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Burnon ou burnout? Qual dessas doenças está sendo gerada pelo seu trabalho?

Diferente do burnout, quem tem burnon não consegue se afastar do trabalho; veja os riscos e as formas de tratamento

Objetivos difíceis de serem alcançados impostos por superiores, competividade com os demais colegas e horas intermináveis de trabalho podem causar a Síndrome de Burnon  (Daniel de la Hoz/Getty Images)

Objetivos difíceis de serem alcançados impostos por superiores, competividade com os demais colegas e horas intermináveis de trabalho podem causar a Síndrome de Burnon (Daniel de la Hoz/Getty Images)

Publicado em 28 de abril de 2024 às 12h47.

Última atualização em 1 de maio de 2024 às 01h34.

No dia 28 de abril é celebrado o Dia Mundial da Segurança e Saúde do Trabalho. A data foi instituída em 2003 pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) em memória às vítimas de um acidente que matou 78 funcionários de uma mina no estado da Virginia, EUA, em 1969, e para lembrar sobre as doenças relacionadas ao trabalho.

No ano passado, o governo brasileiro atualizou a lista de doenças incluindo 165 novas patologias, como abuso de drogas e transtornos mentais como o burnout (conhecido como Síndrome do Esgotamento Profissional). "“Essa lista do Ministério da Saúde tem como finalidade orientar o SUS, por exemplo, a ter melhores diagnósticos e tratamentos terapêuticos", afirma Marcelo Mascaro, advogado trabalhista.

A lista foi atualizada pouco tempo depois da pandemia da Covid-19 trouxe à tona doenças mentais como ansiedade, depressão e o próprio burnout, mas outra apareceu recentemente: o burnon – conhecido como paixão excessiva pelo trabalho.  

Qual é a diferença entre burnout e burnon?

Apesar dos nomes serem semelhantes, a psicóloga clínica Cristina Cogo explica que enquanto o Burnout afasta do trabalho, no Burnon a pessoa continua trabalhando.

“A Síndrome de Burnout se desenvolve quando a pessoa está exposta às cargas excessivas de trabalho e condições de muita pressão, o que chamamos de Síndrome do Esgotamento Profissional”, diz. “É mais evidente, a pessoa percebe a exaustão e precisa se afastar do trabalho.”

Já a Síndrome de Burnon confunde “paixão pelo trabalho”, segundo a psicóloga, que reforça que a pessoa sofre pela busca da excelência e por ter a sensação de nunca fazer o suficiente. “A pessoa acredita que é uma fraude intelectual, mesmo atingindo altos resultados. Não consegue encontrar prazer fora do ambiente de trabalho, porque se dedica até o ponto de exaustão para atingir sua própria meta ou a imposta pela empresa.”

Pelo sofrimento emocional ser mais ocultado, Cogo afirma que aparentemente a pessoa está sempre satisfeita em sua ocupação (sublimação) e pouco percebe os prejuízos com sua saúde mental.

Qual é a origem do burnon?

O conceito de "burn-on" como um fenômeno distinto do burnout é relativamente recente na literatura científica e no discurso sobre saúde mental no trabalho. Diferentemente do burnout, que tem sido amplamente estudado e discutido desde a década de 1970, o burn-on ainda é um termo menos estabelecido e pesquisado, afirma Joaquim Santini, pesquisador internacional de comportamento, com passagem por universidades como Harvard, nos EUA, e INSEAD, na França.

“O termo "burnon" foi definido pelo Dr. Bert te Wildt, psicoterapeuta alemão, e seu colega, o psiquiatra Timo Schiele, em seu livro intitulado "Burn-on: Always on the Brink of Burnout" (Burn-on: Sempre à Beira do Burnout)”, diz o pesquisador.

Por meio de suas pesquisas e experiências clínicas, eles identificaram e caracterizaram o fenômeno do burnon como uma condição em que os indivíduos estão constantemente à beira da exaustão e do colapso, mas continuam a trabalhar e a manter uma aparência de produtividade e sucesso, mesmo que estejam enfrentando uma forma mascarada de depressão.

