Nada é tabu para Gita Gopinath, primeira economista-chefe mulher do FMI
Em sua carreira acadêmica, Gopinath se mostrou disposta a seguir a evidência empírica para onde quer que ela fosse
João Pedro Caleiro
Publicado em 27 de janeiro de 2019 às 08h00.
Última atualização em 27 de janeiro de 2019 às 08h00.
Gita Gopinath sabe fazer o tipo de pergunta que pouco tempo atrás poderia gerar incômodo dentro do Fundo Monetário Internacional ( FMI ), onde acaba de assumir o cargo de economista-chefe.
E se mais mercados emergentes administrassem ativamente suas moedas, como faz a China? E se a entrada de capital prejudicar a produtividade de um país em vez de impulsioná-la?
Interrogar dados em busca de respostas e utilizá-los para encontrar falhas nos manuais convencionais de política econômica foram características marcantes do trabalho de Gopinath, 47, em Harvard.
Agora, espera-se que ela recomende soluções práticas -- em um momento turbulento em que os princípios de livre mercado promovidos pelo fundo durante décadas estão sob ataque.
Especialmente em países tomadores de empréstimos como Grécia e Argentina, o FMI ainda é retratado como um aplicador de políticas generalizadas baseadas na austeridade e no fluxo desimpedido de mercadorias e dinheiro. Mas a imagem está desatualizada há tempos.
Os economistas do fundo defenderam o alívio da dívida na Grécia. Afirmaram que controles de capital podem ser úteis e apoiaram cautelosamente impostos redistributivos. Quando a Argentina teve que realizar cortes no orçamento, insistiram que não se deveria colocar muito peso sobre os ombros dos pobres.
Não seja dogmático
A mudança deve continuar com Gopinath, que se tornou a primeira mulher a ocupar um dos cargos mais influentes do campo econômico quando assumiu o lugar antes ocupado por Maurice Obstfeld, neste mês. Ela supervisionará o setor de pesquisa do fundo, incluindo as projeções de crescimento, acompanhadas de perto em um momento em que a incerteza está aumentando.
Na segunda-feira, o FMI reduziu sua perspectiva global pela segunda vez em três meses, mostrando a expansão mais fraca deste ano desde 2016.
Mais de uma década após a crise financeira que o FMI e os economistas não foram capazes de prever, Gopinath usou sua entrevista coletiva de estreia para ressaltar os riscos crescentes, incluindo a guerra comercial e o aperto do crédito.
Na nova função, Gopinath pretende usar a “lente mais ampla possível” na busca de soluções. Parte do trabalho será revisar os programas de empréstimos do fundo, o que dá voz a ela na formulação de políticas práticas.
“É preciso repensar a globalização” e isso deve abordar a distribuição de benefícios, bem como o impacto das novas tecnologias, disse, em resposta a perguntas, por e-mail.
Em sua carreira acadêmica, Gopinath se mostrou disposta a seguir a evidência empírica para onde quer que ela fosse.
"O que o pensamento de Gita tem apontado é que não se deve ser dogmático", disse Mohamed El-Erian, principal assessor econômico da Allianz SE e ex-economista do FMI. "Em momentos em que o sistema global está tendo que enfrentar tantas incertezas é tranquilizador que no FMI haja alguém como Gita."
Nesse clima, o novo cargo de Gopinath exige muito mais do que um pensamento econômico criterioso, segundo Raghuram Rajan, que ocupou o cargo na última década.
Ela vai “encontrar o caminho dela”, disse Rajan, que também chefiou o banco central da Índia. Mas ela terá que ser, se não política, pelo menos diplomática.
“Devido à tensão política, essa não é uma situação fácil para ninguém”, disse. “É um cargo com muita visibilidade. E ela terá que avançar com cuidado.”