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Trump põe a Rússia em primeiro no fiasco do G7

Nunca houve um desastre como o encontro do grupo realizado recentemente no Canadá, tudo por causa do comportamento de Donald Trump

A FOTO QUE SIMBOLIZA O G7: Trump de um lado, os líderes mundiais, puxados por Angela Merkel, de outro / Bundesregierung /Jesco Denzel/Handout via REUTERS
DR

Da Redação

Publicado em 19 de junho de 2018 às 16h07.

Por causa de toda a pompa, a maioria das reuniões de cúpula multilaterais são chatas e de poucas consequências. Uma vez eu falei com um funcionário do Departamento de Estado que tinha um cargo na organização destes eventos; eles descreveu o trabalho dele como “policiar as nuances”, o que dá uma ideia de quanta coisa normalmente está em jogo.

De vez em quando, porém, encontros assim têm consequências de verdade, boas ou ruins. O encontro de 2009 do Grupo dos 20, em que os países concordaram em conceder estímulos econômicos e empréstimos a países com problemas diante da crise financeira, teve no mínimo algum papel em ajudar o mundo a evitar um completo replay da década de 1930. O encontro de 2010, em comparação, na prática endossou uma guinada em direção à austeridade que atrasou significativamente a recuperação e que, pode-se discutir, preparou parcialmente o terreno para a ascensão do extremismo político.

Ainda assim, nunca houve um desastre como o encontro do G7 realizado recentemente no Canadá. Ele poderia marcar o início de uma guerra comercial, e talvez até mesmo a ruína da aliança ocidental. No mínimo ele vai manchar a reputação dos Estados Unidos como um aliado confiável por algumas décadas; mesmo que o presidente Trump eventualmente saia de cena em desgraça, o fato de que alguém como ele possa ter chegado ao poder para começo de conversa vai sempre estar na ponta da língua de qualquer um.

O que aconteceu em Quebec? Eu já estou vendo manchetes no sentido de que o Sr. Trump assumiu uma beligerante posição “a América primeiro”, cobrando grandes concessões de nossos aliados, o que já seria ruim. Mas a realidade foi muito pior.

Ele não colocou os EUA em primeiro lugar; a Rússia em primeiro seria uma descrição mais acertada. E ele não exigiu mudanças de políticas drásticas dos nossos aliados; ele cobrou deles que parassem de fazer coisas ruins que eles não estão fazendo. Essa não foi uma posição dura em defesa dos interesses americanos, foi uma declaração de ignorância e insanidade política.

O Sr. Trump começou com um pedido para que readmitissem a Rússia no grupo, o que não faz nenhum sentido. A verdade é que a Rússia, cujo produto interno bruto é quase do mesmo tamanho do da Espanha e um pouco maior que o do Brasil, sempre foi uma gambiarra no que deveria ser um grupo de grandes economias. Ela foi incluída por razões estratégicas, e chutada quando invadiu a Ucrânia. Não há razão possível para trazê-la de volta, a não ser o que quer que Vladimir Putin pessoalmente saiba a respeito do Sr. Trump.

Depois, o Sr. Trump exigiu que os outros integrantes do G7 removessem as tarifas “ridículas e inaceitáveis” deles sobre os bens americanos – o que seria difícil para eles fazerem, uma vez que suas taxas aduaneiras efetivas são muito baixas. A União Europeia, por exemplo, cobra uma tarifa média de apenas 3% sobre os bens dos EUA. Quem disse que o valor é esse? O próprio guia do governo dos EUA para exportadores.

É verdade, há alguns setores particulares em que cada país impõe barreiras especiais ao comércio. Sim, o Canadá impõe tarifas elevadas a certos laticínios. Mas é difícil argumentar que estes casos especiais sejam muito piores do que, digamos, a taxa de 25% que os EUA ainda impõem a caminhões leves. O panorama geral é que todos os integrantes do G7 têm mercados bastante abertos.

Portanto, de que diabos o Sr. Trump estava falando? Seus assessores econômicos têm afirmado repetidas vezes que impostos sobre o valor agregado, que têm um papel importante em muitos países, são uma espécie de protecionismo comercial injusto. Mas isso é ignorância pura: essas taxas não se traduzem em vantagem competitiva alguma — elas são só um jeito de implementar um imposto sobre vendas —, e é por isso que elas são legais de acordo com a Organização Mundial do Comércio. E o resto do mundo não vai mudar seu sistema fiscal inteiro porque o presidente americano decidiu ouvir assessores que não entendem nada.

Na verdade, porém, o Sr. Trump talvez sequer estivesse pensando nos impostos sobre valor agregado. Ele podia estar só reclamando. Afinal, ele se estende sobre outros grandes males que não existem, como uma imensa onda de crimes violentos cometidos por imigrantes ilegais (que lá atrás deram milhões de votos a Hillary Clinton).

Havia alguma estratégia por trás do comportamento do Sr. Trump? Bom, foi basicamente o que ele teria feito se fosse realmente o fantoche do Sr. Putin: gritar com os países amigos sobre pecados que eles não estão cometendo não vai trazer de volta os empregos americanos, mas é exatamente o que alguém que quer pôr um fim à aliança ocidental gostaria de ver.

Por outro lado, talvez ele estivesse apenas fingindo porque não conseguiu aguentar ter de passar horas com gente poderosa que não vai bajular nem suborná-lo colocando dinheiro nos negócios da família dele; pessoas que, de fato, sequer tentaram esconder o desprezo que sentem pelo homem liderando o que é, até o momento, uma grande potência.

