Exclusivo: governo debate tributar importado “poluente” e coalizão de países para mercado de carbono
Segundo o secretário-executivo adjunto do Ministério da Fazenda, Rafael Dubeux, debate ganha força após criação do mercado regulado de carbono no país
Publicado em 12 de janeiro de 2025 às 06h04.
Última atualização em 12 de janeiro de 2025 às 08h34.
O governo brasileiro avalia criar um imposto para sobretaxar produtos importados intensivos em carbono.A possibilidade de criação do tributo está inserida na lei que define as regras do mercado regulado de carbono no Brasil, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 12 de dezembro. As informações são do secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Rafael Dubeux, em entrevista exclusiva à EXAME. Ele coordena a agenda de transição ecológica na pasta.
“Sem dúvida, é um debate que está na mesa, está colocado, a lei [que cria o mercado regulado de carbono] menciona a possibilidade de existir ou não alguma ferramenta do tipo [sobretaxação de produtos intensivos em carbono]. Nós temos alguns anos até a lei entrar em funcionamento pleno”, diz.
“Então, tem um tempo para a gente amadurecer isso até lá, mas me parece que faz todo o sentido que a gente não estimule o vazamento da produção para países que emitem muito carbono e que, simplesmente, fugiriam da precificação do carbono no processo produtivo aqui no Brasil”, prossegue.
A ideia se baseia no CBAM ( Carbon Border Adjustment Mechanism, em inglês), que é o Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira, em vigor na União Europeia desde 2023 e que terá cobrança efetiva em 2026.
A sobretaxação na União Europeia visa:
- Taxar o carbono de produtos importados pelos países membro União Europeia;
- Incentivar a produção industrial mais limpa em outros países;
- Mitigar a fuga de carbono, ou seja, a transferência de produção para países com menos rigor em matéria de emissões;
- Garantir que o preço do carbono das importações seja equivalente ao preço do carbono da produção doméstica; e
- Deixar o mercado de carbono voluntário em segundo plano, dando mais espaço a regulamentações compulsórias
Atrair investimentos para produção no Brasil
Para Dubeux, há lógica e sentido para que o Brasil, um país que tem uma matriz energética comparativamente limpa em relação as demais nações, usar essa vantagem em favor da produção local, atraindo empresas para produzir em território brasileiro.
“Ao produzir aqui, simplesmente conectando no sistema elétrico brasileiro, as empresas já descarbonizam uma parte grande da produção. Parte das emissões vem do próprio processo industrial, mas uma parte grande das emissões vem do uso de energia”, diz. “Ao ter energia renovável, o Brasil, por si só, vira o local para quem quer produzir e, eventualmente, até exportar pra União Europeia. O Brasil é o melhor lugar para vir e reduzir as emissões de carbono."
Acelerar debate durante COP 30, em Belém
Para acelerar essa discussão, umas das estratégias do governo brasileiro com a criação do mercado regulado de carbono, é debater durante a 30ª Conferência do Clima (COP 30), que será realizada em novembro, em Belém, a integração dos mercados de carbono, por meio de uma associação entre os mercados já existentes.
Além da União Europeia, China e o estado norte-americano da Califórnia possuem mercados regulados.
“Uma das pautas que a gente quer discutir para a COP 30 é uma integração dos mercados de carbono, criando uma associação entre mercados já existentes e evitando o chamado efeito carona, que é o país e a empresa que não está dentro desse mercado, não precifica o carbono na origem e, no fundo, se aproveita do esforço de descarbonização de quem está fazendo esse movimento”, disse.
Segundo Dubeux, a ideia é que essa integração dos mercados de carbono seja associada à criação de um ajuste de fronteira — imposto para sobretaxar importado “poluente” — para todos os países que estão fora da associação.
“Vislumbramos um potencial de criar essa associação com a União Europeia, com a Califórnia e com a China. Se conseguirmos uma parceria dentro desses países para integrar esse mercado de carbono e criar esse ajuste de fronteira, isso seria um grande passo para avançarmos na agenda internacional de precificação de carbono, sem ser na lógica tradicional das negociações de COP, que exigem a aprovação unanime dos 200 países que estão participando. Nesse caso, é possível fazer uma coalização”, diz.