No Brasil, 59% da força de trabalho não está engajada (Daniel de la Hoz/Getty Images)
Pesquisador, consultor e palestrante sobre a vida organizacional
Publicado em 20 de agosto de 2024 às 11h26.
A pandemia de Covid-19 não apenas revolucionou a forma como trabalhamos, mas também desencadeou uma reavaliação profunda de nossa relação com o trabalho. Nesse contexto, um novo termo ganhou destaque: a "demissão silenciosa". O termo se refere a funcionários que optam por fazer apenas o mínimo necessário em seu trabalho, sem se esforçar além de suas obrigações básicas. Apesar de presentes fisicamente, estão emocionalmente desligados da empresa.
Mas, seria esse um comportamento realmente novo? A resposta é não. Desistir silenciosamente é uma nomenclatura nova para um comportamento antigo. A Gallup, renomada empresa global de pesquisa e consultoria, vem estudando o engajamento dos funcionários há mais de dez anos. Em seu último relatório "Estado do Ambiente de Trabalho Global de 2024", que abrangeu 142 países, traz dados alarmantes. Estima-se que o baixo engajamento dos funcionários resulte em um prejuízo de 8,9 trilhões de dólares para a economia global, o equivalente a 9% do PIB mundial.
No Brasil, o cenário não é diferente. Os resultados revelam que apenas 31% da força de trabalho está genuinamente engajada e prosperando em suas funções. Por outro lado, a grande maioria encontra-se em um estado de desengajamento: 10% estão ativamente desengajados, enquanto 59% não estão engajados, cumprindo apenas o mínimo necessário.
As consequências da demissão silenciosa vão além dos prejuízos financeiros, afetando também a cultura organizacional, a inovação e a retenção de talentos. Funcionários desengajados tendem a ser menos propensos a contribuir com ideias criativas, assumir riscos calculados e se comprometer com a visão da empresa a longo prazo. Além disso, a falta de engajamento pode se espalhar como um vírus, influenciando negativamente o clima emocional e aumentando a rotatividade de funcionários.
Os indícios da demissão silenciosa se manifestam de forma sutil, mas perceptível. O olhar apático, desprovido da centelha de entusiasmo, a indiferença diante de novas oportunidades e desafios, o declínio gradual no desempenho, a postura passiva durante as interações em equipe e o aumento preocupante do absenteísmo são sinais alarmantes que ecoam um mal-estar. Esses comportamentos, como peças de um quebra-cabeça complexo, apontam para uma deterioração do engajamento e do bem-estar no ambiente de trabalho.
As raízes da demissão silenciosa são complexas e entrelaçadas, resultado de uma intricada teia de fatores que se inter-relacionam. Um dos mais emblemáticos deles é o papel da liderança.
A liderança, nesse contexto, transcende a mera gestão de tarefas e metas ou até mesmo o papel de ser um energizador e alinhador. Ela exige uma mudança de mentalidade total, onde o líder adaptativo se torna um maestro da motivação, orquestrando com destreza as emoções e os vínculos que unem e impulsionam sua equipe.
Veja quais são as competências que o líder deve ter para motivar e engajar os colaboradores:
O líder adaptativo, com sua capacidade de se moldar às circunstâncias e inspirar sua equipe, é a chave para desvendar os enigmas da desmotivação e reacender a chama do engajamento. Ao abraçar essa abordagem transformadora, as organizações podem criar um terreno fértil onde a demissão silenciosa não encontre raízes para se proliferar, e onde cada colaborador possa florescer em todo o seu potencial.
Os funcionários desempenham um papel fundamental no fenômeno da demissão silenciosa, sendo ao mesmo tempo vítimas e agentes desse processo. Embora as causas raízes da desmotivação e desengajamento possam estar enraizadas em diversos fatores organizacionais, o comportamento e as escolhas individuais dos colaboradores também contribuem para a perpetuação desse ciclo.
Por um lado, os funcionários que vivenciam a demissão silenciosa são como navegantes à deriva, perdidos em um mar de descontentamento e falta de propósito. Eles se sentem desvalorizados, desmotivados e desconectados do seu trabalho, o que se reflete em uma queda gradual de produtividade, criatividade e envolvimento nas atividades diárias. No entanto, é importante ressaltar que os funcionários não são meramente vítimas passivas desse processo. Eles também têm a capacidade de agir e influenciar seu próprio engajamento e satisfação no trabalho. Ao adotar uma postura proativa, os colaboradores podem buscar maneiras de se reconectar com seu propósito, desenvolver novas habilidades, construir relacionamentos positivos com colegas e líderes, e comunicar abertamente suas necessidades e preocupações.
Além disso, os funcionários têm a responsabilidade de contribuir para a criação de um ambiente de trabalho saudável e colaborativo. Isso inclui tratar os colegas com respeito, oferecer suporte e feedback construtivo; e engajar-se ativamente em iniciativas que promovam o bem-estar e o crescimento da equipe como um todo.
Em última análise, a superação da demissão silenciosa requer um esforço conjunto entre líderes e funcionários. Os líderes devem assumir a responsabilidade de criar um ambiente propício ao engajamento e ao crescimento, transformando-se em verdadeiros maestros da motivação, capazes de orquestrar as emoções e os vínculos que unem e impulsionam suas equipes. Ao mesmo tempo, os funcionários têm o poder de fazer escolhas conscientes e tomar medidas proativas para cultivar sua própria satisfação e realização no trabalho, reconectando-se com seu propósito, desenvolvendo novas habilidades e construindo relacionamentos positivos.
A demissão silenciosa não é um problema a ser ignorado, mas sim um chamado à ação. À medida que o mundo do trabalho continua a evoluir, as organizações que priorizarem o engajamento, o bem-estar e o crescimento de seus funcionários estarão mais bem posicionadas para enfrentar os desafios futuros e prosperar em um mercado cada vez mais competitivo.
Somente através dessa parceria e compromisso mútuo entre líderes e funcionários é que as organizações podem criar um lugar onde a demissão silenciosa não encontre terreno fértil para prosperar, e onde cada indivíduo possa alcançar seu pleno potencial, contribuindo para o sucesso sustentável da empresa e encontrando realização pessoal em sua jornada profissional.