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Veto de França e Rússia pode obrigar EUA a atacar à revelia da ONU

França, Alemanha e Rússia fizeram uma declaração conjunta nesta quarta-feira (5/3) afirmando que não deixarão passar no Conselho de Segurança da ONU uma resolução que autorize o uso de força contra o Iraque. A declaração, feita dois dias antes do encontro decisivo do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre o desarmamento iraquiano, pode obrigar […]

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h55.

França, Alemanha e Rússia fizeram uma declaração conjunta nesta quarta-feira (5/3) afirmando que não deixarão passar no Conselho de Segurança da ONU uma resolução que autorize o uso de força contra o Iraque. A declaração, feita dois dias antes do encontro decisivo do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre o desarmamento iraquiano, pode obrigar os Estados Unidos a agir sozinhos. Se isso acontecer, estará inaugurada uma nova era nas relações internacionais.

A partir de sexta-feira, o Conselho de Segurança se reúne para examinar mais um relatório dos inspetores da ONU e discutir novas medidas para desarmar o país. O possível veto franco-russo a uma resolução pró-guerra põe os Estados Unidos contra a parede. O governo americano acredita ter 9 dos 15 votos no Conselho de Segurança para aprovar uma resolução favorável ao ataque. Se não conseguir isso, nem pretende apresentar uma nova resolução. Com cerca de 300 mil soldados na região, o país parece decidido mesmo a usar a força contra Saddam Hussein, ainda que França ou Rússia usem o poder de veto.

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Depois de se reunir em Paris, os ministros das Relações Exteriores da França (Dominique de Villepin), Alemanha (Joschka Fischer) e Rússia (Igor Ivanov) pediram que as inspeções sejam aceleradas e que o Conselho de Segurança divulgue um plano de desarmamento. "Nessas circunstâncias, não vamos deixar passar uma resolução que opte pelo uso da força", disseram eles. A Rússia e a França, membros permanentes do Conselho, afirmaram que "assumirão todas as responsabilidades sobre isso". O que, supostamente, incluiria o veto a uma resolução pró-guerra. O russo Ivanov disse ainda que a China também compartilha a posição dos três países.

Na Casa Branca, o porta-voz do governo americano, Ari Fleischer, afirmou que o presidente George W. Bush está confiante de que o pedido de uso de força contra o Iraque passará pelo Conselho de Segurança e que a resistência desses países não representa necessariamente um veto. O secretário de Estado americano, Colin Powell, afirmou que os Estados Unidos estão dispostos a seguir em frente sozinhos, à força se necessário, para desarmar Saddam Hussein. Powell disse que Saddam está tentando dividir as opiniões dos membros do Conselho de Segurança. "Há divisão de opiniões entre nós", disse ele. "Se essas divisões continuarem, eles convencerão Saddam Hussein que ele está certo. Mas asseguro que ele está errado."

Certo e errado não são, normalmente, palavras aplicadas ao pragmático mundo das relações internacionais. Um ataque americano à revelia do Conselho de Segurança da ONU poria em xeque a própria credibilidade das Nações Unidas. Inauguraria uma era em que a maior potência do planeta se dá o direito de agir sem aprovação das instituições que, em tese, foram criadas para contrabalançar o poderio militar das potências e tornar legítimas as ações tomadas em nome da segurança do planeta. Seria no mínimo irônico que, a pretexto de controlar o risco de um ditador usar armas de destruição em massa, a maior potência nuclear do planeta tivesse de desrespeitar as instituições criadas para garantir a legitimidade desse tipo de ação. Quais as conseqüências disso, caso esse cenário se materialize? Impossível prever.

Os objetivos dos Estados Unidos com um ataque parecem claros: substituir o regime ditatorial e desafiador de Saddam Hussein por algo mais palatável aos interesses americanos na região. Também parece claro o interesse americano em enfraquecer a União Européia, mantendo aberto o fosso entre Inglaterra, Espanha e Itália, favoráveis à ação, e França Alemanha, contrárias. Só não parece claro hoje que configuração poderia assumir a geopolítica mundial depois de um ataque americano à revelia da ONU. Estaríamos caminhando para um mundo imperial dominado por uma única potência? Seria reaberta uma espécie de Guerra Fria entre América e Inglaterra versus França, Rússia, Alemanha e China? E, nessa confusão toda, o que deveria fazer um país como o Brasil?

Até o momento, nenhuma dessas perguntas tem resposta. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou nesta quarta-feira (5/3) que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva telefonou para o primeiro-ministro britânico, Tony Blair. O Reino Unido, o maior aliado dos Estados Unidos na questão iraquiana, também já enviou tropas ao Golfo. Na conversa de 30 minutos, afirmou Amorim, ambos concordaram com a busca por uma solução pacífica e com a necessidade de obedecer às exigências do Conselho de Segurança. "Evidentemente todos preferem uma solução pacífica, todos preferem uma solução multilateral e uma solução que assegure o desarmamento do Iraque. Nisso, acredito que há um apoio quase que absoluto", disse o ministro brasileiro.

Lula manifestou a Blair a preocupação com o impacto de uma guerra contra o Iraque. "O presidente salientou que essas preocupações são de ordem política, humanitária, e também, no caso do Brasil, de ordem econômica. Isso porque uma deterioração do clima econômico mundial -que já ocorre- tem impacto sobre o Brasil e dificulta o esforço de recuperação que está sendo feito internamente, com participação e sacrifício de todos", disse Amorim.

Segundo o ministro, apesar da guerra iminente, a iniciativa brasileira é válida e sensibiliza os países diretamente ligados à decisão sobre a guerra. "Creio que tem que se lutar até o último minuto para buscar solução pacífica. Enquanto não é dado o primeiro tiro, creio que existe tempo para se tentar. (...) É importante que os líderes dos países que têm mais influência no momento, sobretudo os que fazem parte do Conselho de Segurança da ONU, conheçam as preocupações de outros países", afirmou.

Na segunda-feira (3/3) o chanceler alemão, Gerhard Schroeder, havia telefonado ao presidente brasileiro para discutir a questão. Na semana passada, o tema foi abordado em conversa com o presidente francês, Jacques Chirac. Amorim afirmou que, na conversa com o líder alemão, não se falou na possibilidade de o governo brasileiro assinar documentos. Mas Lula disse ser a favor de dar mais tempo aos inspetores da ONU que trabalham no Iraque. Só que o otimismo de Lula corre sério risco de ser atropelado pelos fatos.

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