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Uma nova era de déficits gêmeos

Estados Unidos pode estar enfrentando era que desequilibra renda de investimentos e problemas com dívidas globais

TRUMP: Presidente pode estar enfrentando era de déficits gêmeos / REUTERS | Joshua Roberts (Joshua Roberts/Reuters)
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Da Redação

Publicado em 28 de fevereiro de 2018 às 08h47.

Há muitos anos, quando os dinossauros rondavam a Terra e alguns republicanos ainda faziam sentido, o governo Reagan perseguiu uma política de cortes tributários e de incremento militar, mesmo que na ocasião o Federal Reserve estivesse apertando a política monetária para combater a inflação.

Esta política guarda algumas semelhanças óbvias com a Trumponomia. Além disso, duas coisas aconteceram mais ou menos ao mesmo tempo: Pela primeira vez, os Estados Unidos começaram a registrar déficits orçamentários amplos, em tempos de paz e de emprego pleno, aliados a déficits comerciais grandes e continuados.

À época, o economista Martin Feldstein famosamente associou os dois, chamando-os de “déficits gêmeos”. Ainda que isso simplificasse demais as coisas – no fim da década de 90 nós registramos superávits orçamentários juntamente com déficits comerciais, graças ao investimento em alta -, o raciocínio fazia sentido. O estímulo fiscal elevou diretamente os déficits comerciais ao estimular as despesas em geral, e o choque fiscal-monetário aumentou as taxas de juros, causando uma apreciação do dólar e realocando os gastos dos bens americanos para os do exterior.

Agora, o sempre interessante Brad Setser, pesquisador de economia no Conselho de Relações Exteriores, tem sugerido que uma história parecida talvez esteja acontecendo hoje, com os cortes fiscais alimentando um déficit comercial crescente; uma ironia, dada a obsessão do presidente Trump com os déficits comerciais como a raiz de todo o mal econômico. Um post recente do Sr. Setser ( aqui ) vale muito a leitura, mas eu tenho algumas poucas sugestões para dar.

Uma é simplesmente notar que, até agora, nós temos visto somente aumentos modestos nas taxas de juros e nenhuma alta do dólar. Ou seja, isso ainda não se parece tanto com a Reaganomics. Talvez seja algo que ainda vá acontecer, ou talvez os cortes fiscais de Trump não gerem muito estímulo fiscal; talvez eles só fiquem amontoados em lucros não distribuídos, ou sejam usados para recompra de ações que não fazem muita coisa em termos de gasto do consumidor. Ou talvez, como o Sr. Setser sugere implicitamente, nós precisemos recorrer ao argumento “mas no caso…”:  Mas no caso do corte fiscal, outros fatores, como o fortalecimento bastante real da economia europeia, estariam botando o dólar drasticamente para baixo.

Enquanto isso, eu estou tentando entender as declarações do Sr. Setser sobre a renda dos investimentos. Ele escreve: “Os EUA têm hoje uma grande reserva de dívida externa, de modo que uma taxa de juros nominal maior nos EUA mecanicamente conduz a um aumento dos juros liquidados dessa dívida externa (pagamentos de juros são uma grande parte da balança de rendimentos na conta corrente, em conjunto com a receita de dividendos sobre o investimento estrangeiro direto). A dívida externa dos Estados Unidos tem silenciosamente aumentado para aproximadamente 50% do PIB, ou seja, uma alta de um ponto percentual na taxa nominal de juros se traduz em meio ponto percentual de alta do PIB no volume de juros que os EUA terão de pagar para o mundo.”

Ok, eu não estou muito certo sobre a qual número da dívida externa ele está se referindo. A posição de investimento internacional líquido dos EUA é de cerca de 44% do produto interno bruto (PIB). Nossas dívidas globais brutas são muito maiores, em torno de 170% do PIB, com o componente da dívida delas na casa dos 70%. Qualquer efeito de juros deveria refletir nas dívidas globais, então eu acho que é muito maior do que sugere o Sr. Setser.

E há também outras duas coisas.

Primeira, ainda que os estrangeiros hoje tenham bastante capital próprio nos Estados Unidos, nós ainda somos uma espécie de fundo de investimentos entre os países: Nós temos uma dívida em dólares, e possuímos ativos que efetivamente estão em moedas estrangeiras. Isto tem a consequência peculiar de, ao contrário do que acontece com a maioria dos países endividados, qualquer alta do dólar piora nossa posição líquida dos investimentos; as dívidas crescem em conjunto com nosso câmbio; os ativos não. Isso também significa que um dólar em alta tende a ter um impacto negativo em nossa balança da renda de investimentos, bastante distante das taxas de juros, porque a renda das empresas americanas no exterior passa a valer menos em dólares.

Segundo, embora muitos dos nossos passivos em países estrangeiros sejam dívidas, também há muito capital próprio aqui – tanto que Steven M. Rosenthal, pesquisador-sênior do Centro de Políticas Tributárias Urban-Brookings, estimou que cerca de 35% dos cortes de impostos sobre as sociedades irão para estrangeiros. Esta é outra pancada significativa no equilíbrio da renda de investimentos.

