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Crise na bolsa americana pode ser boa para o Brasil

Para um novo presidente no Brasil que precisa aprovar reformas, uma crise lá fora poderá ser o elemento que faltaria para acelerar o processo

BOLSA DE NOVA YORK NESTA SEGUNDA-FEIRA: saídas de recessões dependem também de liderança sobre os caminhos a serem tomados / Brendan McDermid/ Reuters
DR

Da Redação

Publicado em 6 de fevereiro de 2018 às 15h40.

Última atualização em 6 de fevereiro de 2018 às 16h08.

A correção nos preços dos ativos americanos começou, o que era bola cantada há muito tempo. O timing desses processos é sempre o mais desafiador, sendo que se imaginava mais provável de acontecer mais para o final do ano. Entretanto, pode ser que o ajuste da bolha acionária americana tenha começado, com as consequências tradicionais que se espera de tais quebras, ou seja, uma possível recessão.

Certamente, não deve ser nada parecido com a intensidade do que tivemos em 2008. Dessa vez, parece algo mais concentrado nos EUA, com características mais parecidas com a virada de 1991 ou mais especificamente a recessão de 2001. Até aqui, nada para se espantar, faz parte em qualquer economia tais ciclos ocorrerem.

O que será muito desafiador nesse momento é sair da crise tendo três características por trás. Primeiro, um Fed recém empossado para o qual não há garantias do que será feito. A reação de Jerome Powell será essencial, assim como Alan Greespan foi essencial na virada dos mercados em 1987. Saberemos disso nas próximas semanas, mas seu histórico na diretoria do próprio Fed pode trazer certa tranquilidade.

Segundo, a saída da recessão está incerta pela falta de instrumentos de política macroeconômica. Em geral, há um mix de estímulos fiscais e monetários que precisam ser feitos para reverter a recessão. Vimos o uso intenso dessas políticas a partir de 2008 e que garantiram que a crise, em que pese profunda, não virasse uma depressão. Dessa vez, entretanto, a taxa de juros está muito baixa, há excesso de liquidez mundo afora e a política fiscal apresenta um déficit que vai piorar com a reforma tributária. Um longo período de estímulo à economia deixa os EUA sem muita porta de saída.

Curiosamente, não deixa de ser parecido com o que aconteceu no Brasil a partir de 2008. Aqui também se usaram os instrumentos clássicos de saída de recessão, com o agravante de que continuaram a ser usados indefinidamente, bastando lembrar dos inúmeros aportes ao BNDES. O esgarçamento desses instrumentos levou à crise e a saída dela não dependeu disso, mas simplesmente da mudança de agenda geral de política econômica e política, com a entrada de Temer. Isso nos leva à terceira característica.

Saídas de recessões dependem também de liderança sobre os caminhos a serem tomados. No momento, os EUA padecem de uma falta grave de tal liderança. Trump é o exato oposto do que se espera para comandar tal recuperação.

Enganosamente, muitos contemplaram a Trump os bons números de 2017. Entretanto, essa situação nos remete ao Lula de 2003, em que o medo de seu governo causou estragos antes, mas a continuidade das políticas anteriores retomou o rumo da economia. No caso de Trump, havia mais medo na política do que na economia, e dado que a continuidade de certa forma se manteve nesta, o susto potencial de um estrago maior não aconteceu. A boa consequência foi uma economia forte em 2017, menos por méritos de Trump, e mais porque não se desviou na economia o que poderia ter se desviado. Manter na economia as boas práticas reforça o crescimento, que foi o que vimos em 2017.

Mas em uma crise, a liderança ativa para onde ir é relevante, especialmente na política fiscal, mas nesse caso também na pressão que a Casa Branca pode impor ao Fed, pelo estilo truculento de Trump. Com enormes dificuldades de articulação entre Executivo e Legislativo, arranjar soluções para uma crise não será nada fácil.

Que impacto pode haver no Brasil? Por hora, não há grandes mudanças. A nossa saída de crise é consistente e, em que pese as dificuldades políticas, ainda há soluções possíveis e prováveis pela vitória de um centro reformista. A confirmação de uma crise poderia temporariamente jogar a taxa de câmbio para cima, mas não teria o impacto profundo de crédito que ocorreu em 2008, o qual afetou o sistema financeiro brasileiro àquela altura. Assim, o crescimento esperado de 3,5% poderia sofrer um pequeno corte, temporário, mas bem menos do que em 2008.

Por isso, não haveria tempo hábil para grandes impactos na economia brasileira que afetassem a dinâmica política este ano. Mas o dilema a ser enfrentado não será tanto as consequências imediatas de uma crise, mas os fatores que elencamos acima e que dificultam vislumbrar uma saída rápida. Para um novo presidente no Brasil que precisa de tantas reformas para serem aprovadas, a consolidação de uma crise lá fora poderá ser o elemento que faltaria para acelerar o processo de reformas.

