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Mais uma ideia maluca para a galeria de casuísmos da Petrobras

Em sua coluna, Aluizio Falcão Filho comenta sobre como os preços da gasolina podem afetar a reeleição do presidente Jair Bolsonaro

(Luiz Souza/NurPhoto/Getty Images)
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Da Redação

Publicado em 21 de junho de 2022 às 16h49.

No início dos anos 1980, havia uma expressão corriqueira no mundo político chamada “casuísmo”. O dicionário Aurélio tem a seguinte definição para esta palavra: “argumento ou medida fundamentada em raciocínio enganador ou falsa, baseada muitas vezes em casos concretos e não em princípios fortemente estabelecidos”. Na prática, porém, o termo definia os movimentos do governo militar para mudar as regras do jogo e, com isso, obter benefícios eleitorais.

O que enxergamos nas articulações do governo em relação à Petrobras é exatamente isso: um casuísmo. A premissa é simples. Os preços da gasolina estão altos e isso está atrapalhando a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Logo, o governo quer criar medidas para reduzir o preço dos combustíveis, interferindo na política de preços da Petrobras, para frear a inflação e colher dividendos políticos.

Entre várias medidas que já foram cogitadas, surgiram mais duas. A primeira seria uma privatização de afogadilho. Corre no ministério da Economia um estudo para transformar todas as ações preferenciais da companhia em ordinárias, o que diluiria o capital estatal e colocaria, na prática, a empresa nas mãos do mercado, com o controle pulverizado. Para isso, porém, o Congresso precisa dar seu aval. Deputados e senadores vão dar sinal verde para a privatização da petroleira em pleno ano de eleições? A conferir.

Essa medida tem ainda uma consequência nefasta, a de transferir o monopólio do refino (inexistente na lei, mas presente no mundo real) do petróleo da esfera estatal para a privada — e, como se sabe, qualquer tipo de monopólio é ruinoso para o consumidor.

A outra ideia é a criação de um imposto para sobretaxar o que os políticos governistas estão chamando de “lucros extraordinários” da Petrobras. Neste caso específico, entraremos em duas discussões. A primeira, evidentemente, é encontrar uma definição consensual sobre o que é um lucro extraordinário. Depois de vencida essa etapa, o desafio será lidar com os acionistas minoritários.

O governo entende que será extremamente desgastante penalizar apenas a Petrobras em uma canetada fiscal. Por isso, a ideia que toma corpo na equipe de Paulo Guedes é aumentar a CSLL (contribuição social sobre o lucro líquido) para todo o setor de óleo e gás. Haverá, portanto, vítimas colaterais além dos acionistas da empresa.

Voltando aos acionistas minoritários. Temos aqui milhões de indivíduos e pessoas jurídicas que compraram os papeis da Petrobras, apostando exatamente no cenário atual: preços internacionais em alta, combinados com uma cotação elevada do dólar perante o real. E agora, esses investidores podem ser penalizados pela motivação correta que os levou às ações da empresa.

Haverá revolta, especialmente entre os acionistas estrangeiros. Lembremos que há quase 3,2 bilhões de ações em mãos de investidores internacionais, cerca de 25 % do capital total. Esses acionistas vão deixar barato a adoção desse casuísmo? Dificilmente. Pode haver uma ação jurídica pesada em cima do governo ou da própria companhia.

Esse tipo de atitude, se confirmada, vai apenas acentuar o clima de insegurança jurídica que tanto ronda o nosso mercado e faz afastar de nossas empresas os investidores estrangeiros. O ministro Paulo Guedes sabe quão devastadora seria esse tipo de medida para a Petrobras. Mas, agora, a prioridade número um de Guedes parece ser ajudar na conquista de mais um mandato para Bolsonaro, mesmo que isso custe renegar a agenda liberal que tanto foi pregada na campanha de 2018 (aliás, o termo “liberal”, que tanto usado no último pleito, raramente é usado hoje em dia).

O governo tem todo o direito de encontrar uma solução para diminuir os preços da gasolina, mesmo que seu interesse seja de fundo eleitoreiro. O que não se pode fazer, no entanto, é prejudicar o acionista privado, que legitimamente acreditou na performance da Petrobras.

Esse é mais um episódio que mostra as agruras da companhia, presa em um limbo na qual ela não é totalmente estatal nem completamente privada. Esse meio-termo causa constrangimentos ao governo, que não consegue controlar o valor cobrado pela gasolina na bomba (com todas as consequências tenebrosas deste represamento), e riscos ao acionista, que sempre está à mercê dos humores dos governantes.

Talvez a melhor solução para a Petrobras seja mesmo sair do meio-termo: ou ser privatizada ou virar completamente estatal. Dessa forma, as regras do jogo ficarão mais claras e os investidores terão acesso a regras claras e sólidas. Do jeito que está, nesta categoria de capital misto, tudo pode acontecer. E a perspectiva do improvável, daquilo que não pode ser previsto, é a pior coisa que pode acontecer para investidores e companhias de capital aberto.

