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“Se fosse para resumir a atuação do governo em 2013 em uma palavra, eu diria: desastrosa”

Com crescimento, inflação próxima ao teto da meta (5,91%), dólar apreciado (alta de 15%) em 2013, quais foram os principais erros e acertos em relação à política econômica do ano passado? E para este ano? Quais os principais desafios e perspectivas que a política econômica pode enfrentar, especialmente no cenário externo em que o Federal Reserve System (FED, o Banco Central norte-americano) sinaliza alterações na política monetária? Período atípico em […] Leia mais

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Da Redação

Publicado em 16 de janeiro de 2014 às 16h58.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às 08h39.

Alexandre Schwartsman

Com crescimento, inflação próxima ao teto da meta (5,91%), dólar apreciado (alta de 15%) em 2013, quais foram os principais erros e acertos em relação à política econômica do ano passado? E para este ano? Quais os principais desafios e perspectivas que a política econômica pode enfrentar, especialmente no cenário externo em que o Federal Reserve System (FED, o Banco Central norte-americano) sinaliza alterações na política monetária? Período atípico em que o país sediará a Copa do Mundo e de eleições, quais as chances de serem efetuadas reformas na política econômica?

Para falar sobre estes temas e avaliar a atuação dos responsáveis pela política econômica, convidamos o economista e consultor, Alexandre Schwartsman, sócio-diretor da Schwartsman & Associados Consultoria Econômica. Em entrevista exclusiva, Schwartsman, também especialista do Imil, comenta sobre as práticas de governança, malabarismos fiscais, o arcabouço institucional e formas para a política econômica brasileira se tornar mais próspera e responsável.

Doutor em economia pela Universidade da Califórnia, Berkeley, Schwartsman atou em postos importante no setor público (Ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central) e no setor privado (ex- economista chefe do Banco Santander). Também é professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) e colunista da Folha de S. Paulo e do Valor Econômico.

Por Wagner Vargas

Wagner Vargas – Apesar de abaixo do esperado, o Brasil apresentou aumento da atividade econômica em 2013; atingiu a meta de superávit primário e o BC retomou a alta de juros e a inflação não fechou no teto. Qual sua avaliação de como a política econômica foi conduzida no ano passado?

Alexandre Schwartsman – Continuou desastrosa, não tem outra palavra isso. O país cresceu mais que no ano retrasado. Mas, em 2012, ele cresceu 1%, e ter crescido mais do que isso no ano passado, não chega a ser um mérito extraordinário. De qualquer forma, estamos falando de um ritmo de crescimento na casa de 2%, que também não é um valor que a gente possa se orgulhar. A inflação caiu, mas a gente sabe como: controle muito forte da taxa dos chamados preços administrados. Os preços ainda estão subindo forte, as medidas de núcleo de inflação não desaceleraram — pelo contrário, elas vieram acelerando — nem crescimento, nem inflação foram muito bons. E, francamente, a meta de primário, do jeito que foi cumprida, era melhor que não fosse. Se fosse para resumir em uma palavra a atuação do governo ano passado, seria esta: desastrosa.

Wagner Vargas- Houve evolução? Falta fazer algo mais específico?

Alexandre Schwartsman – Acredito que há algumas. O governo deu muita cabeçada, apesar da condução da política macro que não teve evolução nenhuma e sim um retrocesso. O governo não pretende admitir seus erros, é muito claro que eles pretendem continuar neste curso. Já na questão das concessões, há uma melhora. Algo que começou muito torto e não está exatamente do jeito ideal. Mas, aparentemente, foram aprendendo ao longo do caminho, foram errando muito, agora estão errando menos. Porque não tem alternativa, tentaram fazer um leilão do jeito que eles queriam e foi um fracasso; no leilão seguinte já começaram a mudar um pouco, estão tabelando menos retorno, não é o ideal, mas temos que reconhecer que houve uma evolução na base da cabeçada mas, independentemente da origem, é bom que tenha uma evolução.

Wagner Vargas – Para o governo não há mudança da matriz macroeconômica (tripé), operando “estritamente dentro dos preceitos de meta de inflação, câmbio flutuante”. Mas, o senhor e muitos analistas apontam o contrário, essencialmente, em relação à responsabilidade fiscal e à inflação, o que fez a presidente resgatar uma expressão da ditadura militar: “guerra psicológica”. Por que tanta disparidade nas visões?

Alexandre Schwartsman – O governo tem um legado político que ele quer defender e não vai admitir a verdade. A verdade é que ele abandonou o Tripé econômico [responsabilidade fiscal, câmbio flutuante e metas de inflação]. Se ele não abandonou, está fazendo alguma coisa muito errada, porque a meta fiscal não foi atingida, a meta de inflação não foi atingida e o câmbio não flutua. Esta conversa de ‘o tripé está mantido’ é da boca para fora. Rigorosamente, não guarda nenhuma relação como que se observa concretamente no campo da política econômica. Em relação ao câmbio, de alguma forma administrado, não totalmente, o Banco Central tem estado muito ativo, basta lembrar o quanto vendeu de Swap no ano passado, o quanto ele prometeu de vender na primeira metade deste ano.

