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É possível que Trump talvez não entenda suas próprias políticas

O presidente Trump tem dito muitas coisas estranhas em entrevistas recentes. As pessoas podem apenas imaginar, por exemplo, o que as lideranças militares da América acharam de suas divagações incoerentes e rocambolescas a respeito de como melhorar nossos porta-aviões. Aqui na Econolândia, porém, o burburinho se concentrou na intenção expressa do Sr. Trump, em uma […]

TRUMP: suas propostas econômica são terríveis e irresponsáveis, mas pode ser que elas sejam implementadas mesmo assim / Kevin Lamarque/Reuters (Kevin Lamarque/Reuters)
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Da Redação

Publicado em 23 de maio de 2017 às 15h22.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h13.

O presidente Trump tem dito muitas coisas estranhas em entrevistas recentes. As pessoas podem apenas imaginar, por exemplo, o que as lideranças militares da América acharam de suas divagações incoerentes e rocambolescas a respeito de como melhorar nossos porta-aviões.

Aqui na Econolândia, porém, o burburinho se concentrou na intenção expressa do Sr. Trump, em uma entrevista à revista The Economist, de perseguir cortes fiscais ainda que eles aumentem os déficits, porque nós temos de “encher a bomba d’água” – uma expressão que ele afirma ter inventado. “Eu a bolei há alguns dias e achei que era boa.”

Na verdade, a expressão existe há muitas gerações – Franklin D. Roosevelt a empregou em um discurso em 1937 – e foi usada muitas vezes desde então, várias delas, inclusive, pelo próprio presidente Trump. Além do mais, é uma metáfora ruim para os tempos modernos. Há 20 anos, em um alerta nos jornais sobre a possibilidade de problemas semelhantes aos do Japão eventualmente chegarem à América, eu apelei para que a frase fosse tirada de circulação: “Uma vez que praticamente ninguém nas sociedades fortemente urbanizadas da América moderna e do Japão tem qualquer ideia do que signifique encher a bomba, eu sugiro então nós renomearmos isso para estratégia de impulsionamento.”

Mas por que qualquer pessoa além dos pedantes deveria se importar?

Em primeiro lugar, a mente é uma coisa terrível de se perder. Momentos de senilidade, quando você não consegue se lembrar de um nome ou frase, ou se lembra errado de onde aquilo veio, acontecem a muitos de nós. Mas aquela entrevista à Economist foi basicamente um grande momento de senilidade – e não foi muito diferente de outras entrevistas recentes com o comandante-em-chefe do exército mais poderoso do mundo.

Segundo, nós estamos falando de um certo tipo de economia realmente ruim aqui. Há vezes em que despesas públicas temporárias podem ajudar a economia. Nos primeiros anos depois da crise financeira de 2008, por exemplo, o desemprego estava muito alto, e o Federal Reserve – normalmente nossa primeira linha de defesa contra recessões – tinha capacidade de ação limitada, porque as taxas de juros que ele controla já estavam muito próximas de zero. Foi uma época de enchimento de bomba séria: infelizmente, nós nunca conseguimos tirar proveito o suficiente disso, graças à oposição de terra arrasada dos republicanos.

Agora, contudo, o desemprego está perto das baixas históricas; os índices de abandono de emprego, que mostram quão confiantes os trabalhadores estão em suas capacidades de arrumar novos empregos, estão de volta aos níveis pré-crise; os índices de remuneração estão finalmente crescendo; e o Fed começou a aumentar as taxas de juros.

A América pode não estar totalmente de volta ao emprego pleno – há um acalorado debate entre economistas sobre esse tema. Mas a máquina econômica não precisa mais de um impulsionamento fiscal.

Esta é justamente a hora errada para se falar na conveniência de déficits orçamentários maiores.

É verdade, faria sentido emprestar para financiar o investimento público. Nós precisamos desesperadamente ampliar e arrumar nossas estradas, pontes, sistemas fluviais e mais. Enquanto isso, o governo federal consegue emprestar a um valor incrivelmente barato: Títulos de longo prazo protegidos da inflação estão pagando somente cerca de 0,5% de juros. Ou seja, o gasto público em infraestrutura seria justificado.

