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Novo método usa calor produzido pela luz no tratamento do câncer

Técnica desenvolvida na USP de São Carlos usa luz infravermelha para induzir a morte de células cancerosas por hipertermia

O calor gerado pela luz induz a morte das células tumorais (Jonathan Pow/Getty Images)

Isabela Rovaroto

Publicado em 5 de junho de 2019 às 11h40.

Um método otimizado para o tratamento de tumores baseado no uso do calor produzido pela luz (fototermia) foi desenvolvido por pesquisadores do Grupo de Nanomedicina e Nanotoxicologia (GNano) do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (IFSC-USP).

A técnica consiste em usar nanocápsulas feitas com membranas obtidas de células cancerosas para transportar antitumorais e materiais fotoativos (ativados pela luz) em escala nanométrica (da bilionésima parte do metro) até um tumor. Ao serem irradiadas por luz infravermelha, as nanocápsulas de membrana se rompem e liberam o material presente em seu interior. O calor gerado pela luz promove o aquecimento do material fotoativo, induzindo a morte das células tumorais por hipertermia.

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O trabalho foi desenvolvido durante o doutorado de Valéria Spolon Marangoni, bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Resultados da aplicação do método no tratamento de câncer de bexiga em animais foram apresentados durante o Simpósio de Pesquisa e Inovação em Materiais Funcionais, promovido pelo Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais ( CDMF ) nos dias 23 e 24 maio na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

O CDMF é um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão ( CEPID ) apoiado pela FAPESP.

“Desenvolvemos um nanocarreador que pode ser um potencial candidato para melhorar o transporte, a liberação e a ativação de fármacos usados no tratamento do câncer por fototermia”, disse Valtencir Zucolotto, professor do IFSC-USP e orientador da pesquisa, durante o evento.

O novo sistema foi desenvolvido a partir de nanopartículas feitas de materiais chamados de teranósticos – com aplicações simultâneas em terapia e em diagnóstico – desenvolvidos pelos pesquisadores nos últimos anos.

Ao serem colocadas no sistema circulatório, essas nanopartículas tendem a migrar e a se incorporar a células tumorais. Sua localização no organismo pode ser mapeada por meio de tomografia, ressonância magnética ou de espectroscopia fotoacústica, por exemplo.

Uma vez visualizadas, é possível promover o aquecimento das nanopartículas por magneto – se possuírem um núcleo magnético, como a magnetita, por exemplo – ou por fototermia, a fim de promover a morte das células tumorais a que estão incorporadas por hipertermia.

“Ao serem irradiadas por luz infravermelha, nanopartículas de óxido de grafeno incubadas em células Hela [tipo de célula ‘imortal’, que pode ser cultivada em laboratório indefinidamente], por exemplo, promovem um aquecimento de oito a 12 graus nessas células, induzindo-as à morte”, disse Zucolotto.

Nanobastões de ouro

Além do grafeno, os pesquisadores têm usado ouro para criar as nanopartículas teranósticas nas formas de estrelas e de bastões. Com esses formatos, explicaram, o nanomaterial se torna capaz de absorver luz no infravermelho e promover aquecimento.

As nanopartículas de ouro com forma esférica, apesar de serem muito boas para aplicação em sistemas de entrega de fármacos [drug delivery], só absorvem luz na região visível do espectro eletromagnético. “Isso impede o uso em fototermia, pois a luz visível não atravessa os tecidos como a luz infravermelha”, comparou Zucolotto.

Nos últimos anos, porém, engenheiros de materiais descobriram que ao “esticar” um pouco nanopartículas esféricas de ouro elas ganhavam a forma de bastões, o que lhes confere um modo vibracional eletrônico longitudinal que permite a absorção de luz no espectro infravermelho.

Com base nessa descoberta, os pesquisadores do IFSC-USP começaram a produzir nanobastões de ouro e testá-los no tratamento de alguns tipos de câncer por fototermia.

Para transportar esses compostos para as células alvos foram desenvolvidas nanocápsulas feitas de membranas celulares cultivadas em laboratório, obtidas de linhagens de tumor de pulmão, por exemplo.

Hoje, a maioria das nanocápsulas para carrear fármacos e moléculas pelo organismo e entregá-los em regiões específicas ou dentro de células são fabricadas a partir de lipídeos e polímeros.

Segundo Zucolotto, a entrega dos compostos por meio de nanocápsulas feitas com membranas de células é mais eficiente por serem constituídas do mesmo material das células-alvo.

“Como as nanocápsulas de membrana celular têm composição muito parecida com as de células tumorais, com proteínas como as galectinas, o reconhecimento e a adesão entre elas é facilitado. Isso permite que as nanocápsulas tenham uma interação maior com as células-alvo e consigam entregar com mais eficiência o material que carregam”, disse.

Por meio de melhorias na técnica de obtenção dessas nanocápsulas, os pesquisadores têm conseguido colocar uma maior quantidade de nanobastões de ouro e de antitumorais em seu interior.

Em um estudo recente, publicado na revista Applied Bio Materials, eles usaram nanobastões de ouro e o quimioterápico betalapaxona, envoltos em nanocápsulas de membrana celular, para tratar tumores de bexiga induzidos em camundongos.

Os resultados dos experimentos, feitos em colaboração com o professor Wagner José Fávaro, do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mostraram que as nanocápsulas se ligaram aos tumores. Ao serem irradiadas com luz infravermelha uma única vez, por dois minutos, as cápsulas de membrana se romperam e liberaram os nanobastões de ouro e a betalapaxona entre dez e 20 minutos depois de iniciado o processo.

As análises dos tecidos também revelaram que nenhum dos tumores na bexiga dos animais cresceu e alguns até regrediram.

“Constatamos que esse método de tratamento promoveu a destruição das células cancerosas por fototermia e por quimioterapia de foma sinérgica”, disse Zucolloto.

O artigo Photothermia and activated drug release of natural cell membrane coated plasmonic gold nanorods and β-Lapachone (DOI: 10.1021/acsabm.8b00603), de Valeria S. Marangoni, Juliana Cancino Bernardi, Ianny B. Reis, Wagner J. Fávaro e Valtencir Zucolotto, pode ser lido na revista Applied Bio Materials em https://pubs.acs.org/doi/10.1021/acsabm.8b00603 .

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