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Quando fatos são considerados ataques regionais

Donald Trump venceu no Colégio Eleitoral pelo menos em parte porque prometeu recuperar postos de trabalho na indústria carvoeira dos Apalaches e trazer empregos na indústria de volta ao Cinturão da Ferrugem. Nenhuma dessas promessas pode ser cumprida – na maior parte dos casos estamos falando de empregos perdidos não para um competidor externo desleal, […]

TRUMP NA CARRIER: nós temos um governo que não consegue promover continuidade / Mike Segar/ Reuters
DR

Da Redação

Publicado em 22 de dezembro de 2016 às 10h33.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h45.

Donald Trump venceu no Colégio Eleitoral pelo menos em parte porque prometeu recuperar postos de trabalho na indústria carvoeira dos Apalaches e trazer empregos na indústria de volta ao Cinturão da Ferrugem. Nenhuma dessas promessas pode ser cumprida – na maior parte dos casos estamos falando de empregos perdidos não para um competidor externo desleal, mas para a mudança tecnológica.

Mas uma coisa engraçada acontece quando pessoas como eu tentam demonstrar isso: nós recebemos respostas furiosas de economistas que sentem uma afinidade com a classe trabalhadora das regiões atingidas – respostas que partem do princípio de que fazer essa conta deve ser um sinal de desprezo por culturas regionais ou algo assim.

Recentemente eu ponderei no meu blog sobre os dilemas de lidar com uma retaliação local desse tipo, e notei que até mesmo tentativas ostensivamente financiadas de apoiar as regiões em declínio não parecem funcionar muito bem. Eis o que eu disse: “(O) histórico de políticas de apoio locais em outros países, que gastam muito mais nestas coisas do que nós provavelmente faremos, é bastante pobre. Por exemplo, o apoio maciço à ex-Alemanha Oriental não evitou um grande declínio da população de lá, muito mais amplo que o declínio populacional nos Apalaches durante o mesmo período.”

Em resposta, eu recebi um comentário furioso do economista Lyman Stone me denunciando: “Krugman e aqueles que creem nele querem acreditar que os temores do apalaches (ou cinturão-ferrugistas, ou o que seja) são exagerados, e que a vida não tem sido tão ruim com eles quanto parece”, escreveu o Sr. Stone em seu blog.

Alto lá, eu disse isso? Acho que não. Se eu acreditasse que está tudo ok nos Apalaches, eu não teria comparado o lugar à Alemanha Oriental. O ponto foi precisamente que os Apalaches são um sinônimo de declínio regional, o que torna ainda mais marcante que a Alemanha Oriental, que recebeu o mesmo tipo de ajuda com que os Apalaches podem meramente sonhar, esteja sofrendo um declínio demográfico ainda mais acelerado.

Além disso, se é que faz alguma diferença, eu passei décadas escrevendo e falando sobre os problemas do crescimento das desigualdades e dos salários estagnados, de modo que me pintar como alguém que diz aos trabalhadores que os problemas deles existem somente em suas cabeças é bastante esquisito.

Agora, se nós quisermos ter um debate sobre políticas regionais – algum argumento no sentido de mostrar que meu pessimismo é infundado -, tudo bem. Como alguém que em linhas gerais é a favor do ativismo governamental, eu realmente gostaria de ser convencido de que um programa criterioso de subsídios ou de que realocar órgãos de governo pode realmente sustentar comunidades cujas indústrias tradicionais foram dilapidadas.

Contudo, o que nós temos em lugar disso é um ataque instantâneo às motivações. Aparentemente, até mesmo sugerir que a redução de alguns tipos de empregos tradicionais não pode ser revertida, e que sustentar economias locais pode ser difícil, é uma demonstração de desprezo elitista pelas pessoas comuns. Você imaginaria que gente como eu seria uma aliada potencial daqueles que querem ajudar as famílias trabalhadoras, onde quer que estejam. Porém, se nós não pudermos dizer nada sem encarar uma resposta de cabeça-quente dos defensores regionais, sem sermos acusados de insultar a cultura deles, isso praticamente elimina qualquer debate construtivo.

ficha_krugmann

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Donald Trump venceu no Colégio Eleitoral pelo menos em parte porque prometeu recuperar postos de trabalho na indústria carvoeira dos Apalaches e trazer empregos na indústria de volta ao Cinturão da Ferrugem. Nenhuma dessas promessas pode ser cumprida – na maior parte dos casos estamos falando de empregos perdidos não para um competidor externo desleal, mas para a mudança tecnológica.

Mas uma coisa engraçada acontece quando pessoas como eu tentam demonstrar isso: nós recebemos respostas furiosas de economistas que sentem uma afinidade com a classe trabalhadora das regiões atingidas – respostas que partem do princípio de que fazer essa conta deve ser um sinal de desprezo por culturas regionais ou algo assim.

Recentemente eu ponderei no meu blog sobre os dilemas de lidar com uma retaliação local desse tipo, e notei que até mesmo tentativas ostensivamente financiadas de apoiar as regiões em declínio não parecem funcionar muito bem. Eis o que eu disse: “(O) histórico de políticas de apoio locais em outros países, que gastam muito mais nestas coisas do que nós provavelmente faremos, é bastante pobre. Por exemplo, o apoio maciço à ex-Alemanha Oriental não evitou um grande declínio da população de lá, muito mais amplo que o declínio populacional nos Apalaches durante o mesmo período.”

Em resposta, eu recebi um comentário furioso do economista Lyman Stone me denunciando: “Krugman e aqueles que creem nele querem acreditar que os temores do apalaches (ou cinturão-ferrugistas, ou o que seja) são exagerados, e que a vida não tem sido tão ruim com eles quanto parece”, escreveu o Sr. Stone em seu blog.

Alto lá, eu disse isso? Acho que não. Se eu acreditasse que está tudo ok nos Apalaches, eu não teria comparado o lugar à Alemanha Oriental. O ponto foi precisamente que os Apalaches são um sinônimo de declínio regional, o que torna ainda mais marcante que a Alemanha Oriental, que recebeu o mesmo tipo de ajuda com que os Apalaches podem meramente sonhar, esteja sofrendo um declínio demográfico ainda mais acelerado.

Além disso, se é que faz alguma diferença, eu passei décadas escrevendo e falando sobre os problemas do crescimento das desigualdades e dos salários estagnados, de modo que me pintar como alguém que diz aos trabalhadores que os problemas deles existem somente em suas cabeças é bastante esquisito.

Agora, se nós quisermos ter um debate sobre políticas regionais – algum argumento no sentido de mostrar que meu pessimismo é infundado -, tudo bem. Como alguém que em linhas gerais é a favor do ativismo governamental, eu realmente gostaria de ser convencido de que um programa criterioso de subsídios ou de que realocar órgãos de governo pode realmente sustentar comunidades cujas indústrias tradicionais foram dilapidadas.

Contudo, o que nós temos em lugar disso é um ataque instantâneo às motivações. Aparentemente, até mesmo sugerir que a redução de alguns tipos de empregos tradicionais não pode ser revertida, e que sustentar economias locais pode ser difícil, é uma demonstração de desprezo elitista pelas pessoas comuns. Você imaginaria que gente como eu seria uma aliada potencial daqueles que querem ajudar as famílias trabalhadoras, onde quer que estejam. Porém, se nós não pudermos dizer nada sem encarar uma resposta de cabeça-quente dos defensores regionais, sem sermos acusados de insultar a cultura deles, isso praticamente elimina qualquer debate construtivo.

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