Um grande prêmio para os investidores ricos
Os republicanos aprovaram um grande corte tributário para as empresas com o argumento de que a medida beneficiaria os trabalhadores; mas as percepções da população sobre os reais beneficiários da lei se mostram corretas
Da Redação
Publicado em 15 de maio de 2018 às 15h54.
Candidatos republicanos praticamente pararam de falar sobre a maior conquista do partido deles no governo Donald Trump, o corte tributário de 2017. Anúncios promovendo a lei fiscal têm em grande parte desaparecido das emissoras. Mas os irmãos Koch – grandes incentivadores do corte, e entre seus maiores beneficiários – não desistiram.
A última dos irmãos: gastar 20 milhões de dólares para mobilizar um exército de vendedores de porta em porta para tentar desconvencer eleitores da impressão de que o corte fiscal foi um grande prêmio para os ricos, e que ofereceu pouca coisa às famílias de trabalhadores comuns.
Eles têm um problema, porém: as percepções do público sobre quem se beneficia, ou não, do corte de impostos, são precisas, um argumento que a Apple acaba de demonstrar lindamente com o anúncio da empresa de uma grande recompra de suas ações.
Para ser justo, a ideia de que um grande corte tributário para empresas, que foi o principal elemento da lei do ano passado, possa eventualmente resultar em benefícios aos trabalhadores não é absurda. Mas as duas palavras-chave aqui são “pode” e “eventualmente”.
A história que os estimuladores do corte fiscal contam é a seguinte: os Estados Unidos é parte de um mercado global de capitais em que o capital flui para qualquer lugar com a maior taxa líquida de retorno. Ao cortar impostos de empresas, o Sr. Trump e seus aliados têm dado às corporações um incentivo para investirem aqui. O investimento vai aumentar a capacidade, fazendo crescer a demanda por trabalhadores e, assim, levando a salários maiores.
E por algum tempo a Apple parecia agir de acordo com o script. Em janeiro, a empresa anunciou que traria a maioria dos 252 bilhões de dólares que tem em dinheiro e estava guardando no exterior de volta aos Estados Unidos.
Mas o que “trazer o dinheiro aos EUA” quer dizer? A Apple não tinha uma pilha enorme de ouro à la Tio Patinhas sentada na Irlanda, que ela então botou em um navio a caminho de casa. Ela possui créditos eletrônicos – um monte de zeros e uns em algum servidor em algum lugar -, os quais de fato tinham um rótulo dizendo “este dinheiro está na Irlanda”. Agora, ela mudou esse rótulo para dizer “este dinheiro está na América”. Que diferença isso faz?
Bem, isso altera as obrigações fiscais da empresa com os governos dos EUA e da Irlanda, o que era a ideia. Mas, fora isso, não faz diferença alguma.
O que faria diferença seria se a Apple decidisse gastar dinheiro em coisas de verdade: contratar mais trabalhadores, construir novas estruturas, instalar mais equipamentos. Mas ela não está fazendo nenhuma dessas coisas.
Em vez disso, na semana passada a empresa anunciou que está comprando de volta 100 bilhões de dólares de suas próprias ações, o que é bom para os acionistas mas não muda nada para os empregados. Várias outras empresas estão fazendo a mesma coisa.
E embora muitos americanos tenham algumas ações, a maior parte do valor das ações é mantido por uma minoria pequena e rica; 10% da população detêm 84% do mercado. Ou seja, a percepção de que este é basicamente um corte de impostos para os ricos está certa.
Mas por que os benefícios do corte fiscal não estão escoando para os trabalhadores?
Uma resposta é que, ainda que a história dos favoráveis ao corte fiscal fosse verdadeira no longo prazo, levaria muitos anos de investimentos extremamente elevados para se obter o tipo de ampliação da capacidade que levasse a grandes ganhos salariais. Outra é que o mercado global de capitais não é tão global assim; o mundo dos investimentos, nós poderíamos dizer, ainda está muito longe de ser plano. Os Estados Unidos são uma economia enorme, e mesmo no longo prazo ela não consegue atrair o tipo de entrada de capital que os entusiastas do corte fiscal vislumbram sem oferecer taxas de retorno significativamente maiores – o que significa mais para os acionistas e menos para os empregados.
