O que a tecnologia não conta no Relacionamento com Clientes
Aperfeiçoar a tecnologia no atendimento ao cliente é importante. Mas lembre-se: ele também é parte da equipe de desenvolvimento de produtos da empresa
Publicado em 9 de março de 2020 às, 04h00.
Última atualização em 9 de março de 2020 às, 04h00.
Atendimento Eletrônico: Olá, seja bem-vindo ao nosso atendimento. Para facilitar a sua vida, a partir de agora você pode falar aquilo que deseja. Então fale agora em poucas palavras o que você precisa.
Cliente: Eu preciso liberar o meu computador para acessar o aplicativo do banco
Atendimento Eletrônico: Eu não entendi o que você deseja. Fale em poucas palavras o que você deseja. Por exemplo, se você está com dificuldades em acessar o site do banco, diga ‘Internet’.
Cliente: Liberar; aplicativo; computador
Atendimento Eletrônico: Ah, agora eu entendi, você quer atendimento para o seu cartão de crédito. Estou transferindo sua ligação para a central de cartões.
Cliente: Nããão!
Embora surreal, este diálogo aconteceu semana passado comigo e o atendimento eletrônico do banco.
Com a utilização maciça da tecnologia nos dias atuais, o cliente não é apenas um agente espectador na relação, mas também parte da equipe de desenvolvimento de produtos da própria empresa.
Compreendo perfeitamente as limitações e o grande desafio de uma empresa em substituir a sua primeira camada de atendimento eletrônico do tipo “digite 1 para A, 2 para B, etc.”, por algo mais elaborado e muito mais complexo do que “fale o que você deseja”.
Desde a apresentação da Inteligência Artificial aplicada do Google Duplex em 2018 (https://www.youtube.com/watch?v=D5VN56jQMWM) com uma conversa que sem aviso jamais seria reconhecida como tendo sido feita a partir de um computador, ainda estamos relativamente distantes deste mesma qualidade no dia-a-dia.
Existe um natural ponto de conciliação entre aquilo que é possível e o que é desejado para os dois lados de uma relação empresa-cliente. Tipicamente uma empresa busca reduzir custos, maximizar resultados e ainda ter a maior satisfação possível dos clientes. Em contra partida o cliente quer pagar o mínimo, ter a maior qualidade possível e, de preferência, com poucas interações.
A “nova forma” de se fazer negócios que busca incluir o cliente no desenvolvimento e na entrega dos produtos e serviços visa exatamente diminuir a distância entre estes dois pontos da relação: a empresa e o cliente.
É provável que no caso em que cito, muito tempo e esforço tenha sido gasto para colocar a solução no ar por parte do banco, mas arrisco dizer com alguma segurança que o afã de se implementar em curto espaço de tempo tinha como foco redução de custo e não a entrega de melhores serviços para o cliente.
Eles estão cada vez mais próximos, mas ainda vejo dois mundos empresariais coexistirem: aqueles das empresas com mais de 30 anos de existência e as empresas dot com.
Para estas últimas existe uma natural complacência com relação à qualidade de atendimento, afinal, há (principalmente em pessoas mais novas) a compreensão de que empresas ponto.com tem estruturas enxutas, pouca gente atendendo e muita tecnologia rolando.
Não por acaso, nesta mesma semana fiz um contato com a empresa de filmes via streaming que assino para solicitar o não envio de novas mensagens via WhatApp. Começando que o atendimento via chat foi feito em Inglês e a pessoa que interagiu comigo disse que no sistema de atendimento dela só havia indicação de cancelamento para e-mail e SMS, mas não para WhatsApp.
Me recordo com alguma clareza que quando solicitei as mensagens via aplicativo o serviço era beta. E pelo jeito ainda continua. Isto é, como cliente tenho a consciência de que sou/fui parte da construção da solução de mensagens instantâneas da marca.
O problema é exatamente este, quando uma empresa que é reconhecida pelos seus clientes em um cenário de relacionamento mais próximo, estável e de muito tempo tenta virar, do dia para a noite, o seu modelo de ponta cabeça tentando se espelhar em um formato que cabe com algumas ressalvas para sua realidade.
Acho que se eu pudesse contribuir de alguma forma para este tipo de cenário seria o que vi recente em um cliente. Uma empresa com mais de 40 anos comprou toda a nova tecnologia mais recente para se comunicar no estado da arte como qualquer ponto.com. Palavras do Diretor de Operações: “Acho que fizemos os melhores investimentos, mas tenho uma pulga atrás da orelha se este volume massivo de comunicação de um dia para o outro não vai assustar e afugentar o cliente”.
Aproveitando esta declaração, minha sugestão seria: faça, mas vá devagar e com calma. Meça os resultados, avalie a reação e o entendimento do cliente enquanto você caminha.
Não é porque a empresa tem dinheiro e acesso à tecnologia que tudo de novo deve ser implementado. Ao mesmo tempo, ainda que o caminho seja inevitável, talvez um pouco de cuidado e atenção na relação com o cliente seja um bom remédio.
O cliente agradece!