Idealizado pelos pesquisadores americanos Robert Kegan e Lisa Lahey, o conceito de imunidade à mudança ajuda a entender por que tentamos mudar hábitos, atitudes ou processos organizacionais e, ainda assim, enfrentamos diversas barreiras.
A resistência à mudança está profundamente relacionada a crenças inconscientes e padrões comportamentais que dificultam o progresso individual e coletivo.
Para Thianne Martins, especialista com 16 anos de experiência em comunicação e 10 anos dedicados ao desenvolvimento de lideranças, destacou que a imunidade à mudança é um sistema de proteção interno. Ele funciona como um “cofre psicológico”, mantendo crenças e comportamentos que já foram funcionais no passado, mas que hoje dificultam a adaptação a novas demandas.“Quando tentamos mudar, o sistema dispara alarmes que nos fazem voltar para comportamentos conhecidos, ainda que eles não sejam mais úteis”, explicou Thianne, durante sua participação no Exame Talks, série de palestras exclusivas para os alunos dos MBAs da Faculdade EXAME.
Vencendo as crenças limitantes: como superar a resistência à mudança
Segundo Thianne, crenças limitantes são ideias profundamente enraizadas que moldam a forma como vemos o mundo e reagimos a ele.“Elas foram úteis em algum momento da nossa vida, mas acabam cristalizadas como verdades absolutas," contou. "Por exemplo, acreditar que pedir ajuda é um sinal de fraqueza pode dificultar a colaboração no ambiente corporativo."Em seu livro "Imunidade a mudanças", de 2009, Kegan e Lahey propõem um exercício de quatro etapas para explorar, diagnosticar e superar essas crenças:
- Identificar o objetivo de melhoria: definir um aspecto que se deseja mudar. Exemplo: 'quero ser um líder mais colaborativo';
- Reconhecer comportamentos contraproducentes: analisar ações que sabotam o alcance desse objetivo, como centralizar tarefas ou evitar delegar responsabilidades;
- Explorar os compromissos ocultos: identificar medos e preocupações associados à mudança, como o receio de parecer incompetente ao delegar tarefas;
- Descobrir pressupostos subjacentes: compreender as crenças fundamentais que sustentam esses medos, como “se eu não controlar tudo, perderei o respeito da equipe”.
A metodologia de Kegan e Lahey mostra que muitas vezes confundimos sintomas do problema com o problema em si. Isso resulta na aplicação de soluções superficiais que não enfrentam os medos e crenças mais profundas, limitando o progresso.
Dividir e conquistar
Após mapear os desafios, é importante transformar o conhecimento em ação. Para Thianne, uma das estratégias mais eficazes para superar a imunidade à mudança é realizar pequenos testes comportamentais. Por exemplo:
- Um líder que centraliza tarefas por medo de parecer incompetente ao delegar pode começar delegando uma pequena responsabilidade e observando os resultados;
- Alguém que procrastina por medo de falhar pode iniciar uma tarefa simples, mesmo sem sentir que é "o momento perfeito";
- Quem evita exposição por meio de julgamentos pode pedir feedbacks sobre um projeto em andamento e aceitar respostas sem se justificar.
“Esses testes ajudam a confrontar crenças limitantes sem disparar os alarmes do sistema. Se você acha que delegar fará com que as pessoas o vejam como menos competente, comece com uma tarefa menor e observe os resultados," cravou. "É uma maneira segura de expandir o ‘cofrinho’ das suas crenças.”
Outro ponto relevante é adotar a consistência como um valor-chave no processo de mudança. Thianne enfatizou que mudanças reais não acontecem da noite para o dia.
“O segredo está em fazer pequenos ajustes consistentes, testando seus limites e ouvindo as vozes internas, mas sem deixar que elas o impeçam de avançar.”
Assim, a mudança fica mais gerenciável e menos assustadora, o que reduz o risco percebido pelas "vozes internas" que resistem à mudança.
Lidar com a imunidade à mudança é um convite à complexidade.
“É uma jornada para se entender melhor, abraçar o desconforto inicial e criar um ambiente mais alinhado ao aprendizado contínuo e à adaptação,” finaliza Thianne. “A imunidade à mudança é forte, mas a capacidade humana de se reinventar é ainda maior.”