O Dr. Bert te Wildt tem sido uma voz ativa na discussão sobre o burn-on, compartilhando suas percepções e conhecimentos sobre o assunto em entrevistas, como a concedida ao South Morning China Post, onde ele destaca a natureza traiçoeira e muitas vezes negligenciada desse fenômeno no ambiente de trabalho contemporâneo, afirma o pesquisador.

“Nessa entrevista ele diz que o burnon também pode ser descrito como uma depressão mascarada. Ele explica que os pacientes estão sempre à beira de um colapso, mas continuam e cultivam, por trás de um sorriso, um tipo diferente de exaustão e depressão".”

O burnon pode levar ao burnout, porque aqueles que sofrem com essa condição tendem a subestimar sua fadiga e fragilidade emocional, ou atribuí-las a fatores não relacionados ao trabalho. No entanto, Santini afirma que nem sempre o burnon evolui para o burnout, já que algumas pessoas podem conviver com o problema por anos sem que isso as impeça de comparecer ao trabalho diariamente. “Esse fato contribui para a falta de compreensão do fenômeno tanto pelas autoridades públicas quanto pelas empresas”, diz.

“Aqueles que sofrem de "burn on" continuam a se dedicar intensamente ao trabalho, muitas vezes até o ponto de exaustão. No entanto, ao contrário do burnout, esse comportamento é frequentemente elogiado e recompensado no ambiente corporativo, dando a falsa impressão de que o indivíduo está se destacando em suas funções”, afirma Santini.

O que está causando burnon nas pessoas hoje?

No contexto contemporâneo, a psicóloga afirma que os sinais desta paixão pelo trabalho levam a uma busca incessante pelo sucesso e pela realização profissional.

“Objetivos difíceis de serem alcançados impostos por superiores, competividade com os demais colegas, horas intermináveis de trabalho, informações sem fim por causa da internet, tudo isso gera dificuldade de aproveitar o tempo livre e podem levar a uma obsessão sem limites, uma vez que não consegue se desconectar do trabalho”, diz Cogo que reforça que se trata de uma síndrome silenciosa.

Quais são os sinais sutis do Burnon?

Os sinais sutis do "burn on" podem ser facilmente confundidos com dedicação e comprometimento com o trabalho, o que torna esse fenômeno ainda mais perigoso. Aqui estão alguns sinais aos quais as pessoas devem estar atentas:

  1. Workaholismo: A pessoa se torna obcecada pelo trabalho, dedicando horas extras excessivas e tendo dificuldade em se desligar, mesmo durante o tempo livre.
  2. Negligência do autocuidado: O indivíduo começa a negligenciar suas necessidades básicas, como alimentação adequada, exercícios físicos e sono suficiente, em favor do trabalho.
  3. Isolamento social: As relações pessoais e sociais são colocadas em segundo plano, pois a pessoa se concentra quase exclusivamente em suas responsabilidades profissionais.
  4. Irritabilidade e impaciência: O estresse constante pode levar a mudanças de humor, tornando a pessoa mais irritável e menos tolerante com os outros.
  5. Perda de motivação: Apesar de continuar trabalhando arduamente, o indivíduo pode sentir uma diminuição da satisfação e do prazer em suas atividades profissionais.
  6. Problemas de saúde: Sintomas físicos, como dores de cabeça frequentes, problemas gastrointestinais e fadiga crônica, podem ser indicativos de um desequilíbrio causado pelo excesso de trabalho.
  7. Culpa e ansiedade: A pessoa pode se sentir culpada por tirar um tempo para si mesma ou experimentar ansiedade constante em relação às demandas do trabalho.
  8. Perda de criatividade: A exaustão mental pode levar a uma diminuição da criatividade e da capacidade de resolver problemas de forma inovadora.
  9. Dificuldade em dizer não: O indivíduo pode ter problemas em estabelecer limites saudáveis e recusar demandas adicionais, temendo decepcionar os outros ou prejudicar sua imagem profissional.
  10. Falta de tempo para hobbies e interesses pessoais: As atividades que antes traziam prazer e equilíbrio são abandonadas em favor do trabalho.

