Bolsonaro de mãos dadas com o velho Congresso
O governo Bolsonaro não fugirá à regra de todos os outros desde a redemocratização: para governar, precisou se aliar à velha política
Da Redação
Publicado em 1 de fevereiro de 2019 às 18h32.
Última atualização em 1 de fevereiro de 2019 às 19h33.
Salvo alguma reviravolta muito radical e imprevisível, Rodrigo Maia será eleito presidente da Câmara dos Deputados. Também favorito, uma vez tendo conquistado a nomeação do MDB, embora com menos segurança, Renan Calheiros deve ser eleito presidente do Senado .
Renan Calheiros, especificamente, jamais foi alguém alinhado às ideias e valores do novo governo. Mas com a implosão de Flávio Bolsonaro frente aos escândalos de seu velho gabinete de deputado estadual no RJ, Renan ofereceu-lhe a mão amiga e ainda tem jurado defender as pautas econômicas liberais que o momento pede. Ainda que a contragosto, Bolsonaro dificilmente encontraria uma candidatura mais afeita a ele que seja viável.
Se o resultado provável se concretizar, o governo Bolsonaro não fugirá à regra de todos os outros desde a redemocratização: para governar, precisou se aliar à velha política. A renovação relativamente grande da Câmara e do Senado, ao trazerem muitos amadores e deslumbrados, reforçaram o poder daqueles políticos experientes que conseguiram manter seus cargos.
Aliar-se à velha política – e não governar com um Congresso ideológico pró-governo – traz seus custos. Renan Calheiros agora diz ser defensor das reformas econômicas, e tenho certeza que algum tipo de reforma da previdência será sim aprovada pelo Congresso sob ele e Rodrigo Maia, embora com algumas concessões a interesses especiais, algumas exceções e benefícios para grupos específicos. Num segundo momento, terá o governo na mão, podendo barrar seus projetos se forem contra seus interesses.
Será a prova de fogo da estratégia de Bolsonaro de governar sem toma-lá-dá-cá. Ao se negar a oferecer cargos (e, presumo, emendas parlamentares) em troca de apoio a suas medidas, Bolsonaro confia no poder de intimidação da opinião pública em cima dos parlamentares, obrigando-os a votar com o governo. É algo que pode funcionar com o pacote de medidas do ministro Sergio Moro, que está completamente de acordo com o desejo da população mas deve encontrar muita resistência no Congresso, especialmente de Renan Calheiros.
Dito isso, é um fato que, ao menos neste início de governo, as ruas estão bem quietas, cansadas talvez de todo o movimento eleitoral do ano passado. MBL e Vem Pra Rua bem que tentaram mobilizar as massas para protestos contra Renan no fim-de-semana passado, mas as manifestações foram pífias, não chegando a mil pessoas na Av. Paulista. As disputas de poder no Congresso estão mais longe de opinião pública, e com as recentes manchas na imagem do novo governo, não está claro o que será preciso para reacender o furor dos protestos.
O risco de se aliar à velha política fisiológica brasileira é ter reformas importantes amenizadas. Mas esse é, ao mesmo tempo, a virtude dela para o Brasil, onde ideias radicais e interesses personalistas se entrecruzam. Deixado solto, o Poder Executivo é capaz das maiores loucuras e das maiores crueldades em nome da ideologia popular que ele representa, à direita ou à esquerda. É a velha política encastelada no Congresso que o domestica, impedindo os piores excessos, não pela força de argumentos racionais, mas pela simples prudência de não mexer demais nos interesses já estabelecidos. É uma força conservadora no sentido real da palavra, de manutenção do status quo. Significa que a mudança para melhor será mais lenta, mas também que a mudança para pior será menos danosa.
A cultura brasileira é personalista, coloca relacionamentos acima de ideias e identidades coletivas abstratas. A expressão política disso são os partidos associados à “velha política”, à fisiologia, à defesa de interesses acima de qualquer ideologia: MDB, PP, grandes alas de DEM, PT, PSDB, etc. Ficaremos sempre a sonhar com o fim dessa forma de fazer política, mas talvez seja ela que nos proteja de males muito maiores.
