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Grupo Boticário, da alquimia a uma potência internacional e beleza

Confira a entrevista com Artur Grynbaum, acionista e vice-presidente do Conselho do Grupo Boticário

 (Arquivo Pessoal/Divulgação)
(Arquivo Pessoal/Divulgação)
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Cris Arcangeli — Empreender Liberta

Publicado em 23 de março de 2023 às, 08h00.

Última atualização em 23 de março de 2023 às, 12h41.

Mudar sempre, aperfeiçoar constantemente, inovar para melhorar. Essa é a filosofia do Grupo Boticário, cuja história se confunde com a história da perfumaria Brasileira e tem nosso entrevistado, Artur Grynbaum, como acionista e vice-presidente do Conselho. Ingressou no Grupo Boticário em 1986, nove anos após sua fundação, em 1977, por Miguel Krigsner. Da pequena farmácia de manipulação O Boticário, localizada no centro de Curitiba, nasceu um dos maiores grupos empresariais do Brasil. Desde o início os sócios tinham como foco desenvolver uma marca 100% brasileira, com produtos de alta qualidade, inspirados no amor e cuidado com os clientes. Sempre atenta às necessidades do consumidor, a empresa cresceu e, em 2010, tornou-se um grupo multimarcas e multicanal, que faturou R$ 18 bilhões em 2021.

De um laboratório de manipulação, uma Botica, para um grupo internacional, sempre antenado, conectado, ações e conexões 4.0. Conte um pouco sobre a sua trajetória, a evolução da empresa e como chegou ao status que possui hoje.

Tanto eu como o Miguel, que viemos de famílias que trabalhavam com varejo, tínhamos uma visão diferenciada para a pequena farmácia de manipulação no centro de Curitiba. Há 45 anos nós pensávamos no consumidor, em oferecer um ambiente diferente, agradável, enquanto as pessoas esperavam seus medicamentos ficarem prontos. Logo começamos a ofertar produtos que o Miguel elaborou: um perfume, um creme em um shampoo de algas marinhas. Nosso próximo passo foi abrir uma loja no aeroporto Afonso Pena, ao lado da área de desembarque, para atrair tanto quem desembarcava como quem ia buscar pessoas. Os clientes começaram a se interessar por nossos produtos para revender em suas lojas, sem falar num movimento interessante de comissárias de bordo, que compravam para revender em outras partes do país, e de pessoas de bairros ou cidades vizinhos que também vinham buscar produtos para revender. Posso dizer que esse foi o “nascimento tupiniquim” do franchising brasileiro, com o início de um canal informal de distribuição. Com o aparecimento do franchising propriamente dito, analisamos a possibilidade e optamos em abrir franquias para lojas exclusivas da marca Boticário.

Todo nosso trabalho sempre foi baseado em três pilares sólidos: foco no consumido; respeito pelos parceiros de negócios, que são fundamentais, junto com um serviço de apoio para que pudessem estabelecer seus negócios; e inovação. Hoje lançamos mais de três mil novos produtos por ano e inovamos sempre em comunicação, em formato de lojas, em processos, na forma de gestão, enfim, a inovação faz parte do nosso DNA.

Como foi a transição da empresa franqueadora O Boticário para Grupo Boticário, que hoje possui diversas marcas e canais de venda diversificados?

Eu queria ter duas mil lojas no ano 2000 e consegui realizar esse desejo. Ao longo do tempo, passamos por vários processos de repensar o futuro, principalmente entre 1995 e 1996, quando fizemos o que chamamos de “Redesenho” e mudamos nosso modelo de gestão. Sim, porque não temos que mudar algo somente quando temos problemas: temos que mudar sempre para podermos continuar crescendo, para atender a um novo cenário, mesmo estando bem como estávamos naquele momento, inclusive com um faturamento acima de R$ 100 milhões e a rede de parceiros bastante satisfeita.

Nós fizemos uma transformação na forma de gerir o negócio, na conexão com as franquias e essa foi a semente daquilo que o grupo se tornou hoje, detentor de uma posição muito importante no varejo e na indústria mundial de beleza e cosméticos. Com nossa visão de comunicação em rede, chegamos a ser a única franquia de pequenas lojas, no mundo, interligada por satélite num momento em que esse era um serviço que existia somente em supermercados e bancos, por exemplo. Nosso lema sempre foi fazer o melhor, não ser o maior. Queremos oferecer a melhor franquia, a melhor experiência ao consumidor, ter o melhor franqueado, o melhor produto.

