Meirelles: um tucano na presidência do BC

"Fui eleito para o Legislativo e vou trabalhar para isso." Com essa frase repetida constantemente, Henrique Meirelles, deputado federal eleito pelo PSDB de Goiás, tentou se esquivar no último mês e meio da eventual ida para a presidência do Banco Central. Mas não teve jeito. Meirelles foi escolhido pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva para presidir o BC, segundo a assessoria do BankBoston informou no início da tarde ao editor Cláudio Gradilone, de EXAME.

"Decidimos, conversamos com o companheiro Henrique Meirelles e o convocamos para essa importante função", afirmou Lula ao anunciar em Brasília o nome do novo presidente do BC. "Aproveito para agradecer também ao Armínio Fraga (atual presidente do BC) por garantir a manutenção de todos os diretores do banco até que o novo presidente possa fazer as mudanças necessárias."

Meirelles afirmou que irá renunciar ao mandato de deputado federal e se afastar do PSDB. "Tenho grande afinidade com o PT. Sinto-me totalmente à vontade de fazer parte do governo Lula", afirmou. Meirelles evitou detalhar a política monetária do próximo governo. Mas adiantou: "Acredito em foco no resultado. O presidente do Banco Central é o guardião da moeda e tem, então, a responsabilidade de manter a inflação sob controle".

Mesmo sem ser considerado pelo mercado financeiro como um nome tecnicamente perfeito para o cargo, Meirelles se firma como a última opção para o PT preencher a vaga da presidência do BC. "Meirelles é uma pessoa experiente, foi presidente de um banco internacional e tem todas as condições de exercer a presidência do BC", diz Milton Milioni, diretor da Abamec-SP (Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de apitais). "O fato de ele aceitar dá mais tranqüilidade de que o BC vai ter autonomia para trabalhar, pois um nome de tanta credibilidade não aceitaria trabalhar em outras condições", afirma Fernando Pinto Ferreira, da consultoria GlobalInvest.

Pedro Bodin, presidente do Banco Icatu, era até a última terça-feira o nome mais cotado no PT para suceder Armínio Fraga. Lula, porém, não o teria convencido a assumir o BC. Devido ao trânsito internacional, Meirelles acompanhou o futuro ministro da Fazenda, Antônio Palocci, na viagem aos Estados Unidos. Até então, não se sabia se era apenas uma cortesia.

O tempo conspirava contra o presidente eleito. Lula já havia vetado a permanência de Armínio Fraga nos primeiros meses do governo, que seria tranqüila e segura para o mercado. Não encontrando uma pessoa com perfil adequado dentro do próprio PT e recebendo negativas constantes de profissionais experientes, o PT foi obrigado a se contentar com um tucano na estratégica posição de presidente do Banco Central.

Quem é Henrique Meirelles

Natural de Goiás, Meirelles chegou ao topo do mercado financeiro mundial e foi um dos executivos mais bem remunerados dos últimos anos à frente do FleetBoston Global. Em 1999, recebeu 14,6 milhões de dólares entre salário, bônus e opções de ações.

Meirelles ganhou notoriedade por ser o único executivo estrangeiro a presidir um banco americano em território americano. Ele já trazia no currículo a experiência de ser o primeiro brasileiro a presidir um banco estrangeiro no Brasil.

Meirelles, 57 anos, é descendente de uma família de políticos. Seu pai foi secretário de Estado em duas ocasiões. No segundo grau, Meirelles foi militante do movimento estudantil. Daí vem sua facilidade para os discursos e apresentações públicas. Formado em engenharia pela USP, com pós-graduação em administração de empresas, Meirelles tentou a vida de empreendedor. Ao final de 2 anos, descobriu que engenharia não era seu negócio. Partiu, então, para a carreira de executivo.

O hobby de Meirelles é a psicologia. "Sempre quis entender as pessoas e a mim mesmo", disse à revista Você S.A. A psicologia, diz, ajudou-o a se relacionar melhor com o mundo. Resultado: os profissionais que trabalham com Meirelles costumam destacar sua sensibilidade no trato com os colegas. "Apesar da objetividade e agressividade com que trabalha, o Henrique não fere as pessoas", diz uma diretora do BankBoston. "Para liderar é preciso ter interesse real pelas pessoas e entender que o que é diferente não é necessariamente errado." Eis algunas das qualidades que Meirelles diz procurar nos integrantes do seu time: