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A diplomacia brasileira navega na retórica

Editorial do “O Globo” de 5 de maio fala sobre o afastamento do atual Itamaraty da realpolitik, e a opção pela retórica, citando um exemplo da forma da nossa política externa de lidar com a questão nuclear. O que se percebe hoje é uma discussão inócua sobre o direito a possuir ou não armas atômicas (ainda que seja indiscutível o risco multiplicado por mil quando se trata de líderes que […] Leia mais

DR

Da Redação

Publicado em 5 de maio de 2010 às 22h23.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às 11h55.

Editorial do “O Globo” de 5 de maio fala sobre o afastamento do atual Itamaraty da realpolitik, e a opção pela retórica, citando um exemplo da forma da nossa política externa de lidar com a questão nuclear. O que se percebe hoje é uma discussão inócua sobre o direito a possuir ou não armas atômicas (ainda que seja indiscutível o risco multiplicado por mil quando se trata de líderes que negam o Holocausto e declaram sua vontade de varrer um país do mapa), quando o que deveria estar em foco é a redução do arsenal nuclear no mundo.

“Mais de cem anos atrás, o chanceler Bismarck, da Alemanha — chamado “o chanceler de ferro” —, cunhou a expressão realpolitik, que desde então é moeda corrente nas relações internacionais. Na mesma linha vai a frase do general De Gaulle: “Países não têm amigos, têm interesses.” O nosso velho Itamaraty sabia disso. Rio Branco foi um mestre da realpolitik, e assim delineou as fronteiras do Brasil só com base na negociação — e não na retórica.

O Brasil de hoje vai por outros caminhos.

Um caso recente foi o de Honduras. O governo brasileiro condenou corretamente o golpe que depôs o presidente Zelaya.

Mas, em seguida, optou pela retórica, e não pelo realismo político.

Zelaya foi deposto porque a Constituição hondurenha não tinha uma cláusula de impeachment, e o presidente em fim de mandato afrontara de todas as maneiras as instituições locais, de modo a perpetuar-se no poder. Tinha, para isso, o apoio explícito do coronel Chávez.

O Brasil ficou na retórica. Recusou-se a conversar com as figuras de expressão da vida hondurenha, e acabou não tomando parte na evolução dos fatos (à parte a estranha aparição de Zelaya, que já estava fora do país, na embaixada brasileira).

O desfecho do caso foi melhor do que se esperava: houve eleições, que já estavam mesmo programadas, e que se mostraram a melhor solução para o que se transformara num impasse. Mas o Brasil insistiu na retórica. Insiste em não reconhecer o governo de Honduras, em companhia de argentinos, equatorianos e outros aliados do coronel Chávez.

Na questão nuclear, o cenário é parecido.

O chanceler Amorim saiu-se há algum tempo com a notável declaração de que os EUA não tinham moral para criticar o Irã por suas aspirações nucleares.

Nada mais distante da realpolitik.

As armas nucleares são uma terrível descoberta da Humanidade.

O que aconteceu em Hiroshima e Nagasaki não deveria acontecer nunca mais. Mas o gênio estava fora da garrafa, e alguns países correram para aproveitar-se disso: Rússia, China, França, Inglaterra; mais tarde a Índia, o Paquistão, Israel.

Alguém dirá que isso é democrático.

Em nome da democracia, vamos concordar com a proliferação de armas atômicas? Não é óbvio que Índia e Paquistão, tendo a bomba, potencializam sua rivalidade a um nível quase suicida? O Oriente Médio, como se sabe, é um lugar explosivo. A razão principal para isso é que um número razoável de Estados árabes insiste no propósito de riscar Israel do mapa.

Se cada um deles tiver acesso ao arsenal atômico, a tensão de agora assume dimensões apocalípticas.

Sim, devemos aspirar a um mundo sem armas nucleares. Um passo importante para isso foi a desmontagem do choque ideológico que rachava o mundo em dois. Houve quem falasse no “fim da História”, o que era muito otimismo. Outro bom sinal foi a entrada de Obama, cabeça bem mais aberta que a de um Bush. Também é positivo que a China faça parte, hoje, do “concerto das nações”. Nesse meio tempo, é importante conter a difusão de armas atômicas.