O que quer que tenha acontecido de fato, este foi um completo e humilhante fracasso. E todos nós sabemos como o Sr. Trump responde a uma humilhação. Você precisa se perguntar o que vem depois. Uma coisa é certa: não vai ser algo bom.

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Por causa de toda a pompa, a maioria das reuniões de cúpula multilaterais são chatas e de poucas consequências. Uma vez eu falei com um funcionário do Departamento de Estado que tinha um cargo na organização destes eventos; eles descreveu o trabalho dele como “policiar as nuances”, o que dá uma ideia de quanta coisa normalmente está em jogo.

De vez em quando, porém, encontros assim têm consequências de verdade, boas ou ruins. O encontro de 2009 do Grupo dos 20, em que os países concordaram em conceder estímulos econômicos e empréstimos a países com problemas diante da crise financeira, teve no mínimo algum papel em ajudar o mundo a evitar um completo replay da década de 1930. O encontro de 2010, em comparação, na prática endossou uma guinada em direção à austeridade que atrasou significativamente a recuperação e que, pode-se discutir, preparou parcialmente o terreno para a ascensão do extremismo político.

Ainda assim, nunca houve um desastre como o encontro do G7 realizado recentemente no Canadá. Ele poderia marcar o início de uma guerra comercial, e talvez até mesmo a ruína da aliança ocidental. No mínimo ele vai manchar a reputação dos Estados Unidos como um aliado confiável por algumas décadas; mesmo que o presidente Trump eventualmente saia de cena em desgraça, o fato de que alguém como ele possa ter chegado ao poder para começo de conversa vai sempre estar na ponta da língua de qualquer um.

O que aconteceu em Quebec? Eu já estou vendo manchetes no sentido de que o Sr. Trump assumiu uma beligerante posição “a América primeiro”, cobrando grandes concessões de nossos aliados, o que já seria ruim. Mas a realidade foi muito pior.

Ele não colocou os EUA em primeiro lugar; a Rússia em primeiro seria uma descrição mais acertada. E ele não exigiu mudanças de políticas drásticas dos nossos aliados; ele cobrou deles que parassem de fazer coisas ruins que eles não estão fazendo. Essa não foi uma posição dura em defesa dos interesses americanos, foi uma declaração de ignorância e insanidade política.

O Sr. Trump começou com um pedido para que readmitissem a Rússia no grupo, o que não faz nenhum sentido. A verdade é que a Rússia, cujo produto interno bruto é quase do mesmo tamanho do da Espanha e um pouco maior que o do Brasil, sempre foi uma gambiarra no que deveria ser um grupo de grandes economias. Ela foi incluída por razões estratégicas, e chutada quando invadiu a Ucrânia. Não há razão possível para trazê-la de volta, a não ser o que quer que Vladimir Putin pessoalmente saiba a respeito do Sr. Trump.

Depois, o Sr. Trump exigiu que os outros integrantes do G7 removessem as tarifas “ridículas e inaceitáveis” deles sobre os bens americanos – o que seria difícil para eles fazerem, uma vez que suas taxas aduaneiras efetivas são muito baixas. A União Europeia, por exemplo, cobra uma tarifa média de apenas 3% sobre os bens dos EUA. Quem disse que o valor é esse? O próprio guia do governo dos EUA para exportadores.

É verdade, há alguns setores particulares em que cada país impõe barreiras especiais ao comércio. Sim, o Canadá impõe tarifas elevadas a certos laticínios. Mas é difícil argumentar que estes casos especiais sejam muito piores do que, digamos, a taxa de 25% que os EUA ainda impõem a caminhões leves. O panorama geral é que todos os integrantes do G7 têm mercados bastante abertos.

Portanto, de que diabos o Sr. Trump estava falando? Seus assessores econômicos têm afirmado repetidas vezes que impostos sobre o valor agregado, que têm um papel importante em muitos países, são uma espécie de protecionismo comercial injusto. Mas isso é ignorância pura: essas taxas não se traduzem em vantagem competitiva alguma — elas são só um jeito de implementar um imposto sobre vendas —, e é por isso que elas são legais de acordo com a Organização Mundial do Comércio. E o resto do mundo não vai mudar seu sistema fiscal inteiro porque o presidente americano decidiu ouvir assessores que não entendem nada.

Na verdade, porém, o Sr. Trump talvez sequer estivesse pensando nos impostos sobre valor agregado. Ele podia estar só reclamando. Afinal, ele se estende sobre outros grandes males que não existem, como uma imensa onda de crimes violentos cometidos por imigrantes ilegais (que lá atrás deram milhões de votos a Hillary Clinton).

Havia alguma estratégia por trás do comportamento do Sr. Trump? Bom, foi basicamente o que ele teria feito se fosse realmente o fantoche do Sr. Putin: gritar com os países amigos sobre pecados que eles não estão cometendo não vai trazer de volta os empregos americanos, mas é exatamente o que alguém que quer pôr um fim à aliança ocidental gostaria de ver.

Por outro lado, talvez ele estivesse apenas fingindo porque não conseguiu aguentar ter de passar horas com gente poderosa que não vai bajular nem suborná-lo colocando dinheiro nos negócios da família dele; pessoas que, de fato, sequer tentaram esconder o desprezo que sentem pelo homem liderando o que é, até o momento, uma grande potência.

O que quer que tenha acontecido de fato, este foi um completo e humilhante fracasso. E todos nós sabemos como o Sr. Trump responde a uma humilhação. Você precisa se perguntar o que vem depois. Uma coisa é certa: não vai ser algo bom.

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