Talvez essa seja uma crise que possa trazer consequências positivas para nossa economia, por mais paradoxal que seja. Como mudamos o rumo apenas a reboque de situações trágicas, talvez era essa que faltava para reforçar a necessidade especialmente da aprovação da reforma da previdência. Pelo andar da carruagem, vamos precisar de nova situação como essa para quebrar a espinha do corporativismo de Brasília.

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A correção nos preços dos ativos americanos começou, o que era bola cantada há muito tempo. O timing desses processos é sempre o mais desafiador, sendo que se imaginava mais provável de acontecer mais para o final do ano. Entretanto, pode ser que o ajuste da bolha acionária americana tenha começado, com as consequências tradicionais que se espera de tais quebras, ou seja, uma possível recessão.

Certamente, não deve ser nada parecido com a intensidade do que tivemos em 2008. Dessa vez, parece algo mais concentrado nos EUA, com características mais parecidas com a virada de 1991 ou mais especificamente a recessão de 2001. Até aqui, nada para se espantar, faz parte em qualquer economia tais ciclos ocorrerem.

O que será muito desafiador nesse momento é sair da crise tendo três características por trás. Primeiro, um Fed recém empossado para o qual não há garantias do que será feito. A reação de Jerome Powell será essencial, assim como Alan Greespan foi essencial na virada dos mercados em 1987. Saberemos disso nas próximas semanas, mas seu histórico na diretoria do próprio Fed pode trazer certa tranquilidade.

Segundo, a saída da recessão está incerta pela falta de instrumentos de política macroeconômica. Em geral, há um mix de estímulos fiscais e monetários que precisam ser feitos para reverter a recessão. Vimos o uso intenso dessas políticas a partir de 2008 e que garantiram que a crise, em que pese profunda, não virasse uma depressão. Dessa vez, entretanto, a taxa de juros está muito baixa, há excesso de liquidez mundo afora e a política fiscal apresenta um déficit que vai piorar com a reforma tributária. Um longo período de estímulo à economia deixa os EUA sem muita porta de saída.

Curiosamente, não deixa de ser parecido com o que aconteceu no Brasil a partir de 2008. Aqui também se usaram os instrumentos clássicos de saída de recessão, com o agravante de que continuaram a ser usados indefinidamente, bastando lembrar dos inúmeros aportes ao BNDES. O esgarçamento desses instrumentos levou à crise e a saída dela não dependeu disso, mas simplesmente da mudança de agenda geral de política econômica e política, com a entrada de Temer. Isso nos leva à terceira característica.

Saídas de recessões dependem também de liderança sobre os caminhos a serem tomados. No momento, os EUA padecem de uma falta grave de tal liderança. Trump é o exato oposto do que se espera para comandar tal recuperação.

Enganosamente, muitos contemplaram a Trump os bons números de 2017. Entretanto, essa situação nos remete ao Lula de 2003, em que o medo de seu governo causou estragos antes, mas a continuidade das políticas anteriores retomou o rumo da economia. No caso de Trump, havia mais medo na política do que na economia, e dado que a continuidade de certa forma se manteve nesta, o susto potencial de um estrago maior não aconteceu. A boa consequência foi uma economia forte em 2017, menos por méritos de Trump, e mais porque não se desviou na economia o que poderia ter se desviado. Manter na economia as boas práticas reforça o crescimento, que foi o que vimos em 2017.

Mas em uma crise, a liderança ativa para onde ir é relevante, especialmente na política fiscal, mas nesse caso também na pressão que a Casa Branca pode impor ao Fed, pelo estilo truculento de Trump. Com enormes dificuldades de articulação entre Executivo e Legislativo, arranjar soluções para uma crise não será nada fácil.

Que impacto pode haver no Brasil? Por hora, não há grandes mudanças. A nossa saída de crise é consistente e, em que pese as dificuldades políticas, ainda há soluções possíveis e prováveis pela vitória de um centro reformista. A confirmação de uma crise poderia temporariamente jogar a taxa de câmbio para cima, mas não teria o impacto profundo de crédito que ocorreu em 2008, o qual afetou o sistema financeiro brasileiro àquela altura. Assim, o crescimento esperado de 3,5% poderia sofrer um pequeno corte, temporário, mas bem menos do que em 2008.

Por isso, não haveria tempo hábil para grandes impactos na economia brasileira que afetassem a dinâmica política este ano. Mas o dilema a ser enfrentado não será tanto as consequências imediatas de uma crise, mas os fatores que elencamos acima e que dificultam vislumbrar uma saída rápida. Para um novo presidente no Brasil que precisa de tantas reformas para serem aprovadas, a consolidação de uma crise lá fora poderá ser o elemento que faltaria para acelerar o processo de reformas.

Talvez essa seja uma crise que possa trazer consequências positivas para nossa economia, por mais paradoxal que seja. Como mudamos o rumo apenas a reboque de situações trágicas, talvez era essa que faltava para reforçar a necessidade especialmente da aprovação da reforma da previdência. Pelo andar da carruagem, vamos precisar de nova situação como essa para quebrar a espinha do corporativismo de Brasília.

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