O Banco Central em tempos atrás tentava trazer o câmbio para cima, agora está tentando trazê-lo para baixo. O primário [superávit], ninguém sabe o que é, se está na meta, o que de fato está acontecendo, porque a meta, em si, muda e a execução é um truque contábil em cima do outro. E a inflação está aí para todo mundo ver. O BC projeta, oficialmente, a inflação acima da meta até 2015. Não entregou em 2011, em 2012, em 2013 e não vai entregar a meta em 2014 e em 2015. Se o BC está perseguindo a meta, ele está fazendo alguma coisa muito errada, porque cinco anos para alcançá-la, não tem desculpa. Esta conversa de manutenção do tripé é uma conversinha para boi dormir. Na prática, temos um arranjo de política econômica bem diferente.

Wagner Vargas – Segundo o Ministro da Fazenda, os dados do superávit primário foram antecipados para acalmar os ânimos do mercado ou os “nervosinhos”. No entanto, para fechar as contas, o governo tem se valido de estratégias classificadas ironicamente como “criativas”. De que forma isso ocorre e como elas afetam a credibilidade, ainda que as metas tenham sido cumpridas?

Alexandre Schwartsman – Não adianta, o governo tenta disfarçar com certas estratégias, mas, de uma forma ou de outra, há um conjunto de analistas do setor privado da imprensa que consegue perceber as manobras: ‘fizemos 75 bilhões’, eles percebem que não fizeram. É “criativo” porque sempre aparece alguma coisa nova. Em 2012, de repente, apareceu uma receita do Fundo Soberano que salvou as contas, um dinheiro que, na verdade, não existe, tínhamos que saber como ele foi depositado. Ano passado, tivemos as receitas não recorrentes, especificamente o leilão do campo de Libra. Você faz o leilão apenas uma vez, não vai obter sempre a receita de R$ 15 bilhões, que foi ligada a isso. Houve uma receita de renegociação tributária, o Refis, de R$ 20 bilhões, que também não vai se repetir.

É como se uma família estivesse vendendo suas joias e contabilizando-as como renda familiar, o que não é verdadeiro, já que você tem um conjunto finito de joias da família. Além disso, os restos a pagar que aumentaram em 2013 e 2014, despesas que foram reconhecidas em 2013, mas que só serão quitadas em 2014. Desta forma, eles melhoram as contas de 2013 à custa de piorá-las em 2014 e, muito provavelmente, será feito o mesmo neste ano, é uma bicicleta. Este tipo de coisa eu não acho sustentável. Quando olhamos para a parte sustentável do que tem sido o superávit do governo, são números muito baixos, inferior a 1% do PIB. Certamente, há uma deterioração séria em relação à política fiscal do país.

LEIA A ENTREVISTA COMPLETA

Alexandre Schwartsman

Com crescimento, inflação próxima ao teto da meta (5,91%), dólar apreciado (alta de 15%) em 2013, quais foram os principais erros e acertos em relação à política econômica do ano passado? E para este ano? Quais os principais desafios e perspectivas que a política econômica pode enfrentar, especialmente no cenário externo em que o Federal Reserve System (FED, o Banco Central norte-americano) sinaliza alterações na política monetária? Período atípico em que o país sediará a Copa do Mundo e de eleições, quais as chances de serem efetuadas reformas na política econômica?

Para falar sobre estes temas e avaliar a atuação dos responsáveis pela política econômica, convidamos o economista e consultor, Alexandre Schwartsman, sócio-diretor da Schwartsman & Associados Consultoria Econômica. Em entrevista exclusiva, Schwartsman, também especialista do Imil, comenta sobre as práticas de governança, malabarismos fiscais, o arcabouço institucional e formas para a política econômica brasileira se tornar mais próspera e responsável.

Doutor em economia pela Universidade da Califórnia, Berkeley, Schwartsman atou em postos importante no setor público (Ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central) e no setor privado (ex- economista chefe do Banco Santander). Também é professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) e colunista da Folha de S. Paulo e do Valor Econômico.

Por Wagner Vargas

Wagner Vargas – Apesar de abaixo do esperado, o Brasil apresentou aumento da atividade econômica em 2013; atingiu a meta de superávit primário e o BC retomou a alta de juros e a inflação não fechou no teto. Qual sua avaliação de como a política econômica foi conduzida no ano passado?

Alexandre Schwartsman – Continuou desastrosa, não tem outra palavra isso. O país cresceu mais que no ano retrasado. Mas, em 2012, ele cresceu 1%, e ter crescido mais do que isso no ano passado, não chega a ser um mérito extraordinário. De qualquer forma, estamos falando de um ritmo de crescimento na casa de 2%, que também não é um valor que a gente possa se orgulhar. A inflação caiu, mas a gente sabe como: controle muito forte da taxa dos chamados preços administrados. Os preços ainda estão subindo forte, as medidas de núcleo de inflação não desaceleraram — pelo contrário, elas vieram acelerando — nem crescimento, nem inflação foram muito bons. E, francamente, a meta de primário, do jeito que foi cumprida, era melhor que não fosse. Se fosse para resumir em uma palavra a atuação do governo ano passado, seria esta: desastrosa.