Ou seja, será que nós estamos olhando para uma era trumpiana de déficits gêmeos? Sim, provavelmente. Mas os canais vão ser um pouco diferentes daqueles da era Reagan.

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Há muitos anos, quando os dinossauros rondavam a Terra e alguns republicanos ainda faziam sentido, o governo Reagan perseguiu uma política de cortes tributários e de incremento militar, mesmo que na ocasião o Federal Reserve estivesse apertando a política monetária para combater a inflação.

Esta política guarda algumas semelhanças óbvias com a Trumponomia. Além disso, duas coisas aconteceram mais ou menos ao mesmo tempo: Pela primeira vez, os Estados Unidos começaram a registrar déficits orçamentários amplos, em tempos de paz e de emprego pleno, aliados a déficits comerciais grandes e continuados.

À época, o economista Martin Feldstein famosamente associou os dois, chamando-os de “déficits gêmeos”. Ainda que isso simplificasse demais as coisas – no fim da década de 90 nós registramos superávits orçamentários juntamente com déficits comerciais, graças ao investimento em alta -, o raciocínio fazia sentido. O estímulo fiscal elevou diretamente os déficits comerciais ao estimular as despesas em geral, e o choque fiscal-monetário aumentou as taxas de juros, causando uma apreciação do dólar e realocando os gastos dos bens americanos para os do exterior.

Agora, o sempre interessante Brad Setser, pesquisador de economia no Conselho de Relações Exteriores, tem sugerido que uma história parecida talvez esteja acontecendo hoje, com os cortes fiscais alimentando um déficit comercial crescente; uma ironia, dada a obsessão do presidente Trump com os déficits comerciais como a raiz de todo o mal econômico. Um post recente do Sr. Setser ( aqui ) vale muito a leitura, mas eu tenho algumas poucas sugestões para dar.

Uma é simplesmente notar que, até agora, nós temos visto somente aumentos modestos nas taxas de juros e nenhuma alta do dólar. Ou seja, isso ainda não se parece tanto com a Reaganomics. Talvez seja algo que ainda vá acontecer, ou talvez os cortes fiscais de Trump não gerem muito estímulo fiscal; talvez eles só fiquem amontoados em lucros não distribuídos, ou sejam usados para recompra de ações que não fazem muita coisa em termos de gasto do consumidor. Ou talvez, como o Sr. Setser sugere implicitamente, nós precisemos recorrer ao argumento “mas no caso…”:  Mas no caso do corte fiscal, outros fatores, como o fortalecimento bastante real da economia europeia, estariam botando o dólar drasticamente para baixo.

Enquanto isso, eu estou tentando entender as declarações do Sr. Setser sobre a renda dos investimentos. Ele escreve: “Os EUA têm hoje uma grande reserva de dívida externa, de modo que uma taxa de juros nominal maior nos EUA mecanicamente conduz a um aumento dos juros liquidados dessa dívida externa (pagamentos de juros são uma grande parte da balança de rendimentos na conta corrente, em conjunto com a receita de dividendos sobre o investimento estrangeiro direto). A dívida externa dos Estados Unidos tem silenciosamente aumentado para aproximadamente 50% do PIB, ou seja, uma alta de um ponto percentual na taxa nominal de juros se traduz em meio ponto percentual de alta do PIB no volume de juros que os EUA terão de pagar para o mundo.”

Ok, eu não estou muito certo sobre a qual número da dívida externa ele está se referindo. A posição de investimento internacional líquido dos EUA é de cerca de 44% do produto interno bruto (PIB). Nossas dívidas globais brutas são muito maiores, em torno de 170% do PIB, com o componente da dívida delas na casa dos 70%. Qualquer efeito de juros deveria refletir nas dívidas globais, então eu acho que é muito maior do que sugere o Sr. Setser.

E há também outras duas coisas.

Primeira, ainda que os estrangeiros hoje tenham bastante capital próprio nos Estados Unidos, nós ainda somos uma espécie de fundo de investimentos entre os países: Nós temos uma dívida em dólares, e possuímos ativos que efetivamente estão em moedas estrangeiras. Isto tem a consequência peculiar de, ao contrário do que acontece com a maioria dos países endividados, qualquer alta do dólar piora nossa posição líquida dos investimentos; as dívidas crescem em conjunto com nosso câmbio; os ativos não. Isso também significa que um dólar em alta tende a ter um impacto negativo em nossa balança da renda de investimentos, bastante distante das taxas de juros, porque a renda das empresas americanas no exterior passa a valer menos em dólares.

Segundo, embora muitos dos nossos passivos em países estrangeiros sejam dívidas, também há muito capital próprio aqui – tanto que Steven M. Rosenthal, pesquisador-sênior do Centro de Políticas Tributárias Urban-Brookings, estimou que cerca de 35% dos cortes de impostos sobre as sociedades irão para estrangeiros. Esta é outra pancada significativa no equilíbrio da renda de investimentos.

Ou seja, será que nós estamos olhando para uma era trumpiana de déficits gêmeos? Sim, provavelmente. Mas os canais vão ser um pouco diferentes daqueles da era Reagan.

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