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Coordenador de María Corina lamenta fala de Lula e cobra que Brasil exerça seu papel regional

Pedro Urruchurtu acredita que o Brasil poderia colaborar significativamente com a transição para um regime democrático na Venezuela

(Acervo pessoal)
Instituto Millenium

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Publicado em 7 de março de 2024 às 13h45.

Em entrevista ao Instituto Millenium, Pedro Urruchurtu, cientista político e coordenador de relações internacionais da campanha de María Corina Machado, lamentou as recentes declarações do presidente Lula em relação à opositora venezuelana. Urruchurtu lembrou que o Brasil é apoiador dosAcordos de Barbados, que garantiria direitos políticos à oposição e a realização das eleições presidenciais em 2024. “Acreditamos que o Brasil pode contribuir significativamente se agir corretamente. Infelizmente, a situação da Venezuela afeta todo o hemisfério, e acreditar que a não intervenção não terá impacto interno nos países é não compreender a magnitude do modelo autoritário e criminoso que vivemos”, declarou.

Nesta quarta-feira, em entrevista coletiva, o presidente brasileiro pediu a jornalistas que houvesse “presunção de inocência” para as eleições venezuelanas, marcadas para julho, e disse que Maria Corina, que está impedida de se candidatar, ‘parasse de chorar’ e indicasse alguém. Ele comparou a inelegibilidade de Machado ao período em que ele mesmo se encontrou impedido, por estar preso pela operação Lava Jato.

Em janeiro deste ano, Maria Corina foi declarada inelegível peloTribunal Supremo de Justiça (TSJ)da Venezuela, acusada de conspiração contra o presidente Nicolás Maduro.O tribunal se refere ao período de 2019 até 2023, em que o opositor (hoje também declarado inelegível pelo regime) Juan AntonioGuaidó foi reconhecido pela oposição e por mais de 60 países como presidente interino da Venezuela, com o fim de isolar a ditadura de Maduro.

Leia abaixo a entrevista:

Instituto Millenium: As eleições na Venezuela foram marcadas para 28 de julho, diante de um debate contínuo sobre a legitimidade do processo eleitoral venezuelano. Como você avalia as preocupações expressas por observadores internacionais? O que você tem a dizer para políticos brasileiros que dizem que a Venezuela é uma democracia?

Pedro Urruchurtu: Para que a Venezuela tenha um processo eleitoral competitivo e livre, é necessário ir muito além de uma data.Especialmente quando essa data não garante as reformas e condições necessárias para que o processo seja realmente representativo, incluindo a observação internacional qualificada.Está claro que, além disso, não há eleição presidencial livre se María Corina Machado não participa, quando claramente é a liderança que os venezuelanos escolheram de forma esmagadora, por aclamação, na primária de 22 de outubro.

Os políticos brasileiros que dizem que na Venezuela há uma democracia, o dizem a partir de um país cujas instituições e democracia lhes permitem fazer política, enquanto na Venezuela somos perseguidos e, além de tentar inabilitar a principal opositora, faz-se campanha sob perseguição. O compromisso genuíno pela democracia e pelos direitos humanos não deveria ter ideologia e não deveria ser acomodado por conveniência.

Infelizmente, a Venezuela está longe de uma eleição livre quando o regime impõe uma farsa e quando não se cumprem os padrões essenciais, entre eles, que possa participar a favorita do povo, que ganhou a primária com 92% dos votos.

IM: Hoje, o presidente Lula pediu “presunção de inocência” para as eleições venezuelanas, e sugeriu que Maria Corina “parasse de chorar” e indicasse alguém para disputar as eleições em seu lugar, já que está impedida. Como você avalia essa postura?

PU: É lamentável vindo de alguém que entende perfeitamente do que se trata e que pretende desempenhar um papel regional útil para a causa democrática. O governo do Brasil apoiou os Acordos de Barbados, que são explícitos quanto às condições eleitorais, ao cessar das perseguições e ao fim das inabilitações arbitrárias. A declaração contradiz essa posição e se coloca ao lado do tirano venezuelano, apesar de María Corina ter dito acreditar que o Brasil pode desempenhar um papel importante, por causa de sua afinidade com o regime venezuelano, no acompanhamento da oportunidade representada por uma eleição livre. Mas, ainda pior, a declaração de Lula é misógina e valida a ilegalidade de regimes autocráticos, desrespeitando a vontade dos cidadãos que querem mudança política e que lutam contra esses regimes, arriscando suas vidas e enfrentando perseguição. Se esse é o tipo de liderança regional que pretende exercer, é tremendamente imoral. Dificilmente as mulheres do Brasil aceitariam um comentário machista como esse. É uma total vergonha.

