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&, diz João Antonio Wiegerinck

Depois de todo o alarde em torno da extinção do 14.º e 15.º salários dos funcionários do Congresso, o presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) adota uma série de manobras que devem compensar os deputados federais das perdas financeiras impostas pela medida aprovada no fim de fevereiro. No que depender do chefe do Legislativo Federal, a contenção de gastos, inicialmente, estimada em R$ 27,41 milhões anuais deve entrar para […] Leia mais

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Instituto Millenium

Publicado em 26 de março de 2013 às, 17h48.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 09h06.

Depois de todo o alarde em torno da extinção do 14.º e 15.º salários dos funcionários do Congresso, o presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) adota uma série de manobras que devem compensar os deputados federais das perdas financeiras impostas pela medida aprovada no fim de fevereiro. No que depender do chefe do Legislativo Federal, a contenção de gastos, inicialmente, estimada em R$ 27,41 milhões anuais deve entrar para a lista das boas intenções não concretizadas.

Além do aumento das cotas das despesas relativas ao exercício dos mandatos, aprovado pela Mesa da Câmara em 20 de março, o pacote de benefícios inclui a criação de 44 cargos, para funcionários não concursados, e a instituição 15 novas funções comissionadas.

O especialista do Instituto Millenium e professor de direito e filosofia jurídica João Antônio Wigerinck critica a postura dos congressistas. “Com esse aumento da cota fica evidente que a extinção dos 14º e 15º salários foi ato orquestrado para iludir os contribuintes e que provavelmente até o fim do ano teremos também um reajuste dos próprios salários diretos dos mesmos parlamentares”.

O índice de correção da verba indenizatória, mais conhecida como “cotão”, deve se basear na inflação dos últimos quatro anos, quando a medida entrou em vigor.  Isso representará um acréscimo R$ 21 milhões aos atuais  R$ 170 milhões gastos com esse tipo de despesas. O aumento do preço das passagens áreas é uma das principais justificativas do pedido de revisão do benefício.

O processo de aprovação do reajuste

A Constituição Federal atribui as decisões sobre a fixação dos ganhos e eventuais reajustes, incluindo custos de manutenção na vigência do cargo e suas funções, aos membros dos três poderes. Segundo Wiegerinck, as decisões sobre reajustes acontecem internamente e em duas etapas. Primeiro uma ou mais comissões da Câmara dos Deputados elaboram o texto da norma interna prevendo a correção e indicando o critério utilizado. Em seguida, o projeto dessa norma é levado a plenário para aprovação em quórum simples ou relativo, o quórum mais baixo que existe em termos de aprovação de normas.

O professor afirma que a Procuradoria Geral da República pode abrir processo investigativo para apurar possíveis desequilíbrios no uso da verba pública. Ele explica que, ao contrário do que acontece no Brasil, em países desenvolvidos, como na União Europeia, um ordenamento jurídico indica a participação de todos os poderes no exame de eventuais reajustes.

A atuação e a percepção dos eleitores

Diante desse quadro, o cidadão pode enviar petições simples ao Ministério Público Federal pedindo a investigação de situações consideradas suspeitas e (ou) propor uma Ação Popular para que a Justiça Federal apure possíveis ilegalidades. O especialista do Millenium lembra que essas providências tem custo zero, até mesmo se o cidadão perder a causa.

A extinção do 14º e 15º salários foi amplamente divulgada pelos líderes do Congresso, Renan Calheiros (Senado) e Henrique Eduardo Alves (Câmara). Eles acenavam para a população com o discurso de redução dos gastos e dos privilégios do funcionalismo público. Wiegerinck explica que esse tipo de manobra é percebida de duas maneiras pela opinião pública. “Existem alguns assalariados que também queriam o 14º e o 15º salários, assim como os parlamentares o tinham. Aqui o contingente de corruptos entre a população é imenso, e isso se reflete na política. É a caixinha, o suborno para não ser multado e o famigerado “jeitinho brasileiro”. Uma parcela menor da população, não obrigatoriamente a mais abastada, percebe a manobra com profunda indignação”.

Mais sobre o cotão

O “cotão” foi criado para cobrir os gastos dos parlamentares com passagens aéreas, aluguel e outras despesas com escritório no Estado, Correios, alimentação, telefones, gasolina, aluguel de carros, avião ou embarcação.  O valor da cota é equivalente a distância do estado de origem do congressista a Brasília. O recurso mais alto é de R$ 34,2 mil por mês, pago aos deputados de Roraima. O auxílio-moradia, que hoje equivalente a R$ 3 mil, também deve sofrer reajustes.

Nesse caso fica a sensação de que os presidentes da Câmara e do Senado conseguiram um duplo benefício, isto é, passaram a imagem de gestores comprometidos como o uso adequado do dinheiro público, através do fim dos salários extras, ao mesmo tempo que mantiveram os benefícios da classe que representam, com o reajuste do “cotão”. Wiegerinck questiona essa visão. Para ele, os congressistas ficaram duplamente prejudicados, pela falsa moralidade administrativa, e pela imagem de malandro, que vive de iludir ou tentar iludir os contribuintes.