Uso de debêntures para reestruturar dívida cresce
O crescente uso das debêntures nas renegociações de um volume recorde de dívida, em meio à crise, está chamando a atenção do Banco Central
Da Redação
Publicado em 19 de junho de 2016 às 15h30.
São Paulo - O crescente uso das debêntures nas renegociações de um volume recorde de dívida, em meio à profunda crise econômica que assola o País, está chamando a atenção do Banco Central , apurou o Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado.
Isso porque, ao contrário de outras operações de crédito, as debêntures não seguem a regra tradicional para a constituição, por parte dos bancos, de provisões para devedores duvidosos, as chamadas PDDs, caso o emissor fique inadimplente. As instituições financeiras têm, contudo, de considerar o risco de crédito da empresa na marcação a mercado (precificação dos títulos).
"Tem havido essa arbitragem, ainda que não intencionalmente, mas é algo que o BC tem acompanhado, está de olho. Os bancos têm de tratar o risco de crédito", comentou uma fonte com conhecimento do assunto.
Além da marcação a mercado, os bancos também podem fazer algum tipo de provisionamento que pode ser, eventualmente, solicitado pelo órgão regulador. Trata-se da provisão em subtítulo de uso interno. Essa informação, porém, não é visível no balanço das instituições financeiras. Somente o Banco Central dispõe disso.
"As debêntures são consideradas títulos de valores mobiliários e não carteira de crédito. Entram em linhas diferentes em termos de provisionamento, mas o efeito final acaba sendo o mesmo, apesar de seguirem caminhos contábeis diferentes", afirma o executivo de um grande banco.
Apesar de o volume de reestruturação de dívidas via emissão de debêntures ter crescido, ainda não é representativo em relação às carteiras de crédito dos bancos. O total desses papéis, incluindo as emissões de empresas saudáveis e fora do âmbito das renegociações de dívida, responde por entre 3,5% e 4,0% dos empréstimos dos bancos, faixa que tem se mantido estável, conforme números do Banco Central obtidos pelo Broadcast.
A atenção nesta questão do órgão regulador tem como pano de fundo, entretanto, o volume recorde de empresas em dificuldades, muitas das quais em processo de recuperação judicial, sendo que algumas envolvendo grandes companhias com dívidas na casa de bilhões de reais.
"A crise tem exigido que as grandes empresas, mais conhecidas e que, eventualmente tinham debêntures, tivessem de renegociar dívidas, o que não acontecia muito no passado", diz o executivo de um grande banco.
Consolidação do uso
A utilização das debêntures como instrumento de renegociação de dívida por empresas em dificuldades no Brasil não é inédito. Nos casos recentes em que credores trocaram dívidas por debêntures estão a OGX e a OAS, ambas no âmbito da recuperação judicial.
"Não é algo completamente novo, mas nestes 11 anos da nova lei de recuperação judicial, este é o primeiro grande ciclo de renegociações e as debêntures se consolidaram e estão sendo cada vez mais utilizadas", comenta André Moraes Marques, sócio da área de recuperação de empresas do escritório Pinheiro Neto.
Marques explica que na mesa de negociações com vários credores, as debêntures, que podem ser emitidas em séries, permitem que o devedor estruture o papel atendendo às exigências de diferentes classes de crédito. Além disso, Marques aponta para a vantagem tributária, uma vez que na emissão do papel não há incidência de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o que eventualmente encareceria uma rolagem por meio de qualquer outra operação de crédito.
"Para a empresa, o custo da nova dívida fica menor e para o banco a vantagem é que pode fazer um 'empréstimo' menor, ou seja, sem embutir o valor do IOF na transação", diz.
Outro aspecto interessante citado pelo sócio da Pinheiro Neto está na possibilidade de venda desse crédito, uma vez que as debêntures são negociáveis no mercado secundário. No entanto, investidores exigem um prêmio maior para assumirem o risco dos papéis. Um gestor de recursos estrangeiro conta, na condição de anonimato, que tem sido mais seletivo na escolha de papéis.
Admite, porém, que o prêmio ofertado pelos emissores melhorou esse ano, com as empresas pressionadas por falta de caixa e necessidade de refinanciamento com a crise no País.
Ricardo Russo, sócio da área de mercado de capitais do Pinheiro Neto, lembra ainda que a atratividade das debêntures como instrumento para renegociação de dívidas está no fato de que são regidas pela lei das Sociedades Anôminas, dando conforto aos credores.
"Ao contrário de qualquer outra operação de crédito, a lei das SAs mostra quais são as regras do jogo", afirma Russo, acrescentando que nas operações em que os credores queiram trocar a dívida por ações, as debêntures carregam leis que regem o princípio de conversibilidade e não somente uma obrigação.
Outro benefício, na visão de Marina Anselmo Schneider, sócia do escritório Mattos Filho, diz respeito às garantias. Segundo ela, as debêntures eliminam o trabalho adicional da constituição do contrato das garantias, que regula o eventual processo de compartilhamento na execução das garantias que a companhia prestou aos diferentes credores. "As decisões sobre as garantias ficam na escritura da emissão e já é sabido que a divisão é pró rata (equivalente ao valor da dívida)", explica a especialista.