IM: De que maneira os desafios enfrentados pela oposição venezuelana traçam possíveis paralelos com outras nações latino-americanas? Que lições o Brasil pode tirar dessa experiência para fortalecer suas próprias instituições democráticas?

PU: A Venezuela representa atualmente uma questão essencial para toda a região devido ao significado de seu regime e à crise migratória que estamos vivenciando, que se estendeu por toda parte e só será resolvida com uma mudança política. O Brasil tem sido respeitado por sua institucionalidade democrática e seu papel regional como um gigante em muitos aspectos, portanto, seria esperado que a defesa da democracia fosse feita sem desculpas nem eufemismos. O importante é que a luta que estamos empreendendo por esses valores não está ligada a uma única pessoa. Ela está ligada a uma oportunidade de mudança democrática na Venezuela, por meio do voto, que terá repercussões em toda a região. Por isso, o apoio deve transcender o ideológico. O Estado de Direito, os freios e contrapesos ao poder, a liberdade de expressão, a liberdade individual, a liberdade econômica, a justiça, os direitos humanos são todos elementos que devem ser defendidos e promovidos, pois, no fim das contas, relacionam-se com o respeito à democracia e às instituições. Não se pode exigir democracia dos outros se não se defende a própria, mas também não se pode defender a própria sem denunciar quando ela é violada além das fronteiras.

IM: A política externa do Brasil e de alguns setores da esquerda sul-americana revela uma contradição: enquanto defendem os direitos humanos internamente, muitas vezes adotam uma abordagem de não intervenção com respeito a regimes autoritários no exterior, como no caso da Nicarágua e da Venezuela. Na sua opinião, como essa dicotomia afeta a promoção da democracia e dos direitos humanos na região?

PU: Quando os direitos humanos e a democracia se tornam ideologizados, deixam de ser universais para se transformarem em armas de conveniência, o que é muito perigoso. Se, no que diz respeito a esses valores, algo é ruim, é sempre ruim, independentemente das circunstâncias. Acreditamos que o Brasil pode contribuir significativamente se agir corretamente. Infelizmente, a situação da Venezuela afeta todo o hemisfério, e acreditar que a não intervenção não terá impacto interno nos países é não compreender a magnitude do modelo autoritário e criminoso em que vivemos. Manter silêncio ou apoiar regimes opressivos como os de Cuba, Nicarágua ou Venezuela, ou mesmo autocracias como a Rússia, envia uma mensagem negativa e é um sinal terrível para aqueles que buscam democracia e liberdade. As autocracias se alimentam mutuamente e não precisam da defesa das democracias. Quando uma democracia, como a do Brasil, defende esses regimes, começa a se afastar de sua essência democrática e se assemelha mais a eles, sendo esse o primeiro passo para se tornar mais uma autocracia. Sem dúvida, é um sinal muito negativo.

IM: Como você visualiza o processo de reconciliação e transição para um sistema democrático na Venezuela? Existem exemplos de outros contextos históricos que você considera como modelos?

PU: O caso da Venezuela é paradoxal porque, embora tenha muitos elementos já vividos na história, ao mesmo tempo é único pela combinação de fatores que o compõem. É muito complexo. Será difícil haver transição e reconciliação sem justiça. Para que haja justiça, deve existir memória, mas também é preciso entender que uma transição requer negociação e concessão de garantias e incentivos para quem deve deixar o poder. Como temos dito, a única que hoje pode garantir uma negociação bem-sucedida para uma transição duradoura é María Corina e, por isso, o que mais convém ao regime é compreender isso. É aí que se supõe que o Brasil possa desempenhar um papel-chave, se realmente se comprometer com a democracia no país. A derrota espiritual do sistema já começou a ser dada desde a primária e seu resultado. Agora, é a vez da derrota política que assegure ao regime sua oportunidade de saída, para assim concretizar uma eleição que sele essa possibilidade. Há muito por fazer, mas hoje contamos com uma liderança confiável e legitimada como nunca, e isso é uma grande oportunidade que requer alinhamento interno e externo para ser bem-sucedida.

