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Sebastião Ventura: O Supremo e o futuro da democracia

"Não existe insegurança mais alarmante do que a provocada pelo próprio Poder Judiciário"

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institutomillenium

Publicado em 5 de outubro de 2018 às 10h47.

Estamos a viver difíceis tempos republicanos. As insuficiências da política geram progressivas insatisfações com a democracia. As pulsões sociais se multiplicam; os extremos se exaltam; a moderação cede; as angústias se avolumam; as dúvidas confrontam a razão. Infelizmente, nossa decadente classe política não mais consegue gerir os desafios e complexidades da realidade contemporânea. O sistema – além de corrupto – envelheceu, ficou esclerosado, rodando em círculos no labirinto do poder. Se iremos estabelecer melhores hábitos e lógicas democráticas, é algo que se revelará nos transcorrer da vida vivida. Por enquanto, temos apenas uma evidência inconteste: é fundamental o estabelecimento de uma nova ética pública no Brasil, feita por gente decente e fielmente comprometida com os ideais superiores de uma cultura de integridade.

Nesse contexto, o Supremo Tribunal Federal exerce um papel relevante nas intrincadas relações institucionais da República. Em uma época de aguda atrofia dos poderes políticos genuínos (Executivo e Legislativo), o STF vem ganhando uma ostensiva proeminência decisória, atraindo para si questões de delicada solução jurisprudencial. É indubitável que o equilíbrio republicano impõe à Alta Corte o ponderado e milimétrico trabalho de sanar eventuais extravagâncias da política, protegendo a Constituição de opções administrativas ou legislativas despidas de elementos mínimos de razoabilidade jurídica. Ou seja, a função do Supremo é complementar e, não, substitutiva à política.

Objetivamente, no desempenho de sua função técnica soberana, cabe à Suprema Corte garantir a necessária segurança jurídica da nação, firmando a estabilidade de suas decisões, a unidade da interpretação constitucional e a consequente previsibilidade das condutas sociais. Em sentença parlamentar irrecorrível, Paulo Brossard pontificou que “a segurança é filha da lei; a quebra da legalidade é a mãe da insegurança”. E não existe insegurança mais alarmante do que a provocada pelo próprio Poder Judiciário. Logo, tal como está ocorrendo nos casos de prisão após julgamento em segunda instância, não é saudável que maiorias subjetivas das Turmas se sobreponham ao entendimento objetivo consagrado no Plenário. Esse tipo de instabilidade jurisprudencial atenta contra a necessária coerência interna da Constituição, criando uma inaceitável antinomia hermenêutica com grave fragilização do postulado da certeza do Direito.

Leia mais de Sebastião Ventura
“Se queremos mudanças, precisamos agir mais e melhor”
“Está chegada a hora de interrompermos a marcha do crime”
“Jamais o poder da palavra sincera foi tão importante para o renascer do Brasil”

É lógico que, em sociedades vivas, livres e plurais, a complexidade da existência pode gerar questões jurídicas difíceis de múltiplas respostas constitucionais potencialmente aceitáveis. Nessas horas de dialética profunda, cabe à Corte promover um debate de máxima densidade teórico-fático, fomentando um amplo entrechoque de ideias com vistas a perfectibilizar a melhor interpretação constitucional possível. Todavia, uma vez formada a convicção majoritária, cabe aos vencidos respeitar a posição vencedora, evitando que a institucionalidade da Corte seja abalada pela subjetividade de ímpetos pessoais passageiros.

Como bem revela a sabedoria invulgar de Gustavo Zagrebelsky, catedrático de Turim e ex-presidente do Tribunal Constitucional italiano, uma das principais funções da Lei Maior é fixar os pressupostos da convivência da comunidade política, tornando a democracia uma via pacífica de solução de divergências e conflitos sociais. Em um momento histórico de agudas divisões intestinas na sociedade brasileira, cabe ao Supremo Tribunal Federal elevar o espírito público superior e, tendo como norte os valores éticos de uma ordem jurídica justa, garantir a unidade jurisprudencial da Corte nos temas fundamentais ao aperfeiçoamento da vida republicana brasileira.

Um país corrupto exalta um constitucionalismo ético relativo. Por assim ser, os graves e numerosos esquemas brasileiros de corrupção revelam que nosso processo de consolidação constitucional está longe do fim. Neste trajeto de otimização e efetividade normativa, é função da Suprema Corte externar – sempre que chamado – que a Constituição não aceita a desonra democrática como um hábito da atividade política. A boa pedagogia constitucional impõe a séria e efetiva punição dos desmandos do poder, pois não existe nada mais humilhante à Constituição do que um corrupto rindo impunemente das instituições da Justiça.