Wagner Vargas- Houve evolução? Falta fazer algo mais específico?

Alexandre Schwartsman – Acredito que há algumas. O governo deu muita cabeçada, apesar da condução da política macro que não teve evolução nenhuma e sim um retrocesso. O governo não pretende admitir seus erros, é muito claro que eles pretendem continuar neste curso. Já na questão das concessões, há uma melhora. Algo que começou muito torto e não está exatamente do jeito ideal. Mas, aparentemente, foram aprendendo ao longo do caminho, foram errando muito, agora estão errando menos. Porque não tem alternativa, tentaram fazer um leilão do jeito que eles queriam e foi um fracasso; no leilão seguinte já começaram a mudar um pouco, estão tabelando menos retorno, não é o ideal, mas temos que reconhecer que houve uma evolução na base da cabeçada mas, independentemente da origem, é bom que tenha uma evolução.

Wagner Vargas – Para o governo não há mudança da matriz macroeconômica (tripé), operando “estritamente dentro dos preceitos de meta de inflação, câmbio flutuante”. Mas, o senhor e muitos analistas apontam o contrário, essencialmente, em relação à responsabilidade fiscal e à inflação, o que fez a presidente resgatar uma expressão da ditadura militar: “guerra psicológica”. Por que tanta disparidade nas visões?

Alexandre Schwartsman – O governo tem um legado político que ele quer defender e não vai admitir a verdade. A verdade é que ele abandonou o Tripé econômico [responsabilidade fiscal, câmbio flutuante e metas de inflação]. Se ele não abandonou, está fazendo alguma coisa muito errada, porque a meta fiscal não foi atingida, a meta de inflação não foi atingida e o câmbio não flutua. Esta conversa de ‘o tripé está mantido’ é da boca para fora. Rigorosamente, não guarda nenhuma relação como que se observa concretamente no campo da política econômica. Em relação ao câmbio, de alguma forma administrado, não totalmente, o Banco Central tem estado muito ativo, basta lembrar o quanto vendeu de Swap no ano passado, o quanto ele prometeu de vender na primeira metade deste ano.

O Banco Central em tempos atrás tentava trazer o câmbio para cima, agora está tentando trazê-lo para baixo. O primário [superávit], ninguém sabe o que é, se está na meta, o que de fato está acontecendo, porque a meta, em si, muda e a execução é um truque contábil em cima do outro. E a inflação está aí para todo mundo ver. O BC projeta, oficialmente, a inflação acima da meta até 2015. Não entregou em 2011, em 2012, em 2013 e não vai entregar a meta em 2014 e em 2015. Se o BC está perseguindo a meta, ele está fazendo alguma coisa muito errada, porque cinco anos para alcançá-la, não tem desculpa. Esta conversa de manutenção do tripé é uma conversinha para boi dormir. Na prática, temos um arranjo de política econômica bem diferente.

Wagner Vargas – Segundo o Ministro da Fazenda, os dados do superávit primário foram antecipados para acalmar os ânimos do mercado ou os “nervosinhos”. No entanto, para fechar as contas, o governo tem se valido de estratégias classificadas ironicamente como “criativas”. De que forma isso ocorre e como elas afetam a credibilidade, ainda que as metas tenham sido cumpridas?

Alexandre Schwartsman – Não adianta, o governo tenta disfarçar com certas estratégias, mas, de uma forma ou de outra, há um conjunto de analistas do setor privado da imprensa que consegue perceber as manobras: ‘fizemos 75 bilhões’, eles percebem que não fizeram. É “criativo” porque sempre aparece alguma coisa nova. Em 2012, de repente, apareceu uma receita do Fundo Soberano que salvou as contas, um dinheiro que, na verdade, não existe, tínhamos que saber como ele foi depositado. Ano passado, tivemos as receitas não recorrentes, especificamente o leilão do campo de Libra. Você faz o leilão apenas uma vez, não vai obter sempre a receita de R$ 15 bilhões, que foi ligada a isso. Houve uma receita de renegociação tributária, o Refis, de R$ 20 bilhões, que também não vai se repetir.

É como se uma família estivesse vendendo suas joias e contabilizando-as como renda familiar, o que não é verdadeiro, já que você tem um conjunto finito de joias da família. Além disso, os restos a pagar que aumentaram em 2013 e 2014, despesas que foram reconhecidas em 2013, mas que só serão quitadas em 2014. Desta forma, eles melhoram as contas de 2013 à custa de piorá-las em 2014 e, muito provavelmente, será feito o mesmo neste ano, é uma bicicleta. Este tipo de coisa eu não acho sustentável. Quando olhamos para a parte sustentável do que tem sido o superávit do governo, são números muito baixos, inferior a 1% do PIB. Certamente, há uma deterioração séria em relação à política fiscal do país.

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