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ESTRATÉGIA CONTRA A VIOLENCIA

Como reduzir a criminalidade na Grande São Paulo? Um bom começo é adequar a partilha dos recursos policiais

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 11h25.

Nenhuma questão emergiu de maneira tão dramática na Grande São Paulo como o crescimento da violência. É claro que há também alguns focos no interior, mas os principais indicadores de violência comprovam que a região metropolitana se destacou no estado. Enquanto a população cresceu 12% entre 1991 e 2000, os assassinatos aumentaram 57%, os roubos 126%, e os furtos e roubos de veículos 175%. Pelo menos 2 mil crimes violentos são praticados a cada dia na Grande São Paulo. A facilidade com que se comete tamanha quantidade de crimes produziu variações inusitadas de ações, como os seqüestros relâmpagos (mais de 2 mil só na zona oeste da capital no ano de 2000), e o aumento de 300% dos seqüestros "tradicionais" no ano passado.

O curioso é que nos últimos seis anos o efetivo policial cresceu, os salários dos policiais dobraram e muito equipamento (veículos, armas, coletes, computadores) foi incorporado aos recursos da instituição. Sem argumentos para a ineficiência -- em apenas 2% dos seqüestros relâmpagos os assaltantes são presos e só 2,5% dos demais crimes são esclarecidos --, muitas autoridades recorrem ao bode expiatório das más condições sociais da população. Dados do IBGE e do Ipea evidenciam, no entanto, que as condições sociais, apesar de precárias, melhoraram um pouco na última década. E não há pesquisa séria capaz de relacionar o desemprego com o aumento de bandidos nas ruas.

Os principais responsáveis pela prevenção e pelo controle de comportamentos criminosos são órgãos públicos como as agências sociais e a polícia. Elas não responderam eficientemente às mudanças sociais e criminais ocorridas ao longo dos anos. Isso fez que a violência saísse do controle para se converter numa crise pública. As reações convencionais do aparato público de segurança -- mais recursos e mais resposta policial -- de nada adiantaram para reverter a explosão da criminalidade. Também não valeram os altos investimentos em corporações de guardas e ações sociais dos municípios. A persistirem as condições e as práticas dos principais órgãos de prevenção do crime, a rica região continuará a sofrer e o custo da violência seguirá consumindo entre 8% e 10% do PIB de 147 bilhões de dólares.

Problema tão complexo não se resolve com soluções simples. O que fazer para reduzir a violência na Grande São Paulo? A resposta pode estar nos sete passos seguintes.

COMPATIBILIZAR RECURSOS
Vivem na Grande São Paulo 46% da população do Estado. Mas é nessa região que se concentram 69% dos assassinatos, 70% dos roubos em geral e 80% dos roubos de veículos. O corpo policial da região representa pouco mais de um terço do efetivo estadual. A inadequada distribuição dos recursos é um fato: a problemática cidade de São Bernardo do Campo, com seus 703 mil habitantes, tem menos policiais que Ribeirão Preto, com população 30% menor. Araçatuba tem metade da população do violento município de Diadema, mas o número de policiais nas duas cidades é praticamente o mesmo. É preciso reajustar todo o recurso policial da Grande São Paulo para fazer frente às suas diferenciadas necessidades. Não se deve descartar a criação de uma polícia exclusiva para a região metropolitana, com organização mais apropriada às suas peculiaridades.

INTEGRAR E COOPERAR
Se instituições e órgãos não conseguem debelar a criminalidade atuando isoladamente, é necessário que combinem seus esforços numa ação cooperativa sinérgica. É fundamental integrar a Polícia Civil com a Militar no limite das possibilidades, a fim de que haja compartilhamento de estruturas, normas, treinamento, planejamento e ações. É crucial também a integração e cooperação das polícias com outros órgãos públicos, principalmente com as prefeituras, para ajustar os esforços de prevenção. Em cada cidade devem ser criados conselhos de segurança pública integrados pelos chefes policiais e representantes de entidades públicas e comunitárias. Por meio desses conselhos é possível refinar diagnósticos e articular programas e ações para cuidar dos múltiplos aspectos da prevenção e redução contínua dos crimes.