São Paulo - O crescente uso das debêntures nas renegociações de um volume recorde de dívida, em meio à profunda crise econômica que assola o País, está chamando a atenção do Banco Central , apurou o Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado.
Isso porque, ao contrário de outras operações de crédito, as debêntures não seguem a regra tradicional para a constituição, por parte dos bancos, de provisões para devedores duvidosos, as chamadas PDDs, caso o emissor fique inadimplente. As instituições financeiras têm, contudo, de considerar o risco de crédito da empresa na marcação a mercado (precificação dos títulos).
"Tem havido essa arbitragem, ainda que não intencionalmente, mas é algo que o BC tem acompanhado, está de olho. Os bancos têm de tratar o risco de crédito", comentou uma fonte com conhecimento do assunto.
Além da marcação a mercado, os bancos também podem fazer algum tipo de provisionamento que pode ser, eventualmente, solicitado pelo órgão regulador. Trata-se da provisão em subtítulo de uso interno. Essa informação, porém, não é visível no balanço das instituições financeiras. Somente o Banco Central dispõe disso.
"As debêntures são consideradas títulos de valores mobiliários e não carteira de crédito. Entram em linhas diferentes em termos de provisionamento, mas o efeito final acaba sendo o mesmo, apesar de seguirem caminhos contábeis diferentes", afirma o executivo de um grande banco.
Apesar de o volume de reestruturação de dívidas via emissão de debêntures ter crescido, ainda não é representativo em relação às carteiras de crédito dos bancos. O total desses papéis, incluindo as emissões de empresas saudáveis e fora do âmbito das renegociações de dívida, responde por entre 3,5% e 4,0% dos empréstimos dos bancos, faixa que tem se mantido estável, conforme números do Banco Central obtidos pelo Broadcast.
A atenção nesta questão do órgão regulador tem como pano de fundo, entretanto, o volume recorde de empresas em dificuldades, muitas das quais em processo de recuperação judicial, sendo que algumas envolvendo grandes companhias com dívidas na casa de bilhões de reais.
"A crise tem exigido que as grandes empresas, mais conhecidas e que, eventualmente tinham debêntures, tivessem de renegociar dívidas, o que não acontecia muito no passado", diz o executivo de um grande banco.
Consolidação do uso
A utilização das debêntures como instrumento de renegociação de dívida por empresas em dificuldades no Brasil não é inédito. Nos casos recentes em que credores trocaram dívidas por debêntures estão a OGX e a OAS, ambas no âmbito da recuperação judicial.
"Não é algo completamente novo, mas nestes 11 anos da nova lei de recuperação judicial, este é o primeiro grande ciclo de renegociações e as debêntures se consolidaram e estão sendo cada vez mais utilizadas", comenta André Moraes Marques, sócio da área de recuperação de empresas do escritório Pinheiro Neto.
Marques explica que na mesa de negociações com vários credores, as debêntures, que podem ser emitidas em séries, permitem que o devedor estruture o papel atendendo às exigências de diferentes classes de crédito. Além disso, Marques aponta para a vantagem tributária, uma vez que na emissão do papel não há incidência de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o que eventualmente encareceria uma rolagem por meio de qualquer outra operação de crédito.
"Para a empresa, o custo da nova dívida fica menor e para o banco a vantagem é que pode fazer um 'empréstimo' menor, ou seja, sem embutir o valor do IOF na transação", diz.
Outro aspecto interessante citado pelo sócio da Pinheiro Neto está na possibilidade de venda desse crédito, uma vez que as debêntures são negociáveis no mercado secundário. No entanto, investidores exigem um prêmio maior para assumirem o risco dos papéis. Um gestor de recursos estrangeiro conta, na condição de anonimato, que tem sido mais seletivo na escolha de papéis.
Admite, porém, que o prêmio ofertado pelos emissores melhorou esse ano, com as empresas pressionadas por falta de caixa e necessidade de refinanciamento com a crise no País.
Ricardo Russo, sócio da área de mercado de capitais do Pinheiro Neto, lembra ainda que a atratividade das debêntures como instrumento para renegociação de dívidas está no fato de que são regidas pela lei das Sociedades Anôminas, dando conforto aos credores.
"Ao contrário de qualquer outra operação de crédito, a lei das SAs mostra quais são as regras do jogo", afirma Russo, acrescentando que nas operações em que os credores queiram trocar a dívida por ações, as debêntures carregam leis que regem o princípio de conversibilidade e não somente uma obrigação.
Outro benefício, na visão de Marina Anselmo Schneider, sócia do escritório Mattos Filho, diz respeito às garantias. Segundo ela, as debêntures eliminam o trabalho adicional da constituição do contrato das garantias, que regula o eventual processo de compartilhamento na execução das garantias que a companhia prestou aos diferentes credores. "As decisões sobre as garantias ficam na escritura da emissão e já é sabido que a divisão é pró rata (equivalente ao valor da dívida)", explica a especialista.