Os tempos mudaram, exigindo novas posturas. Que o Supremo saiba se conectar com o hoje, contribuindo para o aperfeiçoamento político-moral da República. A democracia do futuro requer um Tribunal Constitucional que não tenha medo de fazer o que é certo, que contribua para a consolidação de um sistema de integridade pública e que faça de suas decisões exemplos soberanos de justiça, responsabilidade e comprometimento com o bem do Brasil.

Assista:
[youtube https://www.youtube.com/watch?v=dh9gPdtRFHg%5D

Veja mais no Instituto Millenium

Estamos a viver difíceis tempos republicanos. As insuficiências da política geram progressivas insatisfações com a democracia. As pulsões sociais se multiplicam; os extremos se exaltam; a moderação cede; as angústias se avolumam; as dúvidas confrontam a razão. Infelizmente, nossa decadente classe política não mais consegue gerir os desafios e complexidades da realidade contemporânea. O sistema – além de corrupto – envelheceu, ficou esclerosado, rodando em círculos no labirinto do poder. Se iremos estabelecer melhores hábitos e lógicas democráticas, é algo que se revelará nos transcorrer da vida vivida. Por enquanto, temos apenas uma evidência inconteste: é fundamental o estabelecimento de uma nova ética pública no Brasil, feita por gente decente e fielmente comprometida com os ideais superiores de uma cultura de integridade.

Nesse contexto, o Supremo Tribunal Federal exerce um papel relevante nas intrincadas relações institucionais da República. Em uma época de aguda atrofia dos poderes políticos genuínos (Executivo e Legislativo), o STF vem ganhando uma ostensiva proeminência decisória, atraindo para si questões de delicada solução jurisprudencial. É indubitável que o equilíbrio republicano impõe à Alta Corte o ponderado e milimétrico trabalho de sanar eventuais extravagâncias da política, protegendo a Constituição de opções administrativas ou legislativas despidas de elementos mínimos de razoabilidade jurídica. Ou seja, a função do Supremo é complementar e, não, substitutiva à política.

Objetivamente, no desempenho de sua função técnica soberana, cabe à Suprema Corte garantir a necessária segurança jurídica da nação, firmando a estabilidade de suas decisões, a unidade da interpretação constitucional e a consequente previsibilidade das condutas sociais. Em sentença parlamentar irrecorrível, Paulo Brossard pontificou que “a segurança é filha da lei; a quebra da legalidade é a mãe da insegurança”. E não existe insegurança mais alarmante do que a provocada pelo próprio Poder Judiciário. Logo, tal como está ocorrendo nos casos de prisão após julgamento em segunda instância, não é saudável que maiorias subjetivas das Turmas se sobreponham ao entendimento objetivo consagrado no Plenário. Esse tipo de instabilidade jurisprudencial atenta contra a necessária coerência interna da Constituição, criando uma inaceitável antinomia hermenêutica com grave fragilização do postulado da certeza do Direito.

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Como bem revela a sabedoria invulgar de Gustavo Zagrebelsky, catedrático de Turim e ex-presidente do Tribunal Constitucional italiano, uma das principais funções da Lei Maior é fixar os pressupostos da convivência da comunidade política, tornando a democracia uma via pacífica de solução de divergências e conflitos sociais. Em um momento histórico de agudas divisões intestinas na sociedade brasileira, cabe ao Supremo Tribunal Federal elevar o espírito público superior e, tendo como norte os valores éticos de uma ordem jurídica justa, garantir a unidade jurisprudencial da Corte nos temas fundamentais ao aperfeiçoamento da vida republicana brasileira.

Um país corrupto exalta um constitucionalismo ético relativo. Por assim ser, os graves e numerosos esquemas brasileiros de corrupção revelam que nosso processo de consolidação constitucional está longe do fim. Neste trajeto de otimização e efetividade normativa, é função da Suprema Corte externar – sempre que chamado – que a Constituição não aceita a desonra democrática como um hábito da atividade política. A boa pedagogia constitucional impõe a séria e efetiva punição dos desmandos do poder, pois não existe nada mais humilhante à Constituição do que um corrupto rindo impunemente das instituições da Justiça.

Os tempos mudaram, exigindo novas posturas. Que o Supremo saiba se conectar com o hoje, contribuindo para o aperfeiçoamento político-moral da República. A democracia do futuro requer um Tribunal Constitucional que não tenha medo de fazer o que é certo, que contribua para a consolidação de um sistema de integridade pública e que faça de suas decisões exemplos soberanos de justiça, responsabilidade e comprometimento com o bem do Brasil.

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