rojo, um dos mais pedidos, custa 80 reais no A Figueira Rubaiyat e 79 reais na Casa do Porto, que traz o produto para o Brasil.
No badalado D.O.M., do chef popstar Alex Atala, as margens também estão longe de ser extorsivas. Entre os dez rótulos de maior saída, a diferença de preço em relação ao que a importadora cobra de um cliente é 35% (nos dez mais caros, 33%). Há ótimas pedidas, como o champanhe Veuve Clicquot Brut (218 reais no restaurante e 190 reais na importadora) ou o chileno Don Melchor 1999, top da vinícola Concha y Toro (249 reais no D.O.M. e 248 reais na importadora). Para quem pode gastar mais, o francês Château Petrus da safra de 1999 sai por 6 500 reais. Em uma importadora, o exemplar de 1997 é encontrado por 6 000 reais. "É impossível pensar em uma grande mesa sem um bom vinho", afirma Atala.
Um dos maiores segredos das melhores adegas do país é conseguir oferecer uma mistura equilibrada de vários tipos de vinho (tintos, brancos, espumantes, de sobremesa, fortificados), estilo, país, uva, safra e, por fim, preço. Até mesmo os restaurantes mais sofisticados mantêm em suas cartas opções, digamos, mais econômicas. Tome o caso do Fasano, um dos mais luxuosos templos da gastronomia do país. Apesar de todo o glamour da casa, nem lá os vinhos caríssimos saem como água. Só 20% das vendas são compostas de rótulos acima de 200 reais. Os top de linha, com preços acima de 1 000 reais, representam apenas 5% dos pedidos. A maioria das vendas -- cerca de 60% -- é de vinhos de 120 a 200 reais. Os 15% restantes são dos rótulos mais baratos da carta, encontrados por preços ligeiramente inferiores a 100 reais. "Temos de oferecer aos clientes a maior e melhor variedade possível", afirma Manoel Beato, sommelier do Fasano.
Na hora de decifrar a carta, é importante que o cliente considere a experiência completa que o restaurante proporciona. Apreciar um grande Malbec argentino desfrutando da carne perfeita do Fogo de Chão, em São Paulo, um Bordeaux com a inventividade de Alex Atala ou um Barolo com a alta gastronomia do Fasano é completamente diferente de tomar essas mesmas garrafas na própria sala de jantar -- a menos que se tenha o privilégio de contar com um cozinheiro do mesmo nível desses estabelecimentos.
Um brinde à economia | ||
Veja quanto os restaurantes com as melhores cartas de vinho do país cobram a mais do que as importadoras(1) | ||
Nos vinhos de maior saída | Nos vinhos mais caros | |
Rede Rubaiyat (SP) | 27% | 46% |
D.O.M. (SP) | 35% | 33% |
Cantaloup (SP) | 38% | 28% |
MIO (RJ) | 43% | 37% |
Vento Haragano (SP) | 47% | 46% |
Fogo de Chão (SP) | 48% | 19% |
Fasano (SP) | 67% | 4,5% |
Piantela (Brasília) | 73% | 20% |
Terzetto (RJ) | 77% | 38% |
Locanda Della Mimosa (RJ) | 108% | Importação própria |
Média dos vinhos mais vendidos 56,3% acima do preço das importadoras |
Média dos vinhos mais caros 34,6% acima do preço das importadoras |
Média geral 45,4% acima do preço das importadoras |
Fontes: indicação pessoal de Arthur Azevedo, presidente da ABS, e levantamento de EXAME |
(1) Cálculo feito sobre uma amostragem de dez dos vinhos de maior consumo e dez dos vinhos mais caros das cartas de cada um dos restaurantes em comparação com os mesmos vinhos nas importadoras. Por não contemplar toda a carta e estar sujeitos a aproximações, incluindo comparação de vinhos de safras diferentes, os valores devem ser interpretados apenas como uma indicação, não como resultados exatos |