A grande mudança e a criação do Grupo Boticário começaram em 2008, o ano da grande crise financeira mundial. Apesar disso analisamos o potencial do mercado como empreendedores, as oportunidades e a configuração do setor, entendendo que a economia podia ter tido um solavanco, mas as possibilidades existiam. Com base em tudo o que construímos ao longo da nossa história, conhecíamos o consumidor, entendíamos de logística e assim passamos de uma marca única que operava via franchising, que por sinal estava muito bem e tinha grande potencial de crescimento, para uma avanço que nos levou a criar três novos negócios totalmente orgânicos em três anos. Desenvolvemos a Eudora, a Quem Disse Berenice e a Beauty Box, novas marcas para alavancar novos canais, enquanto nosso negócio principal – O Boticário - continuava rodando em alta velocidade. A média normal de mercado é lançar um novo negócio a cada quatro ou cinco anos. Se nós tivéssemos seguido isso, estaríamos abrindo a terceira marca somente em 2025.

Como foi a evolução do grupo e quantas empresas possui atualmente?

Hoje o grupo possui as marcas O Boticário, Eudora, Quem Disse Berenice, Beauty Box, Muti, Vult, OUI, MOOZ, Dr JONES, Beleza na Web e Truss. A partir dessa nova configuração, passamos a atuar em vários canais: venda direta, lojas multimarcas, comércio eletrônico, market place e outros. Hoje possuímos 3.756 lojas só da marca O Boticário, chegando a mais de quatro mil com todas as unidades do grupo. Além disso, nossos produtos estão presentes em mais 65 mil pontos de venda como farmácias e drogarias.

Percebemos a importância do comércio eletrônico, principalmente em relacionamento com os clientes e adquirimos o canal Beleza na Web e a marca Vult. Mas não ficamos somente em aquisições: criamos Multi B, para trabalhar canais não proprietários e multimarcas com as outras marcas do grupo; criamos a fintech MOOZ, que desenvolve soluções para o varejo; desenvolvemos na França a linha de alta perfumaria Oui para vendas no Brasil; e fizemos mais duas aquisições: a marca Dr JONES, de cosméticos masculinos e a Truss, marca nacional de produtos capilares com forte presença em salões profissionais.. Paralelamente buscamos unir operações que ajudavam no serviço prestado para nossos parceiros de negócios, criando o que hoje é chamado de ecossistema. O objetivo era criar um modelo de distribuição de produtos de beleza e estética o mais variado possível, incluindo uma abordagem multicanal e multimarcas.

Vocês mantiveram na composição do grupo os mesmos princípios e propósitos de 45 anos atrás?

Sim. Somos da escola de criadores de marcas. As nossa principais são as que criamos, sempre em conexão com o consumidor e com um propósito muito claro: respeitar a proposta de valor, o portfólio e  o canal. É claro que o consumidor não quer uma marca só e precisamos ofertar diferentes modelos para diferentes tipos de consumidores. Nosso processo vai do insight de um produto até o pós venda, na residência do consumidor, e atuar em todos os canais dentro desta equação. São raros os casos de empresas, no mundo, com essa configuração, com essa diversidade de canais. Nós atuamos em tudo.

Quando se dá o entendimento da necessidade de mudanças e como você define a inovação?

Meus pilares são muito básicos. As coisas são simples e são variações sobre o mesmo tema. Minha visão para o crescimento do negócio é que todos os momentos de inovação devem acompanhar de perto a jornada dos consumidores, o que usam, quando usam, como usam, quais os seus hábitos de consumo. Foi isso que deu embasamento para criarmos o grupo, conscientes da existência de novas oportunidades. Sempre fomos muito antenados, queremos que a nossa empresa esteja sempre na vanguarda. Por isso temos que estar sempre plugados no que acontece.

