Resultado das eleições fortalece pautas de centro no Congresso
Especialistas avaliam que devem perder força discursos ideológicos e ganhar espaço matérias com viés social e econômico, com protagonismo dos parlamentares
Alessandra Azevedo
Publicado em 29 de novembro de 2020 às 22h40.
Última atualização em 29 de novembro de 2020 às 22h51.
O balanço das eleições municipais reflete diretamente nas movimentações em Brasília, onde todos estão de olho nos sinais enviados pelos municípios. Com resultado que aponta para rumos bem mais moderados do que nas eleições nacionais de 2018, devem perder força discursos ideológicos e ganhar espaço matérias com viés social e econômico, com ainda mais protagonismo dos parlamentares, especialmente de centro, avaliam especialistas.
O foco agora é 2022, e as eleições municipais foram a prévia da disputa. O Congresso, que será renovado daqui a dois anos, presta atenção em cada detalhe das narrativas que vencem nos municípios. “Toda eleição é uma redistribuição de cartas do jogo político”, diz o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia (Cebrad) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).
O sinal mais claro, desta vez, é o de enfraquecimento da onda bolsonarista. Quase todos os candidatos a prefeitos defendidos abertamente pelo presidente Jair Bolsonaro perderam a disputa. "É um contingente importante de votos que podem ser contabilizados pra 2022 e optaram por uma agenda diferente da do presidente. O apoio de prefeitos dessas cidades pode fazer diferença nas próximas eleições. Sem contar o aspecto simbólico, da esquerda no segundo turno", ressalta Monteiro.
Para o cientista político da UERJ, o resultado das eleições municipais mostra que, na batalha de narrativas, a que está prevalecendo é a mais moderada. “Ninguém vai olhar para 2022 da forma que foi em 2018. Há grandes chances de voltarmos ao velho paradigma: centro-esquerda versus centro-direita”, acredita. Agora, o país parece retornar a um rumo mais de centro, menos radical, o que certamente terá impacto nas prioridades em Brasília.
A percepção de uma preferência pelo centro vale para as eleições de 2022 e para a atuação parlamentar.“Fica evidente que a ‘nova política’ do Bolsonaro perdeu fôlego. O eleitor não está satisfeito com os resultados práticos do que tem sido aplicado pelo governo federal”, avalia o cientista político AndréCésar, da Hold Assessoria. Os grandes vencedores das eleições de 2020 são os partidos de centro, que também crescem na política nacional e na influência no Congresso.
O destaque é para o bom desempenho do DEM, do PSDB e do MDB. O que mais conquistou prefeituras nas capitais foi o MDB, com cinco. DEM e PSDB aparecem logo atrás, com quatro prefeitos cada um. O DEM, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem ainda o mérito de ter sido o partido que mais cresceu proporcionalmente: elegeu 71% a mais de prefeitos, contando com todos os municípios, na comparação com as eleições anteriores.
Agenda moderada
O resultado também influencia nas eleições para a presidência da Câmara e do Senado, em fevereiro de 2021. Os atuais presidentes, Maia e Davi Alcolumbre (DEM-AP), no Senado, saem fortalecidos para tentar emplacar possíveis sucessores.Para os parlamentares, o recado é que o eleitor cansou de discursos inflamados, diz César. “O interesse agora não é em agenda de costumes, casamento gay, aborto”, observa. Em meio a uma crise sanitária e econômica, a preocupação é com emprego, renda e saúde pública.
Esses devem ser assuntos de destaque na volta dos trabalhos no Congresso, a partir desta semana, com o fim do período eleitoral. As pautas que serão tocadas têm, naturalmente, influência das campanhas nos municípios. Para César, com o enfraquecimento de Bolsonaro, o C ongresso tende a assumir protagonismo, como ja fez antes, e escolher matérias de impacto para a sociedade. "A reforma tributária é uma delas. Algo referente à pandemia também deve avançar", acredita.
"Certamente o Congresso está estimulado agora a fazer isso, a partir do Rodrigo Maia, que vai ser, como na reforma da Previdência, o condutor desse processo", diz César. Questões de desigualdade social, muito levantadas nas campanhas municipais, também voltam à tona, à medida em que pautas radicais caem. "O Congresso é uma caixa de ressonância. É inevitável que a insatisfação com a desigualdade e com aumento da pobreza e da miséria chegue aos parlamentares", diz o especialista.
O resultado também coloca em dúvida a capacidade do presidente Jair Bolsonaro de deslanchar na tentativa de reeleição em 2022. "O primeiro turno já mostrou que Bolsonaro sofreu uma derrota e não era campeão de votos, muito menos capaz de transferir votos para construir uma base forte", diz o cientista político Carlos Melo, do Insper. No Congresso, ele fica ainda mais dependente do Centrão para aprovar qualquer matéria. No Planalto, a eleição de nomes moderados acendeu um alerta: é preciso resolver as questões internas e passar a buscar apoio político.