Economia

Um salto no claro

Estatísticas revelam avanços do país. E atiçam expectativas

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h48.

País do futuro que não chega, gigante adormecido, Brazil que não conhece o Brasil... São várias as expressões que demonstram não apenas senso crítico mas uma dificuldade nacional em reconhecer os avanços do país. Espécie de esporte nacional, essa baixa auto-estima sofreu dois golpes consecutivos na virada do mês de setembro para outubro. Primeiro, com a divulgação do trabalho Estatísticas do Século XX, lançado pelo IBGE. Depois, com o lançamento do Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil -- 2003, realizado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em associação com o IBGE, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e a Fundação João Pinheiro, do governo de Minas Gerais. Ambos os trabalhos jogam luz sobre o admirável salto brasileiro nos últimos 100 anos. E suscitam uma questão: será possível manter o ritmo para, em mais algumas décadas, atingirmos o nível de vida do Primeiro Mundo?

Do começo do século 20 para cá, a transformação do país foi assombrosa. O produto interno bruto foi multiplicado por 110, o PIB per capita, por 12. A parcela de municípios com luz elétrica passou de 41% para 100%, a taxa de residências com água encanada subiu de 21% para 90%, a taxa de analfabetismo despencou de 65% para 13,6%, a expectativa de vida disparou de 33,6 para 68,6 anos. É claro que ainda há muito o que avançar. A taxa de domicílios com rede de esgoto mais do que triplicou, mas ainda está baixíssima, em sofríveis 47%. O analfabetismo apenas passou de um nível africano para um patamar latino-americano -- mesmo assim, um latino-americano não dos melhores. E a desigualdade de renda é ainda assombrosa: os 10% mais ricos ganham 47 vezes mais do que os 10% mais pobres. Com tantas mazelas, é claro que é possível ser catastrofista e dizer que o Brasil não avançou tudo o que devia. Mas, se olharmos com atenção, dá para perceber que avançou mais do que qualquer outro país.

De 1901 a 1973, a economia brasileira foi a que mais cresceu em todo o planeta. A partir da década de 80, o crescimento do PIB foi medíocre, mas os avanços não pararam. De acordo com os critérios estabelecidos pela ONU, o país foi o que teve maior avanço no desenvolvimento humano entre 1975 e 2001 -- passou de 0,643 para 0,777 no índice, que vai de 0 a 1. É esse Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), aplicado aos municípios, que o Atlas lançado pelo PNUD mede no intervalo de 1991 a 2000. A metodologia parte do princípio de que não é só a renda que garante o bem-estar das pessoas. O IDH avalia outras duas dimensões: educação e expectativa de vida. Na última década, a educação puxou o índice brasileiro para cima, com melhora de 25% na média de todos os municípios. Isso aconteceu principalmente por causa do aumento da freqüência escolar de crianças de 7 a 14 anos. A expectativa de vida cresceu 12% e a renda 11%.

Uma boa medida do avanço social na última década é que o número de municípios com IDH baixo (menor que 0,5) caiu de 1 001, em 1991, para apenas 22. As cidades com IDH entre 0,5 e 0,6 também caíram, de 1 373 para 838. As de IDH entre 0,7 e 0,8 subiram de 1 226 para 2 422, e as de IDH alto, acima de 0,8, que eram apenas 18 no começo da década, hoje são 558. Outra boa notícia é que foram os pequenos municípios, com menos de 50 000 habitantes, que tiveram os maiores avanços de IDH. "Se o índice melhora ali, tende a melhorar nas cidades maiores, porque diminui a pressão do êxodo populacional", diz José Carlos Libânio, assessor para desenvolvimento sustentável do PNUD, coordenador da pesquisa do Atlas. Mesmo a discrepância social, um dos problemas mais persistentes do país, tem dois lados. Embora a desigualdade de renda tenha aumentado, diminuiu a desigualdade de desenvolvimento humano. Na década de 90, o grau de desigualdade no IDH entre os municípios caiu de 57% para 48%.

Dá para manter esse ritmo de avanços sociais? "Tem como manter o salto, sim", diz Libânio. A receita, segundo o assessor do PNUD, é combater os bolsões de pobreza -- tanto localidades como grupos sociais. "O IDH mede mudanças em prazos longos", diz Libânio. "Fenômenos recentes estão maturando. Esforços dos municípios, da União e dos estados para manter os jovens nas escolas, como o bolsa-escola, são recentes e ainda vão surtir efeito." Segundo Libânio, o grande contingente de crianças que foi absorvido pelas escolas indica que o próximo gargalo será o dos jovens entre 15 e 17 anos. Terão de ser criadas mais vagas para o ensino médio.

É claro que, à medida que o país melhora, vai ficando mais difícil elevar os índices de desenvolvimento humano. Os avanços, num nível mais alto, exigem investimentos maiores. Por outro lado, no longo prazo a taxa de educação influi na renda. Uma população mais instruída tem mais condições de atrair investimentos. E, considerando que esses fantásticos avanços sociais foram obtidos numa década não muito favorecida economicamente, é no mínimo razoável supor que o próximo Atlas do Desenvolvimento Humano trará mais boas notícias.

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