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Os caminhos políticos da direita

Conjunção de forças políticas que colocou Jair Bolsonaro no poder em 2018 dificilmente se repetirá no futuro, especialmente com o ex-presidente inelegível

Jair Bolsonaro e Tarcísio Gomes de Freitas: governador, claramente, ficou maior que o movimento que o lançou na política (Alan Santos/PR/Flickr)

Publicado em 10 de julho de 2023 às 17h44.

Última atualização em 10 de julho de 2023 às 17h45.

Os jornais de domingo, em suas seções de opinião, traziam uma inusitada sintonia. Publicações como O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e O Globo costumam divergir em vários assuntos. Mas, ontem, os três veículos apostaram em um mesmo cenário político: daqui para frente, Jair Bolsonaro sofrerá um esvaziamento progressivo.

O Estadão chamou Bolsonaro de “nanico moral e político”. E disse que o ex-presidente “nunca foi capaz de articular politicamente setores e grupos da sociedade. […] Uma coisa é organizar motociatas ou ter muitos seguidores (e robôs) nas redes sociais. Outra, bem diferente, é exercer uma efetiva liderança política, congregando interesses por meio de ações políticas coordenadas”.

De fato, Bolsonaro mostrou-se incapaz de manter até correligionários e apoiadores de primeira hora ao seu lado. Foi brigando com vários políticos logo no início do mandato e saiu do partido que o elegeu, ficando sem sigla por um bom tempo. A própria negociação que o levou ao PL foi conturbada e, em um determinado momento, foi suspensa. No dia 14 de novembro de 2021, o PL soltou uma nota assinada por Valdemar Costa Neto que dizia: “Após intensa troca de mensagens na madrugada deste domingo, 14, com o Presidente Jair Bolsonaro, decidimos, de comum acordo, pelo adiamento da anunciada cerimônia de filiação”.

Já a Folha começou seu editorial de domingo assim: “Observou-se nos últimos dias uma reacomodação das forças na política brasileira. Abandonaram-se, ao menos por ora, o radicalismo estridente, a ideologia rasteira e o sectarismo infértil em favor de uma agenda promissora para o futuro. […] Talvez seria pouco alhures, mas não num Brasil após quatro anos de Jair Bolsonaro”.

Por fim, o Globo publicou as seguintes linhas, de autoria do jornalista Merval Pereira, sobre a atuação do ex-mandatário durante a votação da Reforma Tributária: “A orientação do ex-presidente Bolsonaro de fechar questão contra a proposta por partir de um governo petista assemelha-se à atitude do PT contra o Plano Real no governo Fernando Henrique”.

Pode-se argumentar que a imprensa não gosta de Bolsonaro – e isso, de maneira geral, é verdade.

Mas o que os três maiores jornais do país apontam em uníssono é inegável: que a conjunção de forças políticas que colocou Jair Bolsonaro no poder em 2018 dificilmente se repetirá no futuro, especialmente com o ex-presidente inelegível. Bolsonaro aglutinou em torno de si todo o sentimento antipetista que havia na época e pôde agir naturalmente, sem gerar grandes rejeições no centro e na direita.

O eleitorado, no entanto, mudou ao longo dos últimos anos, especialmente após a pandemia. E Bolsonaro se manteve igual. Essa foi uma das razões para que perdesse as eleições – por pouco, é verdade – para Luiz Inácio Lula da Silva. Até 2022, no entanto, não se enxergavam alternativas à direita no cenário polarizado. Hoje, existem pelo menos três alternativas de peso: os governadores Tarcísio de Freitas, Romeu Zema e Ratinho Jr.

Além disso, as forças políticas passaram a fugir dos radicalismos e a preferir o centro. O próprio Valdemar, ao rejeitar a pré-candidatura de Ricardo Salles à prefeitura de São Paulo em detrimento do apoio ao atual prefeito Ricardo Nunes, mostrou que prefere o caminho do meio, sem extremismos.

É neste contexto que Bolsonaro precisará reconstruir seu cacife se quiser de fato liderar a oposição nestes anos em que não terá um mandato e, portanto, maior dificuldade de se manter na ribalta política. Mas como é que alguém que fez uma carreira inteira em cima do conflito vai ter condições de agregar políticos moderados ao seu redor?

Talvez o ex-presidente esteja apto apenas a comandar apenas uma parcela da direita, justamente a mais exaltada e sintonizada com o conservadorismo de costumes. Aqueles mais pragmáticos ou liberais na economia podem encontrar outros nomes no tabuleiro político para apoiar. Se isso ocorrer, o bolsonarismo corre o risco de virar uma minoria barulhenta e sem muita representatividade.

O governador Tarcísio, que recentemente andou se estranhando com o grupo bolsonarista raiz, pode ser uma opção interessante para a direita, especialmente porque demonstrou nas urnas que é capaz de atrair moderados e centristas. Talvez esteja na hora de Tarcísio se desvencilhar das amarras do bolsonarismo e tentar um voo solo. Com as cutucadas que vem recebendo dos bolsonaristas, jamais será visto como um traidor, como foi o ex-governador João Doria em relação a Geraldo Alckmin.

