Febraban estava certa: o cavalo não quis beber água
Embora publicamente apoiem a cruzada do governo por juros mais baixos, grandes bancos do país mostraram com os balanços que, na prática, valeu a velha cartilha bancária
Da Redação
Publicado em 9 de agosto de 2012 às 21h51.
São Paulo - Números parciais dos balanços dos bancos no segundo trimestre consolidaram as suspeitas: o apoio das grandes instituições privadas à campanha do governo brasileiro para ampliar os empréstimos e reduzir os spreads ficou no plano político.
Embora publicamente apoiem a cruzada do governo por juros mais baixos para sustentar o crescimento de longo prazo do país, gigantes como Bradesco, Itaú Unibanco e Santander Brasil mostraram com os resultados do segundo trimestre que, na prática, prevaleceu a ortodoxia da cartilha bancária, que recomenda prudência em tempos adversos, como os de desaceleração econômica e aumento da inadimplência.
De um lado, os bancos aumentaram provisões para perdas com calotes, e de outro desceleraram a concessão de novos empréstimo.
Além disso, os banqueiros enfatizaram que uma redução maior dos spreads só virá com queda da inadimplência e menos encargos, como impostos e compulsórios.
"Não é normal ter spreads reduzidos com inadimplência alta", disse o presidente-executivo do Santander Brasil, Marcial Portela, ao comentar os resultados do segundo trimestre.
Em abril, ao cobrar queda de juros pelos bancos, a presidente Dilma Rousseff afirmara ser inadmissível que o Brasil, tendo um sistema financeiro sólido e lucrativo, continuasse com um dos juros mais altos do mundo.
Mas os banqueiros enxergam o problema de forma diferente.
"É errado acreditar que o spread esteja relacionado apenas aos lucros dos bancos", disse recentemente a jornalistas o diretor de controladoria do Itaú Unibanco, Rogério Calderón.
Segundo estimativas da Thomson Reuters, as reservas dos cinco maiores bancos no país para créditos de má qualidade alcançaram a cifra recorde de 30 bilhões de reais no primeiro semestre.
Os grandes bancos privados também reduziram as perspectivas de crescimento do crédito e mantiveram as margens financeiras, levando os bancos estatais a abocanhar uma maior fatia do mercado em junho, segundo dados do Banco Central.
As linhas que sofreram maiores reduções de juros vieram acompanhadas de exigências não triviais, como a de condicionar os clientes a ter conta corrente no banco e um pacote de serviços. É o caso de programa "BOMPRATODOS", do próprio Banco do Brasil.
Já o Itaú Unibanco inovou com o lançamento do Itaucard 2.0, que reduz o juro do cartão de crédito pela metade, mas cobra encargos dos clientes a partir da data da compra e não do vencimento da fatura, como o usual.
"O produto, em vez de reduzir, vai aumentar a receita do Itaú", disse o analista do Barclays, Fabio Zagatti.
Num sinal contundente de que a ofensiva deflagrada em abril não surtiu os efeitos desejados, o ministro da Fazenda, Guido Mantega chamou na quarta-feira para uma reunião em Brasília os representantes dos maiores bancos do país, para pedir deles maior "proatividade" no crédito, segundo disse à Reuters uma fonte com conhecimento do assunto.
Sem oferta, nem demanda - Esse desdobramento inicial diferente do desejado, porém, pode não ter sido uma postura deliberada dos bancos privados contra o governo, mas parte de um cenário do qual os próprios tomadores de crédito também recuaram.
Segundo a Serasa Experian, a fadiga no endividamento fez a demanda do consumidor por crédito cair 7,4 por cento no primeiro semestre ante igual período de 2011.
Para o economista e presidente da agência de classificação de risco SR Rating, Paulo Rabello de Castro, o aumento da inadimplência diminuiu a oferta de crédito, anulando o efeito positivo da redução dos juros sobre o crédito.
"O momento não é propício para colher os frutos dessa estratégia", disse.
Os dois maiores bancos privados do país, o Itaú e o Bradesco, já avisaram que suas operações de crédito neste ano vão crescer menos do que o previsto inicialmente.
Além disso, o spread voltou a subir no começo de julho, depois de cair por quatro meses consecutivos, segundo dados preliminares do Banco Central.
Derrubar o spread, a diferença entre a taxa paga pelos bancos para tomar recursos e a que cobram dos clientes, foi justamente o principal objetivo declarado pelo governo, quando fez os bancos estatais saírem na frente com cortes agressivos de juros.
Embora doloroso, o quadro atual lastreia o diagnóstico feito em maio pelo economista-chefe da Febraban, Rubens Sardenberg, quando escreveu "você pode levar um cavalo até a beira do rio, mas não conseguirá obrigá-lo a beber água". A declaração do economista foi interpretada como um afronta ao governo, levando a presidente Dilma Rousseff a exigir retratação pública dos bancos.
Mas além de colher um resultado prático mais tímido do que o pretendido, o governo brasileiro está sendo alvo de alertas sobre o perigo de forçar demais o crédito, num momento em que o mundo enfileira crises financeiras, causadas em parte justamente por financiamentos concedidos sem critério no passado.
Num deles, semana passada, o Fundo Monetário Internacional (FMI) alertou para a necessidade de melhorar a supervisão bancária e a disponibilidade de taxas de longo prazo no país. O organismo internacional viu na crescente inadimplência um sinal claro de desequilíbrio financeiro dos consumidores, que poderia se exarcebar diante de uma crise financeira.