Além disso, em um nível mais profundo, os defensores dos cortes tributários talvez tenham uma visão fundamentalmente desatualizada sobre de onde vêm os lucros.
No mundo segundo as autoridades de Trump, ou dos think tanks de direita como a Tax Foundation, os lucros das empresas são basicamente um retorno do capital físico, na forma de tijolo, cimento e máquinas. Corte os impostos, e as empresas vão acrescentar mais capital físico, aumentando a competição pela mão de obra; os lucros vão diminuir enquanto os salários subirão.
A Apple, entretanto, não é nenhum pouco assim. Os lucros dela vêm de sua posição no mercado – sua marca, por assim dizer. Não importa se você acha que ela merece o papel que tem como uma quase monopolista; o que importa é que, dada a posição da empresa, ela pode e cobra o que os mercados suportam, na maioria das vezes independentemente dos custos. Se o Sr. Trump cortar os impostos dela, a empresa mantém mais dos seus lucros, mas não tem um incentivo real para mudar de comportamento, digamos, construindo mais lojas da Apple. Ela apenas pega o dinheiro extra e ou senta em cima dele ou o devolve aos acionistas com a recompra de ações.
No mais, nos dias de hoje grande parte dos EUA empresarial é no mínimo um pouco como a Apple. Não toda ele: ainda há negócios – por exemplo, empresas de camionagem – cujo valor está em grande medida nas coisas que eles possuem. Mas os “aluguéis” econômicos, lucros não vinculados ao capital físico, são uma história grande e que só cresce.
E, quando você corta impostos sobre os aluguéis, não há razão alguma para esperar que os trabalhadores compartilhem dos benefícios, nem mesmo no longo prazo.
O resultado – que vai continuar a ser verdade, não importa quanto os Koch gastem tentando convencer você do contrário – é que aquilo que parece como um grande prêmio para investidores ricos é, na verdade, um grande prêmio para investidores ricos.
Candidatos republicanos praticamente pararam de falar sobre a maior conquista do partido deles no governo Donald Trump, o corte tributário de 2017. Anúncios promovendo a lei fiscal têm em grande parte desaparecido das emissoras. Mas os irmãos Koch – grandes incentivadores do corte, e entre seus maiores beneficiários – não desistiram.
A última dos irmãos: gastar 20 milhões de dólares para mobilizar um exército de vendedores de porta em porta para tentar desconvencer eleitores da impressão de que o corte fiscal foi um grande prêmio para os ricos, e que ofereceu pouca coisa às famílias de trabalhadores comuns.
Eles têm um problema, porém: as percepções do público sobre quem se beneficia, ou não, do corte de impostos, são precisas, um argumento que a Apple acaba de demonstrar lindamente com o anúncio da empresa de uma grande recompra de suas ações.
Para ser justo, a ideia de que um grande corte tributário para empresas, que foi o principal elemento da lei do ano passado, possa eventualmente resultar em benefícios aos trabalhadores não é absurda. Mas as duas palavras-chave aqui são “pode” e “eventualmente”.
A história que os estimuladores do corte fiscal contam é a seguinte: os Estados Unidos é parte de um mercado global de capitais em que o capital flui para qualquer lugar com a maior taxa líquida de retorno. Ao cortar impostos de empresas, o Sr. Trump e seus aliados têm dado às corporações um incentivo para investirem aqui. O investimento vai aumentar a capacidade, fazendo crescer a demanda por trabalhadores e, assim, levando a salários maiores.
E por algum tempo a Apple parecia agir de acordo com o script. Em janeiro, a empresa anunciou que traria a maioria dos 252 bilhões de dólares que tem em dinheiro e estava guardando no exterior de volta aos Estados Unidos.
