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Uma guerra comercial poderia deixar o mundo mais pobre

Crise de política comercial à vista causada pela dicotomia de Trump

TRUMP: Presidente mantem discurso de “vencer ou perder” / Carlo Allegri | Reuters (Carlo Allegri/Reuters)
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Da Redação

Publicado em 13 de março de 2018 às 11h43.

O tempo todo nós soubemos que Donald Trump é contundentemente ignorante sobre economia (e muitas outras coisas). Mas até este momento, isso não tinha feito muita diferença.

Ele assumiu o cargo em meio a uma recuperação sustentada que começou com seu antecessor, e esta retomada já havia elevado a economia dos EUA de volta ao ponto em que as regras políticas “normais” se aplicam: Taxas de juros estão acima de zero, e a política cambial é efetiva de novo, de modo que a gestão econômica no curto prazo tem ficado nas mãos razoavelmente confiáveis do Federal Reserve, e não na caótica Casa Branca de Trump. O que o presidente não sabia não podia nos machucar.

Mas sempre houve motivos para ficar preocupado com a possibilidade de uma crise – fosse uma criada por forças externas, como algum tipo de colapso financeiro, fosse uma criada pelo próprio governo. Neste caso a racionalidade do Fed não seria o bastante.

E está começando a parecer que nós temos uma crise de política comercial em nossas mãos.

O Sr. Trump sempre teve uma coisa com questões comerciais, que ele enxerga do mesmo modo que enxerga tudo o mais, como um teste de poder e de masculinidade. Tem tudo a ver com quem vende mais: Se nós tivermos um déficit comercial nós vencemos, e se nós tivermos um déficit comercial, nós perdemos.

Isto, está claro, é absurdo. O comércio não é um jogo de soma zero: Ele aumenta a produtividade e a fortuna da economia mundial. Para usar um exemplo nem um pouco aleatório, faz muito sentido produzir alumínio, um processo que usa amplas quantidades de eletricidade, em países como o Canadá, que têm energia hidrelétrica abundante. Ou seja, os Estados Unidos se beneficiam de importar o alumínio canadense, quer nós tenhamos ou não um déficit comercial com o Canadá. (Na verdade, nós não temos, mas esta não é nem de longe a questão.)

É verdade que os déficits comerciais podem ser um problema quando a economia está deprimida, e o desemprego em alta. É por isso que eu, da mesma maneira que muitos outros economistas, queria que nós tivéssemos adotado uma posição mais dura quanto à política cambial chinesa em 2010, quando nós tínhamos cerca de 9% de desemprego. Mas a discussão sobre se preocupar quanto a déficits comerciais, assim como a discussão sobre termos déficits orçamentários, em grande medida evaporou-se agora que o desemprego está de volta aos 4%.

Ou seja, nós não podemos “ganhar” uma guerra comercial. O que nós podemos fazer é dar início a um ciclo de retaliação olho por olho, e, quando se trata de questões comerciais, a América – que representa 9% das exportações mundiais e 14% das importações mundiais – não é de modo algum uma superpotência dominante.

Um ciclo de retaliação encolheria o comércio mundial em geral, fazendo do mundo como um todo, a América bastante incluída nisto, mais pobre. Talvez até mais importante no curto prazo, seria algo bastante prejudicial. Nós vivemos em uma era de cadeias de suprimento globais: Praticamente tudo que é produzido na América (e em qualquer outro lugar) usa insumos produzidos em outros países. Seu novo carro pode muito bem ter chassis montados nos Estados Unidos, um motor e sistema de fiação fabricados no México, componentes eletrônicos da Coreia e da China e, claro, aço e alumínio do Canadá.

Será que nós conseguiríamos fabricar carros sem nenhum desses componentes importados? Sim, eventualmente.

Mas chegar daqui até lá seria uma tremenda bagunça: Centenas, se não milhares, de fábricas teriam de fechar ou se transformar para outras funções. Deixemos para lá a perda líquida de empregos que uma guerra comercial de grandes proporções causaria, o que, no fim das contas, provavelmente seria um número relativamente pequeno. O ponto é que, em vez disso, a perda bruta de empregos seria enorme, já que milhões de trabalhadores seriam forçados a mudar de emprego, mudar para novos lugares e por aí vai. Além disso, muitos deles sofreriam perdas ao longo do processo que eles nunca conseguiriam recuperar.

Ah sim, além disso as empresas do lado prejudicado também perderiam trilhões no valor de suas ações.

Ou seja, a ideia de que uma guerra comercial seria “boa” e “fácil de ganhar”, como tem dito o Sr. Trump no Twitter, é insuperavelmente estúpida. O modo pelo qual o Sr. Trump parece estar começando sua guerra também é notavelmente estúpido. Começar protegendo bens que são insumos para indústrias que empregam muito mais pessoas do que aquelas protegidas? Fazê-lo em nome da segurança nacional – uma justificativa que, por boas razões, quase nunca é usada – quando a maior fonte destes insumos é aquela potência inimiga chamada Canadá?