NOVAS TÉCNICAS DE INTELIGENCIA
O tradicionalismo do esforço policial e das ações sociais deve ser renovado com o uso intensivo de tecnologia da informação e com a aplicação de inteligência no planejamento da redução dos crimes. O sistema atualmente empregado nas delegacias da capital -- basicamente um banco inteligente de dados online -- pode ser aperfeiçoado e expandido para as cidades problemáticas. Esse sistema, aliado a treinamento em inteligência, possibilita detectar padrões criminais em cada localidade e orientar ações policiais mais precisas para a redução dos crimes. Também possibilita indicar ações complementares de outros órgãos públicos. Atuando em condições ambientais dos locais críticos -- iluminação, bares irregulares ligados a crimes, ofertas de lazer --, o poder público pode influir na redução dos delitos. Esses métodos e técnicas devem ajudar as polícias e outras autoridades a abandonar a atitude passiva de meramente reagir ao crime.

MODERNIZAR AS POLICIAS
A organização da polícia é excessivamente burocratizada e ultrapassada, o que dificulta sua agilidade operacional. Os métodos de administração dos chefes policiais ainda são típicos dos anos 30 do século passado. É preciso modernizar a organização e capacitar os quadros gerenciais para melhorar seu desempenho. Essa capacitação deve contar com a participação das universidades e com o apoio do meio empresarial, habituado às práticas modernas de gestão.

AGENCIA METROPOLITANA DE SEGURANÇA
Uma agência metropolitana de segurança poderia ser um elemento de articulação entre as prefeituras, o estado e o governo federal para desenvolver soluções dos problemas regionais de violência. Essa agência, com representação de cada instância de governo, deveria ter poderes para definir as responsabilidades, as prioridades e a combinação de ações. Por meio de um fundo metropolitano, com aportes adicionais de repasse do governo federal, seria possível financiar projetos sociais de prevenção da violência, além de fornecer recursos críticos à eficácia do esforço policial.

IR PARA A PERIFERIA
Os grandes focos de crimes e criminosos estão na periferia. O estado deve levar suas estruturas e programas de assistência -- social, educacional, jurídica e de saúde -- aos locais críticos para reduzir a tensão e promover a convivência pacífica. Os Centros Integrados de Cidadania (CIC) implantados pelo governo estadual são um modelo a ser expandido. Onde há desordem urbana o crime aparece e cresce. A severa regulação do funcionamento noturno de bares em cidades violentas, como Barueri e Hortolândia, resultou, em curtíssimo prazo, na redução de mais de 50% dos crimes graves. A ordem é restabelecida e o crime cai quando se impõem normas ao barulho noturno, aos camelôs e a bares e hotéis ligados a prostituição e tráfico. Investir na recuperação de áreas urbanas degradadas ajuda a aumentar a segurança.

PRESSIONAR OS POLITICOS
A população das cidades do interior sabe pressionar seus políticos. Isso raramente ocorre com o difuso aglomerado da Grande São Paulo. Lideranças empresariais, sindicais, religiosas e comunitárias devem mobilizar a população para pressionar os políticos a priorizar soluções concretas para a segurança da região. A precária situação da segurança pública na região é prova suficiente de que não podemos deixar essa questão exclusivamente nas mãos dos políticos e da polícia.

E, por fim, que tal discutir a provocativa idéia sugerida por Norman Gall, diretor do Instituto Fernand Braudel, de criar um novo estado abrangendo a Grande São Paulo? Com PIB equivalente ao da Argentina e representação política com três senadores e 30 deputados federais, esse estado teria certamente melhores condições de cuidar dos problemas da região, inclusive da prioritária questão da segurança pública.

José Vicente da Silva Filho, coronel de reserva da PM, é consultor de segurança e pesquisador do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial

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