Em 1996 tivemos um grande clique do redesenho da empresa, que tinha um mindset de fábrica e que, a partir daquele momento, tinha passado a ser presença de marca e canal de distribuição. Claro que a fábrica é importante para atingirmos nossos objetivos, com qualidade e quantidade, mas o jogo é outro. Precisamos estar sempre à frente para entender as mudanças e de que forma elas repercutem no negócio. E em 2021, mesmo estando numa situação ótima apesar da pandemia, revisitamos todo o modelo de negócio e criamos um novo, com uma visão mais integrada, voltada para a jornada do consumidor.

Nós não fazemos planejamento estratégico uma vez por ano; fazemos o tempo todo, olhando para a frente para ver se o direcional está certo e voltando para o dia de hoje, para entender se nossa estratégia está correta, se as competências estão certas e se temos o desenho certo de organização.   Uma empresa é feita de moléculas vivas, como sempre me diz meu sócio e amigo, Miguel Krigsner.  O importante é ter a mentalidade de sempre fazer diferente, ver o que tem de novo e avaliar como podemos olhar diferente para essa equação, até porque os processos, mesmo aqueles estabelecidos, são cada vez mais flexíveis.

Conte sobre a participação do grupo em movimentos sociais e sobre as iniciativas de ESG.

Para nós ESG é sustentabilidade, responsabilidade social corporativa, coisas que sempre tivemos no nosso DNA. Criamos a Fundação Grupo Boticário de Conservação da Natureza em 1990, quando a palavra sustentabilidade praticamente não existia nos dicionários. Acreditamos que a visão importante é preservar fauna e flora para melhorar a qualidade de vida humana, para auxiliar em projetos, pesquisas, ter áreas protegidas e, principalmente, atuar na Educação de crianças, que acabam mudando a mentalidade dos pais, em casa. Entendemos que é necessário unir meio ambiente, social e econômico, pois se mexer somente com uma perna a equação não fecha.

Em 2004 criamos o Instituto Grupo Boticário, focado em cursos, na promoção do empreendedorismo feminino, a ensinar mulheres como gerir seus negócios. Procuramos sempre buscar públicos que estão em situação de vulnerabilidade, para preparar as pessoas para o mercado como um todo. Hoje a nossa é uma das fundações de conservação ambiental mais respeitadas no Brasil e no mundo.

Quanto ao ESG , temos suas diretrizes muito presentes, porque este é o jeito de se fazer negócios, de oferecer oportunidades de desenvolvimento e para a sociedade ter um mundo melhor. O ESG faz parte do modelo de negócios do Boticário como uma regra tão importante como as de business, custo, eficiência, pois mostra o que precisamos fazer para melhorar a operação, traz critérios fundamentais para o planejamento e execução e está inserido em todas as operações. Cito como exemplo o nosso Programa Estratégico de Categorias – PEC, que define o que vamos lançar, que tipo de materiais serão usados, o que vai sobrar e qual destinação será dada.  Já agimos assim desde o ano 2.000, pois não esperamos aparecer uma legislação para optarmos pelas melhores práticas.

Nossa agenda para 2030, por exemplo, contempla questões como mapear e regenerar 150% dos resíduos sólidos gerados pela nossa cadeia, incluindo fornecedores e parceiros de negócios. Hoje este percentual é de 90%. Queremos criar uma corrente de pessoas e empresas para fazer a coisa certa. Além disso, vamos criar cursos e trabalhar com cooperativas para destinação de resíduos sólidos, o que deve impactar a vida de um milhão de brasileiros em situação de desigualdade.

Qual a importância de compartilhar conhecimentos e experiências com novos empreendedores, como acontecerá no Imersão Centurion?

As trocas são ricas, mas o bom mesmo é inspirar as pessoas, porque muitas não sabem nem por onde começar. E mostrar que é possível fazer, até mesmo com pequenas alterações no formato da operação do dia a dia. Temos uma pauta muito forte de diversidade e inclusão, que são alavancas de inovação e crescimento, porque se quero servir o consumidor, preciso ter comigo pessoas que ajudem a pensar em modelos diferentes, gerando oportunidade de trabalho. Queremos promover a geração de empregos como uma questão de dar dignidade e valor para as pessoas. Nossa grande missão, nesta jornada de 45 anos, é criar oportunidades através da beleza para criar um mundo melhor. Isso nos acompanha na jornada de 45 anos.