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Será que nossas contas externas estão tão mal assim?

Para o BBV Banco, Brasil já fez ajuste ;quase asiático; no balanço de pagamentos

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 11h07.

A dívida externa sempre foi um tema quente entre os políticos brasileiros. Desde os tempos do Império, os banqueiros internacionais são acusados de ter responsabilidade em todas as mazelas econômicas e sociais do país, por sua insistência em cobrar um dinheiro que lhes é devido. Mais recentemente, o foco das críticas mudou: políticos daqui mesmo, alcunhados neoliberais, têm recebido o grosso do chumbo, por estar supostamente entregando a riqueza do país na forma de juros e amortizações em vez de investir em infra-estrutura, saúde, educação e demais problemas sociais.

Do outro lado do espectro ideológico também são feitas críticas ao modelo de financiamento da economia brasileira, por ele trazer embutido uma bomba-relógio: no longo prazo, sustentam os defensores dessa tese, é inevitável que o Brasil seja incapaz de honrar compromissos externos e que o país, a exemplo da Argentina, sofra as conseqüências na forma de uma crise econômica, social e política sem precedentes. Tanto de um lado quanto do outro, a dívida externa é apontada como, potencialmente, o maior problema econômico do país. Será verdade?

Eis o que afirma um relatório divulgado pelo BBV Banco na semana passada, de autoria dos economistas Octavio de Barros e Fernando Honorato Barbosa: "O passivo externo brasileiro adquiriu uma trajetória preocupante no quadriênio 1995-1998. Entre 1999 e 2002, sua dinâmica se alterou significativamente, principalmente devido à mudança do regime cambial e ao ajuste externo quase asiático, herança positiva do governo que sai. (...) Ainda que elevado, o passivo externo está em clara trajetória de ajuste e deixará de ser um foco de preocupações no médio prazo".

O BBV faz tal análise com base em um conceito que, afirmam Barros e Barbosa, é muito mais sólido que apenas o de dívida: o de passivo externo. Trata-se da soma de toda a dívida externa com os investimentos estrangeiros diretos no país. Em um cenário catastrófico (e irreal), seria tudo o que teríamos de ter em moeda estrangeira para saldar compromissos com os credores, de um lado, e com os investidores em fuga, querendo seu capital de volta, do outro. Pois bem, o BBV fez as contas e chegou à conclusão de que esse total vem caindo desde a primeira desvalorização cambial e que, em pouco tempo, não haverá mais nenhuma dúvida sobre a capacidade brasileira em honrar seus compromissos externos.

Vamos aos números. Em 1995, o passivo externo apurado pelo Banco Central, diz o BBV, era de 224,8 bilhões de dólares. Ele cresceu para 387,2 bilhões de dólares no final de 2000, mas, graças às sucessivas desvalorizações cambiais, vem caindo e deve fechar 2002 na casa dos 364 bilhões. Isso porque o investidor estrangeiro que traz seu dinheiro ao Brasil precisa de menos dólares para comprar a mesma quantidade de reais. E a queda no investimento estrangeiro também teve um efeito benéfico. "As remessas de lucros e dividendos depois da desvalorização cambial simplesmente pararam de crescer, como resultado da relativa estabilização do passivo externo. Além do efeito do câmbio sobre o estoque de capital estrangeiro, a dívida externa também se reduziu", afirma o BBV.

Outra observação do banco diz respeito à razão entre os pagamentos de dividendos, lucros, juros e amortizações (que consomem dólares) e as exportações (que geram dólares). "A relação entre o passivo externo bruto e as exportações caminha em uma inequívoca trajetória de melhora desde a adoção do regime de câmbio flutuante", diz o banco. Em 2002, eles estimam que essa razão será da mesma ordem que em 1995, depois de ter atingido o pico em 1999, com um valor cerca de 50% maior. Isso justificava na época, em parte, a impressão de que o Brasil estaria entrando em uma trajetória insustentável e que seria um dia incapaz de pagar as contas.

Mas, com a desvalorização do real, tudo mudou. "Se fosse verdade que o passivo externo vem exibindo uma trajetória inequivocadamente crescente, as remessas nominais de juros, lucros e dividendos também teriam que seguir essa trajetória crescente", prossegue o BBV. "Ao contrário, o que se observa desde 1998 é uma relativa estabilidade nesses fluxos nominais." Ou seja: o Brasil não vive um processo de fuga de capital como a Argentina. E, embora a balança de transações correntes ainda esteja no vermelho, desde 2000, a cada ano esse vermelho diminui.

"Nossa hipótese é que o ajuste externo está muito próximo de estar completo, ou pelo menos que as condições para a sua manutenção (política fiscal, monetária e cambial) estão sendo adequadamente asseguradas pelo novo governo", afirma o BBV. "Apenas com uma política macroeconômica adequada é que então se pode assegurar o adequado funcionamento do regime de cÂmbio flutuante. (...) O aumento significativo da corrente de comércio (importações somadas às exportações) faria com que esse tema do passivo externo fosse definitivamente enterrado no Brasil como foco de intensos debates." E o BBV conclui: "É preciso reconhecer que a chamada vulnerabilidade externa brasileira, se ainda é elevada comparada à de outros países, é ao menos muito menor do que há quatro anos. (...) O ajuste do déficit em conta corrente de quase 3 pontos percentuais de PIB apenas nos últimos 12 meses revela a dimensão quase asiática do ajuste brasileiro".

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