Menos empatia, por favor
Against Empathy: The Case for Rational Compassion Autor: Paul Bloom. 304 págs. ——————————— Joel Pinheiro da Fonseca Quando o psicólogo Paul Bloom – professor de Yale – falava a outras pessoas que estava escrevendo um livro contra o sentimento da empatia, a maioria reagia como se ele estivesse escrevendo um livro contra filhotinhos de gato. […]
Da Redação
Publicado em 24 de dezembro de 2016 às 08h02.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h43.
Against Empathy: The Case for Rational Compassion
Autor: Paul Bloom. 304 págs.
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Joel Pinheiro da Fonseca
Quando o psicólogo Paul Bloom – professor de Yale – falava a outras pessoas que estava escrevendo um livro contra o sentimento da empatia, a maioria reagia como se ele estivesse escrevendo um livro contra filhotinhos de gato. Afinal, quem não gosta de empatia? Trata-se da fonte de toda nossa ética, além de reduzir drasticamente o sofrimento e a injustiça no mundo.
Será? Em uma época em que submetemos tudo ao crivo da ciência, talvez fosse a hora de medir também o quanto a empatia é eficaz em produzir aqueles efeitos que esperamos dela. E foi isso que Bloom fez: um teste científico e racional rigoroso da empatia. Teste no qual ela falha. Na hora de guiar nossas decisões – e, especialmente nossas políticas públicas –, a empatia fracassa justamente naqueles critérios em que esperaríamos que ela fosse bem-sucedida.
Bloom parte da definição padrão de empatia: colocar-se no lugar do outro e sentir – ou buscar sentir – o que ele sente. Somos capazes de fazer isso em alguma medida, mas limitados nessa capacidade por uma mente dotada de diversos vieses evolutivos: nossa empatia, portanto, é parcial, bairrista e facilmente manipulável.
Por causa disso, governos e a sociedade em geral se preocupam mais com casos individuais fora do comum – uma menina presa num poço, por exemplo – do que com uma doença que anualmente tira milhares de vidas.
A empatia é pouco capaz de lidar com números. Duas pessoas podem ter o mesmo peso que duas mil, ou até mais, se forem mais individualizadas. Ela também é completamente cega para pessoas que ainda não nasceram, de modo que pequenos sofrimentos de pessoas de hoje em dia nos move mais do que o sofrimento futuro de pessoas que ainda nem nasceram, um dilema real quando pensamos, por exemplo, em políticas ambientais ou em reforme previdenciária. Há ainda uma clara predisposição de certos atributos físicos – como rostos de bebês – para provocar mais empatia. Por fim, a empatia pela dor de um indivíduo pode nos levar a causar a dor em outro, que se oponha a ele.
De forma geral, conclui Bloom, a empatia torna o mundo mais desigual, injusto, preconceituoso (ao valorizar os mais parecidos conosco) e cruel. Num estudo interessante, uma pessoa assiste outra tomar um choque. Se é dito a ela que a vítima torce para o mesmo time de futebol que ela, a dor empática que ela sente é muito maior. No lugar de um sentimento tão rudimentar, deveríamos desenvolver uma compaixão mais distanciada e racional, que leve em conta tudo aquilo que nosso cérebro (e boa parte do livro é dedicada a explorar o mecanismo cerebral da empatia) ignora. A compaixão, segundo Bloom, não busca recriar o sentimento alheio, mas apenas dirigir bons sentimentos para o objeto; é, basicamente, querer o bem do outro.
Curiosamente, ao contrário do que muitas vezes se pensa, é a compaixão, e não a empatia, que está correlacionada a mais doações para a caridade. Além disso, enquanto disposição psicológica, ela parece ser mais saudável. A empatia cansa e gera desconforto – natural, pois estamos sentindo o sofrimento alheio – enquanto a compaixão é prazerosa e naturalmente se perpetua.
A empatia tem, é certo, um lugar importante nas relações pessoais. Mas mesmo aí ela pode por vezes nos levar a más escolhas, como no caso da criação de filhos. Se o pai cede ao filhinho pequeno toda vez que ele chora ou faz uma terna carinha triste, a criança crescerá mimada. Em casos como esse, a solução mais empática, que sente a dor daquela criança e busca reduzi-la, é a pior. Em muitos casos, o bom pai tem que inclusive causar sofrimento nos filhos (num castigo, por exemplo). Não é a ideia rósea – e extremamente empática – que muitos fazem da paternidade ou maternidade, mas é o que a realidade exige.
Olhando o mundo ao nosso redor, vemos o império da empatia. É preciso se sentir mal – por vezes também culpado – continuamente por todos os oprimidos e sofredores, vítimas de um mundo opressor e cruel. Ao invés de buscar soluções racionais para que todos vivam melhor, há uma demanda eterna por reparações, para punir os responsáveis (outra face da empatia). Com menos empatia, o mundo poderia realmente ser um lugar melhor.