São Paulo - Números parciais dos balanços dos bancos no segundo trimestre consolidaram as suspeitas: o apoio das grandes instituições privadas à campanha do governo brasileiro para ampliar os empréstimos e reduzir os spreads ficou no plano político.
Embora publicamente apoiem a cruzada do governo por juros mais baixos para sustentar o crescimento de longo prazo do país, gigantes como Bradesco, Itaú Unibanco e Santander Brasil mostraram com os resultados do segundo trimestre que, na prática, prevaleceu a ortodoxia da cartilha bancária, que recomenda prudência em tempos adversos, como os de desaceleração econômica e aumento da inadimplência.
De um lado, os bancos aumentaram provisões para perdas com calotes, e de outro desceleraram a concessão de novos empréstimo.
Além disso, os banqueiros enfatizaram que uma redução maior dos spreads só virá com queda da inadimplência e menos encargos, como impostos e compulsórios.
"Não é normal ter spreads reduzidos com inadimplência alta", disse o presidente-executivo do Santander Brasil, Marcial Portela, ao comentar os resultados do segundo trimestre.
Em abril, ao cobrar queda de juros pelos bancos, a presidente Dilma Rousseff afirmara ser inadmissível que o Brasil, tendo um sistema financeiro sólido e lucrativo, continuasse com um dos juros mais altos do mundo.
Mas os banqueiros enxergam o problema de forma diferente.
"É errado acreditar que o spread esteja relacionado apenas aos lucros dos bancos", disse recentemente a jornalistas o diretor de controladoria do Itaú Unibanco, Rogério Calderón.
Segundo estimativas da Thomson Reuters, as reservas dos cinco maiores bancos no país para créditos de má qualidade alcançaram a cifra recorde de 30 bilhões de reais no primeiro semestre.
Os grandes bancos privados também reduziram as perspectivas de crescimento do crédito e mantiveram as margens financeiras, levando os bancos estatais a abocanhar uma maior fatia do mercado em junho, segundo dados do Banco Central.
As linhas que sofreram maiores reduções de juros vieram acompanhadas de exigências não triviais, como a de condicionar os clientes a ter conta corrente no banco e um pacote de serviços. É o caso de programa "BOMPRATODOS", do próprio Banco do Brasil.
Já o Itaú Unibanco inovou com o lançamento do Itaucard 2.0, que reduz o juro do cartão de crédito pela metade, mas cobra encargos dos clientes a partir da data da compra e não do vencimento da fatura, como o usual.
"O produto, em vez de reduzir, vai aumentar a receita do Itaú", disse o analista do Barclays, Fabio Zagatti.
Num sinal contundente de que a ofensiva deflagrada em abril não surtiu os efeitos desejados, o ministro da Fazenda, Guido Mantega chamou na quarta-feira para uma reunião em Brasília os representantes dos maiores bancos do país, para pedir deles maior "proatividade" no crédito, segundo disse à Reuters uma fonte com conhecimento do assunto.
Sem oferta, nem demanda - Esse desdobramento inicial diferente do desejado, porém, pode não ter sido uma postura deliberada dos bancos privados contra o governo, mas parte de um cenário do qual os próprios tomadores de crédito também recuaram.
Segundo a Serasa Experian, a fadiga no endividamento fez a demanda do consumidor por crédito cair 7,4 por cento no primeiro semestre ante igual período de 2011.
Para o economista e presidente da agência de classificação de risco SR Rating, Paulo Rabello de Castro, o aumento da inadimplência diminuiu a oferta de crédito, anulando o efeito positivo da redução dos juros sobre o crédito.
"O momento não é propício para colher os frutos dessa estratégia", disse.
Os dois maiores bancos privados do país, o Itaú e o Bradesco, já avisaram que suas operações de crédito neste ano vão crescer menos do que o previsto inicialmente.
Além disso, o spread voltou a subir no começo de julho, depois de cair por quatro meses consecutivos, segundo dados preliminares do Banco Central.
Derrubar o spread, a diferença entre a taxa paga pelos bancos para tomar recursos e a que cobram dos clientes, foi justamente o principal objetivo declarado pelo governo, quando fez os bancos estatais saírem na frente com cortes agressivos de juros.
Embora doloroso, o quadro atual lastreia o diagnóstico feito em maio pelo economista-chefe da Febraban, Rubens Sardenberg, quando escreveu "você pode levar um cavalo até a beira do rio, mas não conseguirá obrigá-lo a beber água". A declaração do economista foi interpretada como um afronta ao governo, levando a presidente Dilma Rousseff a exigir retratação pública dos bancos.
Mas além de colher um resultado prático mais tímido do que o pretendido, o governo brasileiro está sendo alvo de alertas sobre o perigo de forçar demais o crédito, num momento em que o mundo enfileira crises financeiras, causadas em parte justamente por financiamentos concedidos sem critério no passado.
Num deles, semana passada, o Fundo Monetário Internacional (FMI) alertou para a necessidade de melhorar a supervisão bancária e a disponibilidade de taxas de longo prazo no país. O organismo internacional viu na crescente inadimplência um sinal claro de desequilíbrio financeiro dos consumidores, que poderia se exarcebar diante de uma crise financeira.