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Em entrevista ao Instituto Millenium, Pedro Urruchurtu, cientista político e coordenador de relações internacionais da campanha de María Corina Machado, lamentou as recentes declarações do presidente Lula em relação à opositora venezuelana. Urruchurtu lembrou que o Brasil é apoiador dosAcordos de Barbados, que garantiria direitos políticos à oposição e a realização das eleições presidenciais em 2024. “Acreditamos que o Brasil pode contribuir significativamente se agir corretamente. Infelizmente, a situação da Venezuela afeta todo o hemisfério, e acreditar que a não intervenção não terá impacto interno nos países é não compreender a magnitude do modelo autoritário e criminoso que vivemos”, declarou.

Nesta quarta-feira, em entrevista coletiva, o presidente brasileiro pediu a jornalistas que houvesse “presunção de inocência” para as eleições venezuelanas, marcadas para julho, e disse que Maria Corina, que está impedida de se candidatar, ‘parasse de chorar’ e indicasse alguém. Ele comparou a inelegibilidade de Machado ao período em que ele mesmo se encontrou impedido, por estar preso pela operação Lava Jato.

Em janeiro deste ano, Maria Corina foi declarada inelegível peloTribunal Supremo de Justiça (TSJ)da Venezuela, acusada de conspiração contra o presidente Nicolás Maduro.O tribunal se refere ao período de 2019 até 2023, em que o opositor (hoje também declarado inelegível pelo regime) Juan AntonioGuaidó foi reconhecido pela oposição e por mais de 60 países como presidente interino da Venezuela, com o fim de isolar a ditadura de Maduro.

Leia abaixo a entrevista:

Instituto Millenium: As eleições na Venezuela foram marcadas para 28 de julho, diante de um debate contínuo sobre a legitimidade do processo eleitoral venezuelano. Como você avalia as preocupações expressas por observadores internacionais? O que você tem a dizer para políticos brasileiros que dizem que a Venezuela é uma democracia?

Pedro Urruchurtu: Para que a Venezuela tenha um processo eleitoral competitivo e livre, é necessário ir muito além de uma data.Especialmente quando essa data não garante as reformas e condições necessárias para que o processo seja realmente representativo, incluindo a observação internacional qualificada.Está claro que, além disso, não há eleição presidencial livre se María Corina Machado não participa, quando claramente é a liderança que os venezuelanos escolheram de forma esmagadora, por aclamação, na primária de 22 de outubro.

Os políticos brasileiros que dizem que na Venezuela há uma democracia, o dizem a partir de um país cujas instituições e democracia lhes permitem fazer política, enquanto na Venezuela somos perseguidos e, além de tentar inabilitar a principal opositora, faz-se campanha sob perseguição. O compromisso genuíno pela democracia e pelos direitos humanos não deveria ter ideologia e não deveria ser acomodado por conveniência.

Infelizmente, a Venezuela está longe de uma eleição livre quando o regime impõe uma farsa e quando não se cumprem os padrões essenciais, entre eles, que possa participar a favorita do povo, que ganhou a primária com 92% dos votos.

IM: Hoje, o presidente Lula pediu “presunção de inocência” para as eleições venezuelanas, e sugeriu que Maria Corina “parasse de chorar” e indicasse alguém para disputar as eleições em seu lugar, já que está impedida. Como você avalia essa postura?

PU: É lamentável vindo de alguém que entende perfeitamente do que se trata e que pretende desempenhar um papel regional útil para a causa democrática. O governo do Brasil apoiou os Acordos de Barbados, que são explícitos quanto às condições eleitorais, ao cessar das perseguições e ao fim das inabilitações arbitrárias. A declaração contradiz essa posição e se coloca ao lado do tirano venezuelano, apesar de María Corina ter dito acreditar que o Brasil pode desempenhar um papel importante, por causa de sua afinidade com o regime venezuelano, no acompanhamento da oportunidade representada por uma eleição livre. Mas, ainda pior, a declaração de Lula é misógina e valida a ilegalidade de regimes autocráticos, desrespeitando a vontade dos cidadãos que querem mudança política e que lutam contra esses regimes, arriscando suas vidas e enfrentando perseguição. Se esse é o tipo de liderança regional que pretende exercer, é tremendamente imoral. Dificilmente as mulheres do Brasil aceitariam um comentário machista como esse. É uma total vergonha.