O governador, claramente, ficou maior que o movimento que o lançou na política. Mesmo assim, esse afastamento não deverá ser rápido. Com Gilberto Kassab ao seu lado, Tarcísio vai promover um distanciamento lento e gradual, até que ninguém mais associe o seu nome ao do ex-presidente. Por acaso alguém se lembra que ele estreou no governo pelas mãos de Dilma Rousseff? E que coordenou o Programa de Parceria de Investimentos durante a gestão de Michel Temer?

Pois é.

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O Estadão chamou Bolsonaro de “nanico moral e político”. E disse que o ex-presidente “nunca foi capaz de articular politicamente setores e grupos da sociedade. […] Uma coisa é organizar motociatas ou ter muitos seguidores (e robôs) nas redes sociais. Outra, bem diferente, é exercer uma efetiva liderança política, congregando interesses por meio de ações políticas coordenadas”.

De fato, Bolsonaro mostrou-se incapaz de manter até correligionários e apoiadores de primeira hora ao seu lado. Foi brigando com vários políticos logo no início do mandato e saiu do partido que o elegeu, ficando sem sigla por um bom tempo. A própria negociação que o levou ao PL foi conturbada e, em um determinado momento, foi suspensa. No dia 14 de novembro de 2021, o PL soltou uma nota assinada por Valdemar Costa Neto que dizia: “Após intensa troca de mensagens na madrugada deste domingo, 14, com o Presidente Jair Bolsonaro, decidimos, de comum acordo, pelo adiamento da anunciada cerimônia de filiação”.

Já a Folha começou seu editorial de domingo assim: “Observou-se nos últimos dias uma reacomodação das forças na política brasileira. Abandonaram-se, ao menos por ora, o radicalismo estridente, a ideologia rasteira e o sectarismo infértil em favor de uma agenda promissora para o futuro. […] Talvez seria pouco alhures, mas não num Brasil após quatro anos de Jair Bolsonaro”.

Por fim, o Globo publicou as seguintes linhas, de autoria do jornalista Merval Pereira, sobre a atuação do ex-mandatário durante a votação da Reforma Tributária: “A orientação do ex-presidente Bolsonaro de fechar questão contra a proposta por partir de um governo petista assemelha-se à atitude do PT contra o Plano Real no governo Fernando Henrique”.

Pode-se argumentar que a imprensa não gosta de Bolsonaro – e isso, de maneira geral, é verdade.

Mas o que os três maiores jornais do país apontam em uníssono é inegável: que a conjunção de forças políticas que colocou Jair Bolsonaro no poder em 2018 dificilmente se repetirá no futuro, especialmente com o ex-presidente inelegível. Bolsonaro aglutinou em torno de si todo o sentimento antipetista que havia na época e pôde agir naturalmente, sem gerar grandes rejeições no centro e na direita.

O eleitorado, no entanto, mudou ao longo dos últimos anos, especialmente após a pandemia. E Bolsonaro se manteve igual. Essa foi uma das razões para que perdesse as eleições – por pouco, é verdade – para Luiz Inácio Lula da Silva. Até 2022, no entanto, não se enxergavam alternativas à direita no cenário polarizado. Hoje, existem pelo menos três alternativas de peso: os governadores Tarcísio de Freitas, Romeu Zema e Ratinho Jr.

Além disso, as forças políticas passaram a fugir dos radicalismos e a preferir o centro. O próprio Valdemar, ao rejeitar a pré-candidatura de Ricardo Salles à prefeitura de São Paulo em detrimento do apoio ao atual prefeito Ricardo Nunes, mostrou que prefere o caminho do meio, sem extremismos.

É neste contexto que Bolsonaro precisará reconstruir seu cacife se quiser de fato liderar a oposição nestes anos em que não terá um mandato e, portanto, maior dificuldade de se manter na ribalta política. Mas como é que alguém que fez uma carreira inteira em cima do conflito vai ter condições de agregar políticos moderados ao seu redor?

Talvez o ex-presidente esteja apto apenas a comandar apenas uma parcela da direita, justamente a mais exaltada e sintonizada com o conservadorismo de costumes. Aqueles mais pragmáticos ou liberais na economia podem encontrar outros nomes no tabuleiro político para apoiar. Se isso ocorrer, o bolsonarismo corre o risco de virar uma minoria barulhenta e sem muita representatividade.

O governador Tarcísio, que recentemente andou se estranhando com o grupo bolsonarista raiz, pode ser uma opção interessante para a direita, especialmente porque demonstrou nas urnas que é capaz de atrair moderados e centristas. Talvez esteja na hora de Tarcísio se desvencilhar das amarras do bolsonarismo e tentar um voo solo. Com as cutucadas que vem recebendo dos bolsonaristas, jamais será visto como um traidor, como foi o ex-governador João Doria em relação a Geraldo Alckmin.

O governador, claramente, ficou maior que o movimento que o lançou na política. Mesmo assim, esse afastamento não deverá ser rápido. Com Gilberto Kassab ao seu lado, Tarcísio vai promover um distanciamento lento e gradual, até que ninguém mais associe o seu nome ao do ex-presidente. Por acaso alguém se lembra que ele estreou no governo pelas mãos de Dilma Rousseff? E que coordenou o Programa de Parceria de Investimentos durante a gestão de Michel Temer?

Pois é.

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