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No início dos anos 1980, havia uma expressão corriqueira no mundo político chamada “casuísmo”. O dicionário Aurélio tem a seguinte definição para esta palavra: “argumento ou medida fundamentada em raciocínio enganador ou falsa, baseada muitas vezes em casos concretos e não em princípios fortemente estabelecidos”. Na prática, porém, o termo definia os movimentos do governo militar para mudar as regras do jogo e, com isso, obter benefícios eleitorais.

O que enxergamos nas articulações do governo em relação à Petrobras é exatamente isso: um casuísmo. A premissa é simples. Os preços da gasolina estão altos e isso está atrapalhando a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Logo, o governo quer criar medidas para reduzir o preço dos combustíveis, interferindo na política de preços da Petrobras, para frear a inflação e colher dividendos políticos.

Entre várias medidas que já foram cogitadas, surgiram mais duas. A primeira seria uma privatização de afogadilho. Corre no ministério da Economia um estudo para transformar todas as ações preferenciais da companhia em ordinárias, o que diluiria o capital estatal e colocaria, na prática, a empresa nas mãos do mercado, com o controle pulverizado. Para isso, porém, o Congresso precisa dar seu aval. Deputados e senadores vão dar sinal verde para a privatização da petroleira em pleno ano de eleições? A conferir.

Essa medida tem ainda uma consequência nefasta, a de transferir o monopólio do refino (inexistente na lei, mas presente no mundo real) do petróleo da esfera estatal para a privada — e, como se sabe, qualquer tipo de monopólio é ruinoso para o consumidor.

A outra ideia é a criação de um imposto para sobretaxar o que os políticos governistas estão chamando de “lucros extraordinários” da Petrobras. Neste caso específico, entraremos em duas discussões. A primeira, evidentemente, é encontrar uma definição consensual sobre o que é um lucro extraordinário. Depois de vencida essa etapa, o desafio será lidar com os acionistas minoritários.

O governo entende que será extremamente desgastante penalizar apenas a Petrobras em uma canetada fiscal. Por isso, a ideia que toma corpo na equipe de Paulo Guedes é aumentar a CSLL (contribuição social sobre o lucro líquido) para todo o setor de óleo e gás. Haverá, portanto, vítimas colaterais além dos acionistas da empresa.

Voltando aos acionistas minoritários. Temos aqui milhões de indivíduos e pessoas jurídicas que compraram os papeis da Petrobras, apostando exatamente no cenário atual: preços internacionais em alta, combinados com uma cotação elevada do dólar perante o real. E agora, esses investidores podem ser penalizados pela motivação correta que os levou às ações da empresa.

Haverá revolta, especialmente entre os acionistas estrangeiros. Lembremos que há quase 3,2 bilhões de ações em mãos de investidores internacionais, cerca de 25 % do capital total. Esses acionistas vão deixar barato a adoção desse casuísmo? Dificilmente. Pode haver uma ação jurídica pesada em cima do governo ou da própria companhia.

Esse tipo de atitude, se confirmada, vai apenas acentuar o clima de insegurança jurídica que tanto ronda o nosso mercado e faz afastar de nossas empresas os investidores estrangeiros. O ministro Paulo Guedes sabe quão devastadora seria esse tipo de medida para a Petrobras. Mas, agora, a prioridade número um de Guedes parece ser ajudar na conquista de mais um mandato para Bolsonaro, mesmo que isso custe renegar a agenda liberal que tanto foi pregada na campanha de 2018 (aliás, o termo “liberal”, que tanto usado no último pleito, raramente é usado hoje em dia).

O governo tem todo o direito de encontrar uma solução para diminuir os preços da gasolina, mesmo que seu interesse seja de fundo eleitoreiro. O que não se pode fazer, no entanto, é prejudicar o acionista privado, que legitimamente acreditou na performance da Petrobras.

Esse é mais um episódio que mostra as agruras da companhia, presa em um limbo na qual ela não é totalmente estatal nem completamente privada. Esse meio-termo causa constrangimentos ao governo, que não consegue controlar o valor cobrado pela gasolina na bomba (com todas as consequências tenebrosas deste represamento), e riscos ao acionista, que sempre está à mercê dos humores dos governantes.

Talvez a melhor solução para a Petrobras seja mesmo sair do meio-termo: ou ser privatizada ou virar completamente estatal. Dessa forma, as regras do jogo ficarão mais claras e os investidores terão acesso a regras claras e sólidas. Do jeito que está, nesta categoria de capital misto, tudo pode acontecer. E a perspectiva do improvável, daquilo que não pode ser previsto, é a pior coisa que pode acontecer para investidores e companhias de capital aberto.

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