Mas não é disso que o Sr. Trump está falando. Ele está falando em explodir o déficit para que ele possa cortar impostos dos ricos. E isso não faz sentido econômico algum.

Mas, de novo, ele pode não entender suas próprias propostas; ele pode estar vivendo em um mundo de fantasia econômico e político. Se for isso, ele não está sozinho. O que me leva ao meu terceiro ponto: Os delírios fiscais do Sr. Trump provavelmente não são piores que aqueles de muitos, talvez a maioria dos observadores profissionais da cena política de Washington.

Se você for um consumidor pesado de notícias, pense em quantos artigos você viu nas últimas semanas com chamadas na linha de “Orçamento de Trump pode causar conflito com os conservadores fiscais republicanos”. A premissa de todos os artigos assim é que há uma facção poderosa entre os integrantes republicanos do Congresso que se preocupa profundamente com os déficits orçamentários e irá se posicionar contra propostas que gerem uma grande quantidade de números no vermelho.

Só que não existe tal facção, e nunca existiu.

Existiram e ainda há fingidos como o porta-voz da Câmara, Paul Ryan, que se dizem grandes falcões fiscais. Mas há uma maneira simples de testar a sinceridade de gente assim: Quando eles propõem sacrifícios em nome da responsabilidade fiscal, esses sacrifícios alguma vez envolvem as próprias prioridades políticas deles? E eles nunca envolvem. Ou seja, quando você vir um político afirmar que as questões orçamentárias exigem que nós cortemos o Medicaid, privatizemos o Medicare e/ou aumentemos a idade da aposentadoria – mas de algum modo nunca exigem aumentar impostos dos ricos, já que na verdade eles propõem cortá-los -, você sabe que é só jogo de cena.

No entanto, de alguma forma muito da imprensa continua a acreditar, ou fingir que acredita, que esses falcões fiscais imaginários são de verdade, o que é um delírio de proporções verdadeiramente trumpianas.

De modo que eu estou preocupado. O Sr. Trump pode não ser apenas ignorante mas profundamente fora de si, e suas propostas econômica são terríveis e irresponsáveis, mas pode ser que elas sejam implementadas mesmo assim.

Mas talvez eu esteja me preocupando demais: talvez a única coisa que tenhamos a temer seja o próprio medo. Gostou dessa frase?

Eu inventei ela outro dia.

(Este artigo foi publicado originalmente no The New York Times em 15 de maio de 2017.)

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O presidente Trump tem dito muitas coisas estranhas em entrevistas recentes. As pessoas podem apenas imaginar, por exemplo, o que as lideranças militares da América acharam de suas divagações incoerentes e rocambolescas a respeito de como melhorar nossos porta-aviões.

Aqui na Econolândia, porém, o burburinho se concentrou na intenção expressa do Sr. Trump, em uma entrevista à revista The Economist, de perseguir cortes fiscais ainda que eles aumentem os déficits, porque nós temos de “encher a bomba d’água” – uma expressão que ele afirma ter inventado. “Eu a bolei há alguns dias e achei que era boa.”

Na verdade, a expressão existe há muitas gerações – Franklin D. Roosevelt a empregou em um discurso em 1937 – e foi usada muitas vezes desde então, várias delas, inclusive, pelo próprio presidente Trump. Além do mais, é uma metáfora ruim para os tempos modernos. Há 20 anos, em um alerta nos jornais sobre a possibilidade de problemas semelhantes aos do Japão eventualmente chegarem à América, eu apelei para que a frase fosse tirada de circulação: “Uma vez que praticamente ninguém nas sociedades fortemente urbanizadas da América moderna e do Japão tem qualquer ideia do que signifique encher a bomba, eu sugiro então nós renomearmos isso para estratégia de impulsionamento.”

Mas por que qualquer pessoa além dos pedantes deveria se importar?

Em primeiro lugar, a mente é uma coisa terrível de se perder. Momentos de senilidade, quando você não consegue se lembrar de um nome ou frase, ou se lembra errado de onde aquilo veio, acontecem a muitos de nós. Mas aquela entrevista à Economist foi basicamente um grande momento de senilidade – e não foi muito diferente de outras entrevistas recentes com o comandante-em-chefe do exército mais poderoso do mundo.