Mas o que “trazer o dinheiro aos EUA” quer dizer? A Apple não tinha uma pilha enorme de ouro à la Tio Patinhas sentada na Irlanda, que ela então botou em um navio a caminho de casa. Ela possui créditos eletrônicos – um monte de zeros e uns em algum servidor em algum lugar -, os quais de fato tinham um rótulo dizendo “este dinheiro está na Irlanda”. Agora, ela mudou esse rótulo para dizer “este dinheiro está na América”. Que diferença isso faz?
Bem, isso altera as obrigações fiscais da empresa com os governos dos EUA e da Irlanda, o que era a ideia. Mas, fora isso, não faz diferença alguma.
O que faria diferença seria se a Apple decidisse gastar dinheiro em coisas de verdade: contratar mais trabalhadores, construir novas estruturas, instalar mais equipamentos. Mas ela não está fazendo nenhuma dessas coisas.
Em vez disso, na semana passada a empresa anunciou que está comprando de volta 100 bilhões de dólares de suas próprias ações, o que é bom para os acionistas mas não muda nada para os empregados. Várias outras empresas estão fazendo a mesma coisa.
E embora muitos americanos tenham algumas ações, a maior parte do valor das ações é mantido por uma minoria pequena e rica; 10% da população detêm 84% do mercado. Ou seja, a percepção de que este é basicamente um corte de impostos para os ricos está certa.
Mas por que os benefícios do corte fiscal não estão escoando para os trabalhadores?
Uma resposta é que, ainda que a história dos favoráveis ao corte fiscal fosse verdadeira no longo prazo, levaria muitos anos de investimentos extremamente elevados para se obter o tipo de ampliação da capacidade que levasse a grandes ganhos salariais. Outra é que o mercado global de capitais não é tão global assim; o mundo dos investimentos, nós poderíamos dizer, ainda está muito longe de ser plano. Os Estados Unidos são uma economia enorme, e mesmo no longo prazo ela não consegue atrair o tipo de entrada de capital que os entusiastas do corte fiscal vislumbram sem oferecer taxas de retorno significativamente maiores – o que significa mais para os acionistas e menos para os empregados.
Além disso, em um nível mais profundo, os defensores dos cortes tributários talvez tenham uma visão fundamentalmente desatualizada sobre de onde vêm os lucros.
No mundo segundo as autoridades de Trump, ou dos think tanks de direita como a Tax Foundation, os lucros das empresas são basicamente um retorno do capital físico, na forma de tijolo, cimento e máquinas. Corte os impostos, e as empresas vão acrescentar mais capital físico, aumentando a competição pela mão de obra; os lucros vão diminuir enquanto os salários subirão.
A Apple, entretanto, não é nenhum pouco assim. Os lucros dela vêm de sua posição no mercado – sua marca, por assim dizer. Não importa se você acha que ela merece o papel que tem como uma quase monopolista; o que importa é que, dada a posição da empresa, ela pode e cobra o que os mercados suportam, na maioria das vezes independentemente dos custos. Se o Sr. Trump cortar os impostos dela, a empresa mantém mais dos seus lucros, mas não tem um incentivo real para mudar de comportamento, digamos, construindo mais lojas da Apple. Ela apenas pega o dinheiro extra e ou senta em cima dele ou o devolve aos acionistas com a recompra de ações.
No mais, nos dias de hoje grande parte dos EUA empresarial é no mínimo um pouco como a Apple. Não toda ele: ainda há negócios – por exemplo, empresas de camionagem – cujo valor está em grande medida nas coisas que eles possuem. Mas os “aluguéis” econômicos, lucros não vinculados ao capital físico, são uma história grande e que só cresce.
E, quando você corta impostos sobre os aluguéis, não há razão alguma para esperar que os trabalhadores compartilhem dos benefícios, nem mesmo no longo prazo.
O resultado – que vai continuar a ser verdade, não importa quanto os Koch gastem tentando convencer você do contrário – é que aquilo que parece como um grande prêmio para investidores ricos é, na verdade, um grande prêmio para investidores ricos.