Em áudio, Joesley diz que procurador tentava influenciar Janot
Segundo o documento, o áudio gravado da conversa teria ocorrido no dia 17 de março e citava Miller, que "estaria auxiliando os interlocutores"
Reuters
Publicado em 4 de setembro de 2017 às 22h29.
Última atualização em 4 de setembro de 2017 às 22h31.
Brasília - O dono da JBS , Joesley Batista, e o diretor do grupo Ricardo Saud conversaram sobre "supostos ilícitos" envolvendo o então procurador da República Marcelo Miller que teria tentado influenciar o procurador-geral da República, Rodrigo Janot , na então futura negociação da delação premiada dos executivos da empresa, conforme despacho de Janot determinando nesta segunda-feira a revisão do acordo de colaboração por omissão de fatos.
Segundo o documento, o áudio gravado da conversa teria ocorrido no dia 17 de março e citava Miller, que "estaria auxiliando os interlocutores, inclusive a pretexto de influenciar a decisão do Procurador-Geral da República, em futura negociação de acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal".
O chefe do Ministério Público Federal afirmou que, naquela data, nenhum dos dois colaboradores haviam buscado ainda "direta ou indiretamente" tratativas com a Procuradoria-Geral da República para iniciar a negociação do acordo penal. Ele destacou que as tratativas só ocorrem 10 dias depois.
No áudio, segundo o relato feito por Janot, Ricardo Saud afirma que estaria "ajeitando" a situação do grupo J&F --holding da qual a JBS faz parte-- com Marcelo Miller. Saud disse ainda que Miller estaria "afinado" com eles.
Em determinado momento da gravação, os interlocutores do áudio dizem que, com a deflagração da operação Carne Fraca naquele dia, Miller teria enviado extensa mensagem expressa para o diretor jurídico do grupo, Francisco de Assis e Silva, tentando justificar a situação.
Ao instaurar o Procedimento de Revisão de Acordos de Colaboração, Janot pediu a revisão dos benefícios de três dos sete delatores do grupo: Joesley, Saud e Assis. Todos os colaboradores do grupo receberam a imunidade penal.
Esse áudio foi entregue num pacote de novos documentos apresentados pela J&F na quinta-feira, antes da prorrogação por mais 60 dias para que o grupo complemente informações da colaboração.
A conversa, classificada por Janot em fala à imprensa nesta segunda-feira de "gravíssima" e "exótica" foi encontrada por uma procuradora que atua em seu gabinete no domingo --quando a equipe fazia a revisão da nova papelada-- em meio ao anexo da delação que citava o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI).
Conforme relato de Janot, depreende-se do áudio que os interlocutores depositavam esperança de que, por intermédio da pessoa de Marcelo Miller, pudessem obter facilidades junto ao procurador-geral da República. Eles sugeriam a Miller uma futura sociedade em escritório de advocacia, em troca do processo de celebração dos acordos de colaboração premiada.
Janot menciona que Miller pediu no dia 5 de abril exoneração do cargo de procurador da República. Antes disso, ele figurava na carreira como auxiliar eventual do grupo da força-tarefa da Lava Jato que auxiliava o procurador-geral da República e outros que integravam essa equipe sob demanda.
Naquele mesmo mês, Miller, já advogado, apresentou-se no MPF como sócio do escritório Trench, Rossi e Watanabe, contratado do grupo J&F para negociação do acordo de leniência no âmbito cível.
"Essa sucessão de datas é importante porque sugere a participação de então membro do Ministério Público Federal em atividade supostamente criminosa e/ou improbidade administrativa", afirma Janot, no documento.
O procurador-geral cita ainda que Saud só apresentou no dia 31 de agosto --prazo inicial limite para complementação das informações da delação-- informação de que tinha uma conta no exterior (no Paraguai). Esse fato, destacou, foi omitido quando a delação da J&F foi assinada, no dia 3 de maio.
Janot comunicou sua decisão ao ministro Edson Fachin, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF). O procurador-geral disse que caberá a Fachin decidir se dá publicidade ao áudio --que tem quatro horas-- porque a gravação revela "supostos crimes" e revela "diálogos de intimidade de terceiros".
O chefe do MPF pede que os três colaboradores compareçam até sexta-feira à Procuradoria-Geral da República para prestar esclarecimentos dos fatos divulgados e cobra a apresentação do aparelho no qual foi feita a gravação. No mesmo período, ele requer também o depoimento de Marcelo Miller.
Janot também pede informações do escritório de advocacia em que Miller foi atuar para saber os motivos do desligamento dele e de outra advogada Esther Miriam Flesch --recentemente eles deixaram a sociedade. E pede cópia, em cinco dias, de procedimento de apuração dos escritório referente aos dois advogados.