Segundo, nós estamos falando de um certo tipo de economia realmente ruim aqui. Há vezes em que despesas públicas temporárias podem ajudar a economia. Nos primeiros anos depois da crise financeira de 2008, por exemplo, o desemprego estava muito alto, e o Federal Reserve – normalmente nossa primeira linha de defesa contra recessões – tinha capacidade de ação limitada, porque as taxas de juros que ele controla já estavam muito próximas de zero. Foi uma época de enchimento de bomba séria: infelizmente, nós nunca conseguimos tirar proveito o suficiente disso, graças à oposição de terra arrasada dos republicanos.

Agora, contudo, o desemprego está perto das baixas históricas; os índices de abandono de emprego, que mostram quão confiantes os trabalhadores estão em suas capacidades de arrumar novos empregos, estão de volta aos níveis pré-crise; os índices de remuneração estão finalmente crescendo; e o Fed começou a aumentar as taxas de juros.

A América pode não estar totalmente de volta ao emprego pleno – há um acalorado debate entre economistas sobre esse tema. Mas a máquina econômica não precisa mais de um impulsionamento fiscal.

Esta é justamente a hora errada para se falar na conveniência de déficits orçamentários maiores.

É verdade, faria sentido emprestar para financiar o investimento público. Nós precisamos desesperadamente ampliar e arrumar nossas estradas, pontes, sistemas fluviais e mais. Enquanto isso, o governo federal consegue emprestar a um valor incrivelmente barato: Títulos de longo prazo protegidos da inflação estão pagando somente cerca de 0,5% de juros. Ou seja, o gasto público em infraestrutura seria justificado.

Mas não é disso que o Sr. Trump está falando. Ele está falando em explodir o déficit para que ele possa cortar impostos dos ricos. E isso não faz sentido econômico algum.

Mas, de novo, ele pode não entender suas próprias propostas; ele pode estar vivendo em um mundo de fantasia econômico e político. Se for isso, ele não está sozinho. O que me leva ao meu terceiro ponto: Os delírios fiscais do Sr. Trump provavelmente não são piores que aqueles de muitos, talvez a maioria dos observadores profissionais da cena política de Washington.

Se você for um consumidor pesado de notícias, pense em quantos artigos você viu nas últimas semanas com chamadas na linha de “Orçamento de Trump pode causar conflito com os conservadores fiscais republicanos”. A premissa de todos os artigos assim é que há uma facção poderosa entre os integrantes republicanos do Congresso que se preocupa profundamente com os déficits orçamentários e irá se posicionar contra propostas que gerem uma grande quantidade de números no vermelho.

Só que não existe tal facção, e nunca existiu.

Existiram e ainda há fingidos como o porta-voz da Câmara, Paul Ryan, que se dizem grandes falcões fiscais. Mas há uma maneira simples de testar a sinceridade de gente assim: Quando eles propõem sacrifícios em nome da responsabilidade fiscal, esses sacrifícios alguma vez envolvem as próprias prioridades políticas deles? E eles nunca envolvem. Ou seja, quando você vir um político afirmar que as questões orçamentárias exigem que nós cortemos o Medicaid, privatizemos o Medicare e/ou aumentemos a idade da aposentadoria – mas de algum modo nunca exigem aumentar impostos dos ricos, já que na verdade eles propõem cortá-los -, você sabe que é só jogo de cena.

No entanto, de alguma forma muito da imprensa continua a acreditar, ou fingir que acredita, que esses falcões fiscais imaginários são de verdade, o que é um delírio de proporções verdadeiramente trumpianas.

De modo que eu estou preocupado. O Sr. Trump pode não ser apenas ignorante mas profundamente fora de si, e suas propostas econômica são terríveis e irresponsáveis, mas pode ser que elas sejam implementadas mesmo assim.

Mas talvez eu esteja me preocupando demais: talvez a única coisa que tenhamos a temer seja o próprio medo. Gostou dessa frase?

Eu inventei ela outro dia.

(Este artigo foi publicado originalmente no The New York Times em 15 de maio de 2017.)

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