ESG

As espiãs de Churchill, ESG e a luta das mulheres

Mais de 80 anos depois do fim da Segunda Guerra, as mulheres ainda passam por provações para demarcar seu espaço, assim como a espiã Virginia Hall, retratada no filme de Lydia Dean Pilcher

 (Johner Images/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 30 de outubro de 2021 às 10h08.

Última atualização em 30 de outubro de 2021 às 10h24.

Renata Faber e Juliana Machado*

Um dos maiores méritos do cinema é jogar luz sobre questões que afligem a sociedade e, não por acaso, o que hoje entendemos como ESG tem os seus representantes na sétima arte. Aquilo que no mercado financeiro conhecemos como critérios ambientais, sociais e de governança corporativa aparece com frequência em filmes que tratam das desigualdades entre as pessoas – e é nesse rol que certamente está o filme A Call to Spy (“As espiãs de Churchill”).

O filme, dirigido por Lydia Dean Pilcher, conta a história de mulheres que foram enviadas pela Inglaterra para a França durante a Segunda Guerra Mundial, para atuar como espiãs. Baseado em fatos, a trama é um bonito e envolvente relato histórico sobre uma parte da Segunda Guerra Mundial e o importante trabalho das espiãs. Mas, se olharmos o filme também sob a ótica da (des)igualdade entre homens e mulheres, percebemos que muitos dos problemas enfrentados por essas mulheres na década de 1940 ainda estão presentes no mundo corporativo, mesmo 80 anos depois.

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A ideia de mandar mulheres como espiãs para a França ocupada surgiu porque elas levantariam menos suspeitas, mas ainda não era um consenso de que essa era uma boa estratégia. “Boa sorte para vocês”, teria dito Churchill aos líderes do projeto ao saber sobre suas novas espiãs.

Decidido que a Inglaterra iria mandar espiãs para a França, foi preciso discutir o treinamento que essas mulheres receberiam. Depois de certa resistência, elas seguiram, mas, durante o treinamento, alguns homens se mostraram surpresos. O comentário inevitável foi: “teremos bonecas para brincar”.

O filme também nos apresenta a espiã Virginia Hall, uma mulher com uma impressionante história. Antes da guerra, Virginia sofreu um acidente que fez com que uma de suas pernas tivesse de ser amputada do joelho para baixo, sendo substituída por uma prótese de madeira. Virginia tinha o sonho de ser diplomata, mas foi recusada por várias vezes pelo governo americano em função de sua deficiência física. Virginia foi a única mulher civil a ganhar a Cruz de Serviços Distintos por seus esforços de guerra e, em 1951, ingressou na CIA.

Todo o argumento do filme nos revela o tamanho dos desafios enfrentados por mulheres para provar que tinham condições de executar o seu trabalho como qualquer pessoa. Mas o que o filme também nos revela é que, 80 anos depois, mesmo em um momento histórico já fora dos excessos da guerra, as mulheres ainda passam por provações para demarcar seu espaço.

Para ficar no tema mercado financeiro, onde o assunto ESG ganhou muita força recentemente, inegáveis foram os avanços. Mas caminho a pavimentar é o que não falta. As mulheres são mais de 50% da população brasileira, mas ainda representam somente 28% do total de investidores da bolsa. Um pouco mais nos bastidores, o Financial Times publicou em junho deste ano estudo que informava que chefes homens tinham uma tendência maior a fingir empatia ao gerenciar mulheres. O levantamento, realizado com 79 mulheres de bancos, consultorias, fintechs e gestoras de Londres, foi apoiado por grandes bancos do Reino Unido, como Goldman Sachs, Barclays e Citi, e produzido pela ONG Women in Banking and Finance em conjunto com a London School of Economics (LSE).

A baixa presença das mulheres em ambientes historicamente dominado por homens é assunto tão relevante que a CFA Institute tem incentivos para que mulheres tirem a certificação emitida pela entidade, uma das mais cobiçadas e respeitadas globalmente. Atualmente, só 10% do quadro dos certificados são mulheres.

É notório que hoje as mulheres já tenham chegado longe, ocupando cargos relevantes nas instituições. Mas dentro e fora do mercado financeiro, está dado que estamos só no começo de uma longa jornada até o pleno reconhecimento das mulheres em relação aos homens. No filme de Dean Pilcher, como na vida real, as mulheres precisavam não apenas trabalhar bem, mas mostrar que deveriam ser medidas pela mesma régua que avalia seus colegas homens porque são plenamente capazes de executar um bom trabalho. Durante o treinamento no filme, a avaliação da espiã Noor Khan dizia que ela era “infantil e sonhadora”, enquanto Vera Atkins, oficial de inteligência britânica, insistiu: “Ela é boa no trabalho dela, isso que importa.” É o que esperamos deixar cada vez mais para as mulheres das próximas gerações.

*Renata Faber é head de ESG na EXAME. Formada em administração de empresas pela Fundação Getulio Vargas, trabalhou por 20 anos no mercado financeiro. Juliana Machado é analista CNPI e integra o time de análise de fundos de investimento do BTG Pactual digital. É jornalista formada pelo Mackenzie, com pós-graduação em economia brasileira pela Fipe-USP. Atuou com análise e seleção de fundos de investimento na EXAME e escreveu por quatro anos para o Valor Econômico, nas áreas de governança corporativa e bolsa de valores. Escreve para a EXAME Invest quinzenalmente.

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