Cobrança de mensalidades dos alunos mais ricos pode melhorar educação pública no país
Estudo produzido pelos pesquisadores Marcos Ricardo dos Santos, Anamaria Camargo e Leonardo Regazzini foi publicado nesta quarta-feira (6)
Da Redação
Publicado em 7 de julho de 2022 às 15h29.
A implantação de vouchers escolares para famílias de baixa renda e cobrança de mensalidades dos alunos mais ricos das universidades públicas pode fazer com que o governo federal atenda até 33% mais alunos da educação básica com o mesmo investimento atual. Hoje, mais de 6% do PIB é destinado para educação. Esse percentual é maior que em muitos países desenvolvidos, mas até o momento não é possível ver avanços significativos em qualidade.
É o que revela o estudo produzido pelos pesquisadores Marcos Ricardo dos Santos, Anamaria Camargo e Leonardo Regazzini, para o Instituto Millenium, que foi publicado nesta quarta-feira (06). Os autores analisaram pesquisas e dados oficiais do Brasil e de outros países para defender um sistema proposto há mais de 60 anos e já adotado lá fora. No documento, que faz parte da série Millenium Papers, os autores indicam que é o momento de se tentar um caminho diferente e utilizar mais fortemente o setor privado para melhorar a qualidade de ensino no país.
Há décadas, o Brasil segue uma mesma estratégia: investir na educação pública. O país conseguiu, com a ampliação da oferta estatal, passar de atender 21% da população em idade escolar, em 1940, para 94,5% no ano 2000, índice próximo à universalização. Entretanto, os indicadores de qualidade do ensino permanecem quase inalterados, considerando os resultados dos estudantes brasileiros em exames internacionais padronizados.
Uma das soluções para se obter resultados diferentes é reforçar o papel da iniciativa privada na educação, com o uso de vouchers educacionais. Em vez de o governo ofertar diretamente vagas em escolas públicas, passaria oferecer vales, entregues a famílias mais pobres, que seriam usados como pagamento em instituições privadas de ensino. Assim, famílias mais pobres, que, por falta de condições financeiras, são obrigadas a aceitar um modelo único de escola que o estado lhes oferece, passariam a ter um leque maior de escolha. Com o apoio financeiro, poderiam optar entre diversas escolas privadas que, em regra, costumam obter resultados melhores. Em suma, a mesma liberdade de escolha que os mais ricos hoje têm sobre a educação de seus filhos estaria disponível também para famílias mais pobres.
Um outro caminho para a implantação de um programa como esse no Brasil, sem aumentar o já comprometido orçamento público, seria a utilização de recursos obtidos por meio da cobrança parcial de mensalidade nas instituições públicas de ensino superior, a fim de compor um fundo de financiamento para a educação básica. Hoje as vagas em cursos universitários públicos são custeadas por impostos pagos por toda a sociedade, mas ocupadas majoritariamente por estudantes de maior renda. Com isso, há uma transferência indireta de recursos dos mais pobres, que pagam a conta, para os mais ricos, que aproveitam o curso superior “gratuito”. Essa lógica pode ser invertida com a cobrança de mensalidade nas universidades, com descontos parciais para alunos das classes intermediárias e integrais para alunos de menor renda.
O pesquisadores demonstram que o custo anual por aluno na educação básica no Brasil era de R$ 7.230, em valores de 2018 (dados do INEP) ou R$ 602,50 por mês, que pode servir de referência para a criação de um sistema de voucher de até R$ 600,00 mensais, de valor escalonado de acordo com a renda familiar. O escalonamento teria como referência as 5 faixas de renda da PNAD/IBGE, na qual o primeiro quintil é a mais pobre.
Como exemplo, o estudo propõe separar como público-alvo hipotético um contingente de um milhão de alunos matriculados na rede pública. O montante despendido pelo poder público para custear a educação deste grupo representaria um total de R$ 600 milhões mensais, em valores de 2018.
Se fossem oferecidos vouchers integrais no valor de R$ 600 para 39,5% desse grupo de alunos, que representam o percentual de alunos do 1º quintil de renda no ensino fundamental, a despesa para esta faixa de renda somaria R$ 237 milhões. Para os 27,9% dos alunos que pertencem ao 2º quartil de renda, o voucher unitário seria de R$ 450, o que representaria um total de R$ 125,55 milhões para a faixa. Para o 3º quintil, 16,9% dos alunos receberiam um voucher de 50%, ou seja, R$ 300, perfazendo um total de 50,7 milhões para essa faixa. Os alunos do 4º quintil receberiam uma ajuda menor: R$ 150 mensais, apenas como complemento, chegando a um total de R$ 16,95 milhões mensais. Já os alunos do 5º quintil de renda (4,3% do total) não seriam elegíveis para o programa.
Com esse modelo, seria possível atender 956 mil alunos a um custo mensal de R$ 430,2 milhões, ou seja, o valor por aluno seria de R$ 450. Se fosse utilizado integralmente o total de R$ 600 milhões separados inicialmente – que correspondem a um milhão de alunos na rede pública –, seria possível atender a 1,333 milhão de alunos, ou seja, 33,3% a mais do que o grupo original na rede pública.
A mudança proposta neste estudo aponta que diversos países que se tornaram referência mundial em educação, tais como Finlândia, Estônia ou Holanda, não financiam o sistema educacional em si, mas sim os estudantes. A Holanda, por exemplo, usa um sistema de vouchers para 70% dos estudantes no ensino fundamental e para quase a totalidade dos estudantes do ensino médio.
Por fim, os autores observam que há um longo percurso a ser percorrido apesar do desenho técnico da política não ser difícil. O maior desafio é o convencimento político: seria preciso desviar das pressões corporativas dos sindicatos e se desapegar das velhas fórmulas, que vêm se mostrando pouco eficientes há tempo, mas continuam dominando as mentes de quem pensa a educação no país.