Sobretudo quando se trata de países — como o Irã — abertamente comprometidos com objetivos violentos.

É preciso impedir por todos os meios a difusão de armas nucleares.”

Editorial do “O Globo” de 5 de maio fala sobre o afastamento do atual Itamaraty da realpolitik, e a opção pela retórica, citando um exemplo da forma da nossa política externa de lidar com a questão nuclear. O que se percebe hoje é uma discussão inócua sobre o direito a possuir ou não armas atômicas (ainda que seja indiscutível o risco multiplicado por mil quando se trata de líderes que negam o Holocausto e declaram sua vontade de varrer um país do mapa), quando o que deveria estar em foco é a redução do arsenal nuclear no mundo.

“Mais de cem anos atrás, o chanceler Bismarck, da Alemanha — chamado “o chanceler de ferro” —, cunhou a expressão realpolitik, que desde então é moeda corrente nas relações internacionais. Na mesma linha vai a frase do general De Gaulle: “Países não têm amigos, têm interesses.” O nosso velho Itamaraty sabia disso. Rio Branco foi um mestre da realpolitik, e assim delineou as fronteiras do Brasil só com base na negociação — e não na retórica.

O Brasil de hoje vai por outros caminhos.

Um caso recente foi o de Honduras. O governo brasileiro condenou corretamente o golpe que depôs o presidente Zelaya.

Mas, em seguida, optou pela retórica, e não pelo realismo político.

Zelaya foi deposto porque a Constituição hondurenha não tinha uma cláusula de impeachment, e o presidente em fim de mandato afrontara de todas as maneiras as instituições locais, de modo a perpetuar-se no poder. Tinha, para isso, o apoio explícito do coronel Chávez.

O Brasil ficou na retórica. Recusou-se a conversar com as figuras de expressão da vida hondurenha, e acabou não tomando parte na evolução dos fatos (à parte a estranha aparição de Zelaya, que já estava fora do país, na embaixada brasileira).

O desfecho do caso foi melhor do que se esperava: houve eleições, que já estavam mesmo programadas, e que se mostraram a melhor solução para o que se transformara num impasse. Mas o Brasil insistiu na retórica. Insiste em não reconhecer o governo de Honduras, em companhia de argentinos, equatorianos e outros aliados do coronel Chávez.

Na questão nuclear, o cenário é parecido.

O chanceler Amorim saiu-se há algum tempo com a notável declaração de que os EUA não tinham moral para criticar o Irã por suas aspirações nucleares.

Nada mais distante da realpolitik.

As armas nucleares são uma terrível descoberta da Humanidade.

O que aconteceu em Hiroshima e Nagasaki não deveria acontecer nunca mais. Mas o gênio estava fora da garrafa, e alguns países correram para aproveitar-se disso: Rússia, China, França, Inglaterra; mais tarde a Índia, o Paquistão, Israel.

Alguém dirá que isso é democrático.

Em nome da democracia, vamos concordar com a proliferação de armas atômicas? Não é óbvio que Índia e Paquistão, tendo a bomba, potencializam sua rivalidade a um nível quase suicida? O Oriente Médio, como se sabe, é um lugar explosivo. A razão principal para isso é que um número razoável de Estados árabes insiste no propósito de riscar Israel do mapa.

Se cada um deles tiver acesso ao arsenal atômico, a tensão de agora assume dimensões apocalípticas.

Sim, devemos aspirar a um mundo sem armas nucleares. Um passo importante para isso foi a desmontagem do choque ideológico que rachava o mundo em dois. Houve quem falasse no “fim da História”, o que era muito otimismo. Outro bom sinal foi a entrada de Obama, cabeça bem mais aberta que a de um Bush. Também é positivo que a China faça parte, hoje, do “concerto das nações”. Nesse meio tempo, é importante conter a difusão de armas atômicas.

Sobretudo quando se trata de países — como o Irã — abertamente comprometidos com objetivos violentos.

É preciso impedir por todos os meios a difusão de armas nucleares.”

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