Santini reforça que esses sinais podem se manifestar de forma gradual e sutil, tornando-os difíceis de reconhecer.

“Se você ou alguém que você conhece está experimentando vários desses sintomas, é crucial buscar ajuda e fazer mudanças para promover um equilíbrio mais saudável entre o trabalho e a vida pessoal. Lembre-se de que o autocuidado e o bem-estar devem ser prioridades, porque são essenciais para o sucesso e a satisfação a longo prazo, tanto na esfera profissional quanto no pessoal.”

Quais são os riscos do burnon para a saúde?

Quando o trabalho começa a se tornar o centro da vida da pessoa, ao longo do tempo problemas podem surgir, afirma Cogo, como episódios de ansiedade, graves estados depressivos, esgotamento físico e mental, pânico e estresse.

“Geralmente, o medo de ser percebido com menos comprometimento, impede a busca pela ajuda profissional, deixando as consequências de a saúde mental evoluírem silenciosamente.”

Entre as profissões que são mais suscetíveis a desenvolver a Síndrome de Bunon, isto devido ao excesso de trabalho vinculado à pressão, a psicóloga cita como exemplo advogados, psicólogos, médicos, enfermeiros, jornalistas, bancários, policiais, professores, oficiais de justiça, atendentes de telemarketing e demais profissionais que exercem longas jornadas de trabalho.

Como tratar o burnon e o burnout?

Reconhecer as diferenças entre burn-on e burnout é essencial para abordar essas questões de forma adequada, afirma Santini. Enquanto o burnout requer intervenções para aliviar a exaustão e recuperar o equilíbrio, o burn-on demanda uma mudança de mentalidade e a adoção de estratégias para estabelecer limites saudáveis e priorizar o autocuidado.

“Em ambos os casos, é fundamental criar um ambiente de trabalho que valorize a saúde mental e o bem-estar dos funcionários, promovendo uma cultura de respeito, apoio e equilíbrio. Somente assim será possível prevenir e superar os desafios impostos tanto pelo burn-on quanto pelo burnout”, diz o pesquisador.

A cultura do autocuidado também é uma diretriz ao tratamento da Síndrome de Burnon, afirma Cogo. “O descanso do trabalho é muito importante para a saúde mental, ou seja, é preciso ter equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, já que é comum a pessoa negligenciar as necessidades pessoais e sociais.”

Além do equilíbrio, a psicóloga reforça que terapias, atividades de lazer como um esporte ou uma arte, encontro com amigos, férias e até yoga pode ajudar o funcionário a cuidar da saúde física e mental.

Outro ponto que Cogo traz é a necessidade de ver essas doenças com um olhar ocupacional, ou seja, mais ligada à gestão de trabalho do que a aspectos individuais.

“Se a pessoa está apaixonada pelo trabalho, tudo fica muito intenso, desde a entrega dos resultados ao tempo dedicado. Assim, percebe-se que o tratamento de ambas as doenças se inicia em respeitar os limites de si mesmo. É preciso cuidar de si mesmo para que não ultrapasse a linha do que é saudável.”

No nível organizacional, Santini reforça que é crucial que as empresas promovam uma cultura de bem-estar e equilíbrio. Isso pode envolver a implementação de políticas de horário flexível, o incentivo a pausas regulares durante o dia de trabalho, a oferta de programas de gerenciamento de estresse e a promoção de um ambiente de trabalho positivo e colaborativo. “Os líderes têm um papel fundamental em modelar comportamentos saudáveis, comunicar expectativas realistas e oferecer suporte e recursos adequados aos funcionários”, diz.

“Além disso, é importante que as organizações invistam em treinamentos e desenvolvimento de habilidades para ajudar os funcionários a lidar com o estresse e a construir resiliência. Programas de mentoria, coaching e aconselhamento podem ser valiosos para fornecer orientação e suporte individualizados.”

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