A implantação de vouchers escolares para famílias de baixa renda e cobrança de mensalidades dos alunos mais ricos das universidades públicas pode fazer com que o governo federal atenda até 33% mais alunos da educação básica com o mesmo investimento atual. Hoje, mais de 6% do PIB é destinado para educação. Esse percentual é maior que em muitos países desenvolvidos, mas até o momento não é possível ver avanços significativos em qualidade.
É o que revela o estudo produzido pelos pesquisadores Marcos Ricardo dos Santos, Anamaria Camargo e Leonardo Regazzini, para o Instituto Millenium, que foi publicado nesta quarta-feira (06). Os autores analisaram pesquisas e dados oficiais do Brasil e de outros países para defender um sistema proposto há mais de 60 anos e já adotado lá fora. No documento, que faz parte da série Millenium Papers, os autores indicam que é o momento de se tentar um caminho diferente e utilizar mais fortemente o setor privado para melhorar a qualidade de ensino no país.
Há décadas, o Brasil segue uma mesma estratégia: investir na educação pública. O país conseguiu, com a ampliação da oferta estatal, passar de atender 21% da população em idade escolar, em 1940, para 94,5% no ano 2000, índice próximo à universalização. Entretanto, os indicadores de qualidade do ensino permanecem quase inalterados, considerando os resultados dos estudantes brasileiros em exames internacionais padronizados.
Uma das soluções para se obter resultados diferentes é reforçar o papel da iniciativa privada na educação, com o uso de vouchers educacionais. Em vez de o governo ofertar diretamente vagas em escolas públicas, passaria oferecer vales, entregues a famílias mais pobres, que seriam usados como pagamento em instituições privadas de ensino. Assim, famílias mais pobres, que, por falta de condições financeiras, são obrigadas a aceitar um modelo único de escola que o estado lhes oferece, passariam a ter um leque maior de escolha. Com o apoio financeiro, poderiam optar entre diversas escolas privadas que, em regra, costumam obter resultados melhores. Em suma, a mesma liberdade de escolha que os mais ricos hoje têm sobre a educação de seus filhos estaria disponível também para famílias mais pobres.
Um outro caminho para a implantação de um programa como esse no Brasil, sem aumentar o já comprometido orçamento público, seria a utilização de recursos obtidos por meio da cobrança parcial de mensalidade nas instituições públicas de ensino superior, a fim de compor um fundo de financiamento para a educação básica. Hoje as vagas em cursos universitários públicos são custeadas por impostos pagos por toda a sociedade, mas ocupadas majoritariamente por estudantes de maior renda. Com isso, há uma transferência indireta de recursos dos mais pobres, que pagam a conta, para os mais ricos, que aproveitam o curso superior “gratuito”. Essa lógica pode ser invertida com a cobrança de mensalidade nas universidades, com descontos parciais para alunos das classes intermediárias e integrais para alunos de menor renda.
O pesquisadores demonstram que o custo anual por aluno na educação básica no Brasil era de R$ 7.230, em valores de 2018 (dados do INEP) ou R$ 602,50 por mês, que pode servir de referência para a criação de um sistema de voucher de até R$ 600,00 mensais, de valor escalonado de acordo com a renda familiar. O escalonamento teria como referência as 5 faixas de renda da PNAD/IBGE, na qual o primeiro quintil é a mais pobre.
Como exemplo, o estudo propõe separar como público-alvo hipotético um contingente de um milhão de alunos matriculados na rede pública. O montante despendido pelo poder público para custear a educação deste grupo representaria um total de R$ 600 milhões mensais, em valores de 2018.
Se fossem oferecidos vouchers integrais no valor de R$ 600 para 39,5% desse grupo de alunos, que representam o percentual de alunos do 1º quintil de renda no ensino fundamental, a despesa para esta faixa de renda somaria R$ 237 milhões. Para os 27,9% dos alunos que pertencem ao 2º quartil de renda, o voucher unitário seria de R$ 450, o que representaria um total de R$ 125,55 milhões para a faixa. Para o 3º quintil, 16,9% dos alunos receberiam um voucher de 50%, ou seja, R$ 300, perfazendo um total de 50,7 milhões para essa faixa. Os alunos do 4º quintil receberiam uma ajuda menor: R$ 150 mensais, apenas como complemento, chegando a um total de R$ 16,95 milhões mensais. Já os alunos do 5º quintil de renda (4,3% do total) não seriam elegíveis para o programa.
Com esse modelo, seria possível atender 956 mil alunos a um custo mensal de R$ 430,2 milhões, ou seja, o valor por aluno seria de R$ 450. Se fosse utilizado integralmente o total de R$ 600 milhões separados inicialmente – que correspondem a um milhão de alunos na rede pública –, seria possível atender a 1,333 milhão de alunos, ou seja, 33,3% a mais do que o grupo original na rede pública.
A mudança proposta neste estudo aponta que diversos países que se tornaram referência mundial em educação, tais como Finlândia, Estônia ou Holanda, não financiam o sistema educacional em si, mas sim os estudantes. A Holanda, por exemplo, usa um sistema de vouchers para 70% dos estudantes no ensino fundamental e para quase a totalidade dos estudantes do ensino médio.
Por fim, os autores observam que há um longo percurso a ser percorrido apesar do desenho técnico da política não ser difícil. O maior desafio é o convencimento político: seria preciso desviar das pressões corporativas dos sindicatos e se desapegar das velhas fórmulas, que vêm se mostrando pouco eficientes há tempo, mas continuam dominando as mentes de quem pensa a educação no país.