Em si, estas tarifas não são grande coisa. Mas se elas forem um sinal de com que as políticas futuras irão se parecer, então elas são muito, muito ruins.

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O tempo todo nós soubemos que Donald Trump é contundentemente ignorante sobre economia (e muitas outras coisas). Mas até este momento, isso não tinha feito muita diferença.

Ele assumiu o cargo em meio a uma recuperação sustentada que começou com seu antecessor, e esta retomada já havia elevado a economia dos EUA de volta ao ponto em que as regras políticas “normais” se aplicam: Taxas de juros estão acima de zero, e a política cambial é efetiva de novo, de modo que a gestão econômica no curto prazo tem ficado nas mãos razoavelmente confiáveis do Federal Reserve, e não na caótica Casa Branca de Trump. O que o presidente não sabia não podia nos machucar.

Mas sempre houve motivos para ficar preocupado com a possibilidade de uma crise – fosse uma criada por forças externas, como algum tipo de colapso financeiro, fosse uma criada pelo próprio governo. Neste caso a racionalidade do Fed não seria o bastante.

E está começando a parecer que nós temos uma crise de política comercial em nossas mãos.

O Sr. Trump sempre teve uma coisa com questões comerciais, que ele enxerga do mesmo modo que enxerga tudo o mais, como um teste de poder e de masculinidade. Tem tudo a ver com quem vende mais: Se nós tivermos um déficit comercial nós vencemos, e se nós tivermos um déficit comercial, nós perdemos.

Isto, está claro, é absurdo. O comércio não é um jogo de soma zero: Ele aumenta a produtividade e a fortuna da economia mundial. Para usar um exemplo nem um pouco aleatório, faz muito sentido produzir alumínio, um processo que usa amplas quantidades de eletricidade, em países como o Canadá, que têm energia hidrelétrica abundante. Ou seja, os Estados Unidos se beneficiam de importar o alumínio canadense, quer nós tenhamos ou não um déficit comercial com o Canadá. (Na verdade, nós não temos, mas esta não é nem de longe a questão.)

É verdade que os déficits comerciais podem ser um problema quando a economia está deprimida, e o desemprego em alta. É por isso que eu, da mesma maneira que muitos outros economistas, queria que nós tivéssemos adotado uma posição mais dura quanto à política cambial chinesa em 2010, quando nós tínhamos cerca de 9% de desemprego. Mas a discussão sobre se preocupar quanto a déficits comerciais, assim como a discussão sobre termos déficits orçamentários, em grande medida evaporou-se agora que o desemprego está de volta aos 4%.

Ou seja, nós não podemos “ganhar” uma guerra comercial. O que nós podemos fazer é dar início a um ciclo de retaliação olho por olho, e, quando se trata de questões comerciais, a América – que representa 9% das exportações mundiais e 14% das importações mundiais – não é de modo algum uma superpotência dominante.

Um ciclo de retaliação encolheria o comércio mundial em geral, fazendo do mundo como um todo, a América bastante incluída nisto, mais pobre. Talvez até mais importante no curto prazo, seria algo bastante prejudicial. Nós vivemos em uma era de cadeias de suprimento globais: Praticamente tudo que é produzido na América (e em qualquer outro lugar) usa insumos produzidos em outros países. Seu novo carro pode muito bem ter chassis montados nos Estados Unidos, um motor e sistema de fiação fabricados no México, componentes eletrônicos da Coreia e da China e, claro, aço e alumínio do Canadá.

Será que nós conseguiríamos fabricar carros sem nenhum desses componentes importados? Sim, eventualmente.

Mas chegar daqui até lá seria uma tremenda bagunça: Centenas, se não milhares, de fábricas teriam de fechar ou se transformar para outras funções. Deixemos para lá a perda líquida de empregos que uma guerra comercial de grandes proporções causaria, o que, no fim das contas, provavelmente seria um número relativamente pequeno. O ponto é que, em vez disso, a perda bruta de empregos seria enorme, já que milhões de trabalhadores seriam forçados a mudar de emprego, mudar para novos lugares e por aí vai. Além disso, muitos deles sofreriam perdas ao longo do processo que eles nunca conseguiriam recuperar.

Ah sim, além disso as empresas do lado prejudicado também perderiam trilhões no valor de suas ações.

Ou seja, a ideia de que uma guerra comercial seria “boa” e “fácil de ganhar”, como tem dito o Sr. Trump no Twitter, é insuperavelmente estúpida. O modo pelo qual o Sr. Trump parece estar começando sua guerra também é notavelmente estúpido. Começar protegendo bens que são insumos para indústrias que empregam muito mais pessoas do que aquelas protegidas? Fazê-lo em nome da segurança nacional – uma justificativa que, por boas razões, quase nunca é usada – quando a maior fonte destes insumos é aquela potência inimiga chamada Canadá?

Em si, estas tarifas não são grande coisa. Mas se elas forem um sinal de com que as políticas futuras irão se parecer, então elas são muito, muito ruins.

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