IM: De que maneira os desafios enfrentados pela oposição venezuelana traçam possíveis paralelos com outras nações latino-americanas? Que lições o Brasil pode tirar dessa experiência para fortalecer suas próprias instituições democráticas?

PU: A Venezuela representa atualmente uma questão essencial para toda a região devido ao significado de seu regime e à crise migratória que estamos vivenciando, que se estendeu por toda parte e só será resolvida com uma mudança política. O Brasil tem sido respeitado por sua institucionalidade democrática e seu papel regional como um gigante em muitos aspectos, portanto, seria esperado que a defesa da democracia fosse feita sem desculpas nem eufemismos. O importante é que a luta que estamos empreendendo por esses valores não está ligada a uma única pessoa. Ela está ligada a uma oportunidade de mudança democrática na Venezuela, por meio do voto, que terá repercussões em toda a região. Por isso, o apoio deve transcender o ideológico. O Estado de Direito, os freios e contrapesos ao poder, a liberdade de expressão, a liberdade individual, a liberdade econômica, a justiça, os direitos humanos são todos elementos que devem ser defendidos e promovidos, pois, no fim das contas, relacionam-se com o respeito à democracia e às instituições. Não se pode exigir democracia dos outros se não se defende a própria, mas também não se pode defender a própria sem denunciar quando ela é violada além das fronteiras.

IM: A política externa do Brasil e de alguns setores da esquerda sul-americana revela uma contradição: enquanto defendem os direitos humanos internamente, muitas vezes adotam uma abordagem de não intervenção com respeito a regimes autoritários no exterior, como no caso da Nicarágua e da Venezuela. Na sua opinião, como essa dicotomia afeta a promoção da democracia e dos direitos humanos na região?

PU: Quando os direitos humanos e a democracia se tornam ideologizados, deixam de ser universais para se transformarem em armas de conveniência, o que é muito perigoso. Se, no que diz respeito a esses valores, algo é ruim, é sempre ruim, independentemente das circunstâncias. Acreditamos que o Brasil pode contribuir significativamente se agir corretamente. Infelizmente, a situação da Venezuela afeta todo o hemisfério, e acreditar que a não intervenção não terá impacto interno nos países é não compreender a magnitude do modelo autoritário e criminoso em que vivemos. Manter silêncio ou apoiar regimes opressivos como os de Cuba, Nicarágua ou Venezuela, ou mesmo autocracias como a Rússia, envia uma mensagem negativa e é um sinal terrível para aqueles que buscam democracia e liberdade. As autocracias se alimentam mutuamente e não precisam da defesa das democracias. Quando uma democracia, como a do Brasil, defende esses regimes, começa a se afastar de sua essência democrática e se assemelha mais a eles, sendo esse o primeiro passo para se tornar mais uma autocracia. Sem dúvida, é um sinal muito negativo.

IM: Como você visualiza o processo de reconciliação e transição para um sistema democrático na Venezuela? Existem exemplos de outros contextos históricos que você considera como modelos?

PU: O caso da Venezuela é paradoxal porque, embora tenha muitos elementos já vividos na história, ao mesmo tempo é único pela combinação de fatores que o compõem. É muito complexo. Será difícil haver transição e reconciliação sem justiça. Para que haja justiça, deve existir memória, mas também é preciso entender que uma transição requer negociação e concessão de garantias e incentivos para quem deve deixar o poder. Como temos dito, a única que hoje pode garantir uma negociação bem-sucedida para uma transição duradoura é María Corina e, por isso, o que mais convém ao regime é compreender isso. É aí que se supõe que o Brasil possa desempenhar um papel-chave, se realmente se comprometer com a democracia no país. A derrota espiritual do sistema já começou a ser dada desde a primária e seu resultado. Agora, é a vez da derrota política que assegure ao regime sua oportunidade de saída, para assim concretizar uma eleição que sele essa possibilidade. Há muito por fazer, mas hoje contamos com uma liderança confiável e legitimada como nunca, e isso é uma grande oportunidade que requer alinhamento interno e externo para ser bem-sucedida.

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