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Acordo entre UE e Mercosul terá ratificação dura, mas pode pegar um atalho

Para o analista de política comercial do bloco europeu, Guillaume Van der Loo, 80% do pacto entre Mercosul e União Europeia por ser executado em breve

Brexit: se deixar a União Europeia, Reino Unido terá que fazer novos acordos comerciais com o Mercosul (Francois Lenoir/Reuters)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 1 de dezembro de 2019 às 11h42.

Última atualização em 6 de dezembro de 2019 às 07h44.

São Paulo - Com a provável saída do Reino Unido da União Europeia , os britânicos terão de negociar com os países do Mercosul a manutenção de aspectos do acordo comercial fechado com Bruxelas. Embora o pacto firmado entre os dois blocos após 20 anos de negociação ainda exija ratificação por todos os países-membros, há um atalho para que 80% do acordo seja executado de maneira provisória a partir da assinatura ou meses depois dela.

A avaliação é do analista de questões legais da política comercial do bloco europeu, o belga Guillaume Van der Loo. O pesquisador do Centro de Estudos Políticos Europeu esteve em São Paulo na última semana para um evento da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) sobre o tema e deu entrevista ao Estado.

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Quais as expectativas para a aprovação e ratificação do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia?

As negociações levaram cerca de 20 anos e podemos dizer que a parte mais difícil ainda vai começar, que é o processo de assinatura e ratificação. Falando pelo lado europeu, para esse processo ainda há algumas preocupações e questões pendentes. Do ponto de vista dos procedimentos, das instituições e dos atores que precisam assinar e ratificar o pacto, estão o Conselho Europeu, que representa os Estados-membros, e os Parlamentos nacionais de todos os países.

Todos precisam assinar e ratificar o acordo?

Sim, e isso complica a questão, porque cada um dos 28 Estados-membros segue a própria Constituição. Em alguns deles, seus Parlamentos têm duas Casas e todas precisam aprovar e ratificar. Na Bélgica, por exemplo, até mesmo os Parlamentos regionais precisam assinar e ratificar o acordo.

Alguém pode vetar?

Um exemplo de quão problemático e difícil pode ser o processo de assinatura é o caso do acordo econômico assinado entre a União Europeia e o Canadá, há dois anos. Ele é um dos casos que chamamos de "acordo mix", que significa que precisa ser assinado e ratificado não apenas pela União Europeia, mas por todos os Estados-membros. Por razões políticas, em uma região da Bélgica, um Parlamento local tem bloqueado a assinatura desse acordo para toda a União Europeia. Esse exemplo foi apenas para ilustrar que, se um país disser não, é não. Esse longo processo de ratificação, normalmente, pode levar de três a cinco anos.

Há alguma brecha?

A boa notícia é que existe um clássico atalho para contornar esse processo. Ele é chamado, sob a lei internacional, de "aplicação provisória". Ele diz que, se a União Europeia e os países do Mercosul concordarem - e isso deve ser proposto pelos europeus -, eles poderão aplicar provisoriamente partes do acordo. Na verdade, 80% do pacto pode ser executado no momento da assinatura ou alguns meses depois dela.

Por que não é assim direto?

Há provisões que são de competência dos países-membros, e não da União Europeia. A ideia básica dessa aplicação provisória é que os Estados envolvidos possam começar a aplicar as partes que seguem as regras do bloco. Assim, os países-membros não têm de reagir e não precisam se envolver. É difícil pôr em números, mas isso representa a maior parte dos acordos, cerca de 90% dos que estão sob a competência do bloco.

Estamos falando de um bloco de 28 membros. E se ele cair para 27, após o Brexit?

Bem, o Brexit tem sido imprevisível. O cenário mais provável neste momento é o de que o Reino Unido saia mesmo da União Europeia em breve e é possível que o processo de assinatura do pacto comercial aconteça após o Brexit. No melhor dos cenários, ele será assinado em algum momento até o fim do próximo ano. Até lá, o Reino Unido, provavelmente, já terá iniciado sua desfiliação da União Europeia, entrando em um período de transição com Bruxelas. Durante esse período de transição, que pode levar até um ano, o Reino Unido ainda pode manter partes do acordo. Mas o Mercosul terá de aprovar isso também.

Então podemos esperar mais uma negociação?

Sim, mas isso depende, porque nesse período de transição, basicamente, o Reino Unido continuará como um membro de facto do bloco europeu. Temos então três períodos distintos. A fase em que o Reino Unido ainda é um Estado-membro. Depois, há o próximo período, de transição, no qual ele não será mais um membro da UE, tecnicamente, embora continuará sendo na prática. E há finalmente o período em que o país estará realmente fora do bloco.

Como será esse período de transição?

A principal ideia para esse período de transição é que a UE e o Reino Unido precisarão negociar um novo acordo sobre o futuro das relações comerciais entre os dois lados do Canal da Mancha. Atualmente, há apenas o acordo sobre a saída do país do bloco e o processo de separação. Esse entendimento apenas estabelece regulações e a mitigação das consequências, enquanto que o futuro das relações comerciais, por exemplo, ainda precisará ser negociado. Eles podem usar o período de transição para isso. O Reino Unido, contudo, não pode negociar com a União Europeia um acordo comercial enquanto ainda for membro do bloco. Isso seria muito estranho. Por isso existe o período de transição.

E o que acontece com o acordo entre UE e Mercosul durante essa fase de transição?

Se os países envolvidos quiserem, o Reino Unido poderá se manter parte do acordo comercial. Durante esse período, Mercosul e Reino Unido devem começar a negociar um acordo que poderia entrar em vigor no momento em que os britânicos deixarem a UE. Ele poderia ser parecido com o que já foi negociado com o bloco europeu, mas dependerá das preferências políticas de britânicos e do Mercosul.

E isso vale para os mais de mil acordos do bloco com outros países?

Sim. De um lado, temos os acordos internacionais que já estão em vigor e os quais o Reino Unido terá de renegociar. Será um esforço enorme para esse período de transição. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. (Renata Tranches)

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