Salvo alguma reviravolta muito radical e imprevisível, Rodrigo Maia será eleito presidente da Câmara dos Deputados. Também favorito, uma vez tendo conquistado a nomeação do MDB, embora com menos segurança, Renan Calheiros deve ser eleito presidente do Senado .
Renan Calheiros, especificamente, jamais foi alguém alinhado às ideias e valores do novo governo. Mas com a implosão de Flávio Bolsonaro frente aos escândalos de seu velho gabinete de deputado estadual no RJ, Renan ofereceu-lhe a mão amiga e ainda tem jurado defender as pautas econômicas liberais que o momento pede. Ainda que a contragosto, Bolsonaro dificilmente encontraria uma candidatura mais afeita a ele que seja viável.
Se o resultado provável se concretizar, o governo Bolsonaro não fugirá à regra de todos os outros desde a redemocratização: para governar, precisou se aliar à velha política. A renovação relativamente grande da Câmara e do Senado, ao trazerem muitos amadores e deslumbrados, reforçaram o poder daqueles políticos experientes que conseguiram manter seus cargos.
Aliar-se à velha política – e não governar com um Congresso ideológico pró-governo – traz seus custos. Renan Calheiros agora diz ser defensor das reformas econômicas, e tenho certeza que algum tipo de reforma da previdência será sim aprovada pelo Congresso sob ele e Rodrigo Maia, embora com algumas concessões a interesses especiais, algumas exceções e benefícios para grupos específicos. Num segundo momento, terá o governo na mão, podendo barrar seus projetos se forem contra seus interesses.
Será a prova de fogo da estratégia de Bolsonaro de governar sem toma-lá-dá-cá. Ao se negar a oferecer cargos (e, presumo, emendas parlamentares) em troca de apoio a suas medidas, Bolsonaro confia no poder de intimidação da opinião pública em cima dos parlamentares, obrigando-os a votar com o governo. É algo que pode funcionar com o pacote de medidas do ministro Sergio Moro, que está completamente de acordo com o desejo da população mas deve encontrar muita resistência no Congresso, especialmente de Renan Calheiros.
Dito isso, é um fato que, ao menos neste início de governo, as ruas estão bem quietas, cansadas talvez de todo o movimento eleitoral do ano passado. MBL e Vem Pra Rua bem que tentaram mobilizar as massas para protestos contra Renan no fim-de-semana passado, mas as manifestações foram pífias, não chegando a mil pessoas na Av. Paulista. As disputas de poder no Congresso estão mais longe de opinião pública, e com as recentes manchas na imagem do novo governo, não está claro o que será preciso para reacender o furor dos protestos.
O risco de se aliar à velha política fisiológica brasileira é ter reformas importantes amenizadas. Mas esse é, ao mesmo tempo, a virtude dela para o Brasil, onde ideias radicais e interesses personalistas se entrecruzam. Deixado solto, o Poder Executivo é capaz das maiores loucuras e das maiores crueldades em nome da ideologia popular que ele representa, à direita ou à esquerda. É a velha política encastelada no Congresso que o domestica, impedindo os piores excessos, não pela força de argumentos racionais, mas pela simples prudência de não mexer demais nos interesses já estabelecidos. É uma força conservadora no sentido real da palavra, de manutenção do status quo. Significa que a mudança para melhor será mais lenta, mas também que a mudança para pior será menos danosa.
A cultura brasileira é personalista, coloca relacionamentos acima de ideias e identidades coletivas abstratas. A expressão política disso são os partidos associados à “velha política”, à fisiologia, à defesa de interesses acima de qualquer ideologia: MDB, PP, grandes alas de DEM, PT, PSDB, etc. Ficaremos sempre a sonhar com o fim dessa forma de fazer política, mas talvez seja ela que nos proteja de males muito maiores.