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Laboratórios vêem risco de saúde pública com quebra de patente

O presidente Lula decidiu autorizar pela primeira vez a licença compulsória da patente de um medicamento contra Aids

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h43.

Os laboratórios brasileiros acreditam que a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de quebrar a patente do medicamento Efavirenz, usado em larga escala no Brasil para o tratamento da Aids, coloca em risco a saúde pública. A decretação da licença compulsória do medicamento ocorreu mesmo após o laboratório americano Merck Sharpe & Dohme aceitar uma redução de 30% nos preços, o que não foi considerado satisfatório pelo Ministério da Saúde.

O presidente-executivo da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), Gabriel Tannus, afirmou que vê risco de saúde pública porque não há garantias de eficiência dos remédios que o Brasil passará a importar da Índia. As três empresas do país asiático que passarão a fornecer o medicamento (Ranbaxy, Cipla e Aurobindo) ao Brasil prometem um preço 70% menor. Tannus afirmou, entretanto, que o Efavirenz consegue proporcionar uma sobrevida média de 100 meses a pacientes com Aids e que o remédio indiano pode não atingir os mesmos resultados. "A Índia tem o pior sistema de tratamento de Aids do planeta e vende esses remédios apenas para exportação", afirmou. "Se a pessoa não melhorar com o remédio, o governo vai ter de pagar o custo de internação e de outros tratamentos bem mais caros."

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Já a Merck afirmou que a licença compulsória "não é a melhor solução para as duas partes e, principalmente para os pacientes". Em sua defesa, o Ministério da Saúde disse que as indústrias da Índia que poderão fornecer o medicamento ao Brasil têm certificação da Organização Mundial de Saúde (OMS) e seguem padrões mais rigorosos até mesmo que os adotados dentro do Brasil.

O governo brasileiro paga hoje US$ 1,59 por cada comprimido do Efavirenz e queria reduzir esse custo para US$ 0,65 - mesmo valor pago pela Tailândia, que também ameaçou decretar a licença compulsória. O medicamento é utilizado por 75 mil dos cerca de 200 mil pacientes que deverão procurar a rede pública de saúde neste ano para o tratamento da Aids. Na semana passada o ministério declarou de interesse público a patente do medicamento e afirmou que poderia importar remédio semelhante da Índia ao custo de US$ 0,45 por comprimido mais 1,5% de royalties a serem pagos à Merck. A economia até 2012, quando expiraria a patente do Efavirenz, poderia chegar a US$ 236,8 milhões, segundo cálculos do governo.

A Merck afirma que o preço do medicamento no Brasil hoje já é 86% menor do que o cobrado nos Estados Unidos. A empresa também diz que levou em consideração o número de pacientes e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) para conceder esse desconto ao Brasil. O Ministério da Saúde, entretanto, afirma que nenhum outro país tem um programa público de tratamento à Aids do tamanho do brasileiro e que isso ainda não está embutido no preço. O governo desembolsa R$ 900 milhões por ano apenas com os remédios do programa.

Comércio e investimentos

O presidente-executivo da Interfarma também afirmou que o Brasil deverá perder investimentos no setor farmacêutico e também enfrentar problemas comerciais com os Estados Unidos. "O tratamento da Aids exige sempre o desenvolvimento de novos medicamentos. Mas será que as empresas vão querer lançar medicamentos mais avançados no país caso não tenham a garantia da proteção da patente?", questiona. "É igual investir em petróleo na Bolívia. A Petrobras fez de tudo para ajudar os camaradas e agora eles querem tomar tudo para eles. Você acha que haverá novos investimentos?"

O escritório de representação comercial dos EUA (USTR) manifestou na última segunda-feira preocupação com a possibilidade de quebra de patente e afirmou que espera que o governo brasileiro ouça todos os interessados na questão antes de tomar uma decisão.

Os ministérios da Saúde e das Relações Exteriores afirmam, porém, que o licenciamento compulsório está previsto na legislação brasileira e também está de acordo com as regras da OMC. Os EUA já chegaram a questionar o mecanismo na OMC, mas retiraram o processo após forte pressão de ONGs. A estratégia do Brasil vinha sendo de usar a ameaça de licenciamento compulsório para forçar a negociação dos preços pagos. Foi assim com o Kaletra, outro remédio anti-Aids produzido pelo laboratório Abott. Após pressão governamental, a empresa concordou em baixar o preço do medicamento em 46%.

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