Economia

Venezuelanos começam a pesar dinheiro em vez de contar notas

O bolívar, que chegou a ser uma das moedas mais fortes do mundo, agora é um estorvo. Para fazer qualquer compra é preciso levar centenas de notas

Venezuela: as pessoas colocam pilhas de dinheiro nas mochilas e se aventuram pelas ruas assoladas pelo crime e os lojistas guardam o dinheiro em caixas e gavetas que transbordam (Getty Images)

Venezuela: as pessoas colocam pilhas de dinheiro nas mochilas e se aventuram pelas ruas assoladas pelo crime e os lojistas guardam o dinheiro em caixas e gavetas que transbordam (Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 1 de novembro de 2016 às 11h46.

Última atualização em 31 de março de 2017 às 14h43.

No balcão de uma mercearia no leste de Caracas, Humberto González retira as fatias de queijo branco salgado da balança e as substitui por uma pilha de notas de bolívares entregues pelo cliente. A moeda está tão desvalorizada e cada compra exige tantas notas que, em vez de contá-las, ele prefere pesá-las.

“É triste”, diz González. “A esta altura eu acho que o queijo vale mais.”

Esse é também um dos sinais mais claros de que a hiperinflação pode estar tomando conta de um país que se recusa a publicar dados de preços ao consumidor regularmente. Não é em todo lugar que estão pesando o dinheiro, mas isso está se popularizando, o que lembra cenas de alguns dos episódios de hiperinflação mais caóticos do século passado: a Alemanha depois da Primeira Guerra Mundial, a Iugoslávia na década de 1990 e o Zimbábue uma década atrás.

“Quando começam a pesar dinheiro, esse é um sinal de que a inflação está fora de controle”, disse Jesús Casique, diretor financeiro da consultoria Capital Market Finance. “Mas os venezuelanos não sabem exatamente como está a situação porque o governo se recusa a publicar números.”

Mochilas cheias de dinheiro

O bolívar, que chegou a ser uma das moedas mais fortes do mundo, agora é um estorvo. Para fazer qualquer compra é preciso levar centenas de notas. As pessoas colocam pilhas de dinheiro nas mochilas e se aventuram pelas ruas assoladas pelo crime e os lojistas guardam o dinheiro em caixas e gavetas que transbordam. Diante da falta de dados oficiais, os economistas precisam adivinhar qual é a taxa da inflação. As estimativas para este ano vão de 200 por cento a 1.500 por cento.

Até agora, com o bolívar afundando, o governo se recusava a imprimir notas de maior valor. A nota de 100 bolívares – a maior do país – vale menos do que dez centavos de dólar.

No entanto, algumas semanas atrás, o governo solicitou discretamente a cinco empresas que apresentassem ofertas para imprimir bolívares de maior valor – 500, 1.000, 5.000, 10.000 e talvez 20.000 –, segundo uma pessoa com conhecimento direto do pedido.

As notas deveriam estar prontas a tempo para pagar as bonificações do Natal. Normalmente, uma encomenda dessas leva de quatro a seis meses para ser entregue e, por enquanto, nenhuma oferta foi escolhida. A fim de minimizar tempo e custos, o governo está considerando trocar apenas a cor, não o layout, das notas atuais, e acrescentar zeros, disse a pessoa. O banco central disse que não faria comentários.

Pablo Escobar

Enquanto isso, pessoas como Bremmer Rodrigues, 25, gerente de uma padaria no subúrbio de Caracas, não sabem o que fazer com seus sacos de dinheiro. Todos os dias a padaria recebe centenas de milhares de bolívares, que ele esconde pelo escritório até embalá-los para depositar no banco. Ele disse que se alguém o visse, poderia confundi-lo com um traficante.

“Eu me sinto como Pablo Escobar”, disse ele. “É uma montanha de dinheiro, cada dia mais.”

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