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O Brasil corre risco de deflação?

Letícia Toledo  Nos últimos anos o Brasil conviveu com um fantasma pra lá de conhecido: o da inflação. No fim de 2015 o IPCA, indicador oficial da inflação no país, chegou aos dois dígitos mesmo diante de uma taxa de juro de 14,25% ao ano e o avanço da recessão econômica. Agora, diante de uma […]

ILAN GOLDFAJN, PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL: riscos políticos exigem cautela na redução dos juros / Ueslei Marcelino/ Reuters
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Letícia Toledo

Publicado em 1 de junho de 2017 às 18h24.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h06.

Letícia Toledo

Nos últimos anos o Brasil conviveu com um fantasma pra lá de conhecido: o da inflação. No fim de 2015 o IPCA, indicador oficial da inflação no país, chegou aos dois dígitos mesmo diante de uma taxa de juro de 14,25% ao ano e o avanço da recessão econômica. Agora, diante de uma economia ainda oscilante e um Banco Central disposto a levar a inflação do país à meta custe o que custar, um novo problema começa a pintar no radar de alguns analistas, o risco da deflação.

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Os indícios estão por aí. O IGP-M, que serve para o reajuste de aluguéis, teve deflação pelo segundo mês consecutivo em maio. Projeções do banco Fibra mostram que o índice de junho deve apresentar mais um número negativo, de -0,03%. Há também projeções de que o IPCA deve mostrar deflação em junho pela primeira vez em 11 anos. A redução no preço da gasolina nas refinarias e o retorno da bandeira tarifária verde (mais barata) nas contas de energia elétrica deve levar a um IPCA de -0,04%.

É apenas um mês atípico, ou o suficiente para começarmos a nos preocupar? A deflação, embora pouco presente na vida dos brasileiros, é um drama econômico real em economias como a japonesa e a europeia. No Japão, o problema começou nos anos 90. A redução de preços faz com que os consumidores adiem compras de bens duráveis como carros e apartamentos que, no futuro, custarão menos. Como consequência, cai a demanda, o que derruba a receita das empresas, que deixam de investir e contratar e reduzem os salários, prejudicando todo o ciclo econômico.

No Brasil, a grande incerteza em relação à evolução da inflação, como não poderia ser diferente, é o impacto do ambiente político.

A meta do Banco Central é fechar o ano numa inflação abaixo dos 4,5% — a expectativa do banco é que, na atual toada, cheguemos ao fim de dezembro em 4%. Para 2018, a meta do Banco Central é a mesma (4,5%), e a expectativa é 4,6%. Ano passado, vale lembrar, o centro da meta também era 4,5%, mas o índice terminou o ano em 6,29%. Em 2015, a inflação foi de 10,67%.

Para o Banco Central, está tudo dentro da normalidade – o objetivo, argumenta o presidente Ilan Goldfajn e sua turma, é chegar ao final de 2017 e de 2018 na meta definida. E até lá, na visão do banco, há uma série de contratempos no caminho que exigem cautela na condução da política monetária. Em seu último comunicado, divulgado na quarta-feira 31, o Comitê de Política Monetária, órgão do Banco Central que define a taxa de juros, afirma que a instabilidade política pode afetar a aprovação de reformas e, desta forma, jogar o dólar para cima e, com isso, desequilibrar a inflação.

“O Banco Central disse que começou a olhar mais para 2018 em suas decisões, quando não teremos fatores favoráveis como a safra agrícola recorde para ajudar o PIB. Ele está certo, o BC precisa ser cauteloso e pensar no futuro”, diz Luiz Castelli, economista da consultoria GO Associados.

Segundo essa linha de pensamento, é preciso olhar a floresta, e não a árvore que está logo à frente. Segundo esta linha de análise, no médio e no longo prazo a preocupação maior ainda é de uma volta da inflação – e, neste cenário, a cautela do Banco Central é mais do que bem-vinda. “O IGP é impactado por questões que não estão sob o controle do Banco Central, como preço das commodities, em queda no mundo todo. No caso do IPCA, a deflação acontece por questões pontuais com redução no preço da energia, que não se repetirão nos próximos meses”, diz Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra.

O outro lado

Mas um grupo de analistas e economistas afirma que os números recentes mostram que o Banco Central está errando a mão. Afinal, nos 12 meses até abril, o índice chegou a 4,08% — já abaixo da meta traçada, portanto. Neste cenário, argumentam, o corte de juros deveria ser mais incisivo. “O Banco Central errou ao não promover corte mais incisivo da taxa de juros, pois as expectativas de inflação tanto para 2017 quanto para 2018 seguem abaixo da meta de 4,5%”, afirma Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.

Seguindo esta visão, não é papel do Banco Central fazer projeções com base em eventos totalmente imprevisíveis, como novos capítulos da crise política. O fato concreto é que, com o andor atual da carroça, a inflação está em queda livre – um argumento para um corte maior de juros. “O Banco Central está muito ocupado fazendo previsões políticas, que não cabem à ele. É evidente o erro na forma como o Banco Central vem conduzindo o seu mandato. Sua obrigação é cuidar da inflação corrente. É olhar para o que está acontecendo agora”, afirma o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, colunista de EXAME Hoje e ex-presidente do BNDES.

“O comportamento da inflação, abaixo da meta para 2017, e suas perspectivas favoráveis permitiriam um corte mais agressivo dos juros, o que iria contribuir para a continuidade da gradual normalização da atividade econômica”, disse a Confederação Nacional das Indústrias em comunicado.

Entre tantos efeitos no bolso dos brasileiros, os desdobramentos da crise política vão mostrar também se o risco maior é o da deflação ou a volta da inflação. Por enquanto, como se vê, o debate é acalorado, mas não tem vencedores.

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