Empresas seguram demissões em meio à crise, mas pior pode estar por vir
Taxa de desemprego é o último indicador a reagir após uma crise. Foi assim em 2016 e deve se repetir com impacto da pandemia no mercado de trabalho
Ligia Tuon
Publicado em 28 de julho de 2020 às 18h31.
Última atualização em 28 de julho de 2020 às 19h53.
O mercado de trabalho formal segue reagindo em meio à crise do coronavírus, após registrar expressiva queda no saldo de vagas em abril e uma modesta recuperação em maio, como mostrou o Caged nesta terça-feira, 28. Essa tendência positiva, no entanto, pode ser revertida com o fim do programa de auxílio à folha de pagamento das empresas, estendido até setembro.
O resultado das demissões e contratações em junho superou as expectativas para o mês, com um saldo negativo de cerca de 10 mil vagas ante uma perda líquida da ordem de 300 mil no mês anterior e de mais de 900 mil em abril, pior mês da crise do coronavírus .
A reação positiva no mercado de trabalho, segundo o secretário Bruno Bianco pode significar que uma recuperação em “V” (mais rápida) é possível, como tem dito o ministro da Economia, Paulo Guedes. Para economistas, porém, essa expectativa pode ruir ainda neste ano:
"Com o fim do auxilio, teremos continuidade das falências, recuperações judiciais, inadimplência, que vão estar a toda no segundo semestre", diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. Essa deterioração do cenário, segundo ele ainda vai culminar num aumento importante do desemprego do atuais 13% para 17% em dezembro.
Diferentemente do Caged, a taxa de desemprego medida pelo IBGE a partir da Pnad Continua leva em conta trabalhadores informais e também quem está fora da força de trabalho. "O desemprego ainda não apareceu, porque as pessoas pararam de procurar trabalho, ou seja, saíram da força de trabalho, o que deixa a taxa mais baixa", diz Vale.
A equipe econômica diz que acompanha o cenário “com lupa” e que pode lançar outros programas assim que necessário. Além disso, Guedes espera controlar grande parte da incerteza que haverá após o fim da ajuda federal com a desoneração da folha que deverá propor na próxima fase da reforma tributária, prevista para ser divulgada em agosto.
Segundo os economistas do governo, há ainda “medidas importantes para o incremento dos empregos” que podem ser divulgadas em breve e que beneficiariam o mercado de trabalho no longo prazo.
Desonerar a folha não basta
"Medidas do governo que ajudem a desonerar a folha e que incentivem o mercado formal sempre são interessantes, mas as medidas de curto prazo que a gente precisaria ter são medidas de crescimento, que melhorem a produtividade, ou seja, as reformas microeconômicas", diz Vale.
O economista explica que o governo está gastando o que pode e o que não pode na politica fiscal e na monetária para tentar estimular a atividade, mas olhando num horizonte mais longo, a economia precisa de outros elementos para fazer crescimento acontecer.
Segundo Marcel Balassiano, do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV),sinais de que a economia pode estar reagindo melhor do que o esperado à crise não significam que uma recuperação em "V", como menciona o secretário do governo, mas, sim, que as previsões mais pessimistas, como a do FMI, que viu queda de 9% para o PIB brasileiro neste ano, não devem se concretizar.
Uma onda de revisões para o PIB deste ano pode ser vista também no Boletim Focus, que tem revisado para baixo a queda do PIB há quatro semanas seguidas, indo para5,77% na última segunda-feira. "O próprio Ibre revisou de -6,4% para -5,5% sua expectativa para a retração da atividade. Mas, ainda assim, não devemos esquecer que é queda prevista para este ano é acentuada e terá consequências para o mercado de trabalho", diz Balassiano.
Os empregos, sobretudo do mercado formal, reagem muito fortemente a mudanças na economia, ressalta o economista, e quando começar a haver melhoria, será pela informalidade, diz ele, como vinha acontecendo nos últimos anos, após o mercado de trabalho sofrer com a recessão de 2015 e 2016.
"O desemprego é a última variável a sair da crise. Prova disso é que, entre 2016 e 2019, período em que tivemos reformas, mas também muita instabilidade politica, a taxa caiu de 13% para 11,5% em fevereiro deste ano. Foi muto devagar e acho que vamos passar de novo por essa queda muito lenta nos próximos anos", completa Vale.