Revista Exame

Uma conversa sobre risco

Não é possível causar impacto sem assumir riscos, então é preciso gerenciá-los. Para isso, cultura e alinhamento fazem muita diferença

Paper Craft Multi-colored Scatter Plot Chart on Beige Background Directly above View. (MirageC/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 18 de agosto de 2022 às 06h00.

Última atualização em 18 de agosto de 2022 às 09h37.

Imagine a situação. Eu te convido para uma reunião e te apresento uma ideia de negócio revolucionária, capaz de transformar para sempre um mercado. Em seguida, eu te ofereço a posição de CEO dessa nova empresa. O lado negativo da proposta é que o negócio tem apenas 5% de chance de dar certo. O que você faz? Você aceita o cargo de CEO?

Essa história aconteceu de verdade. Eu não estava lá, claro, mas o candidato em questão aceitou a oferta. Foi assim que Stéphane Bancel, um empresário francês, assumiu como o primeiro CEO da Moderna, uma empresa americana que estuda e fabrica medicamentos com base na tecnologia de RNA mensageiro e que teve papel importante na luta contra a covid-19. A Moderna produziu uma das vacinas aplicadas contra a covid nos Estados Unidos.

Bancel contou essa história no podcast Masters of Scale (“Mestres da escala”, numa tradução livre), apresentado por Reid Hoffman, cofundador do LinkedIn. Em quase 2 horas de programa, os dois falam sobre riscos e redes de contatos, dois temas de interesse para qualquer empreendedor. Ouvindo a conversa, foi inevitável pensar nos riscos que já tomei e no que eu faria se estivesse no lugar do empresário francês.

Em 2022 é fácil afirmar que o risco assumido por Bancel valeu a pena. Mas em 2010, quando a história se passou, ninguém poderia prever que a Moderna conseguiria descobrir novas maneiras de utilizar a tecnologia de RNA mensageiro, que viveríamos uma pandemia e que a empresa seria capaz de criar uma vacina eficaz contra o vírus da covid-19.

O primeiro (e único até o momento) CEO da Moderna tinha em mãos um moonshot — um projeto com poucas chances de sucesso, mas com potencial para transformar um mercado se bem-sucedido —, e a parte que mais me marcou dessa história é que, para alcançar seus objetivos, Bancel investiu na criação de uma cultura empresarial forte. Cultura essa que abraça o risco, mas que se posiciona sobre bases sólidas. Parece contraditório, eu sei, mas o racional aqui é que não é possível causar impacto sem assumir riscos, então é preciso gerenciá-los.

O fundador e/ou CEO de uma empresa assume riscos todos os dias. Quando diz “sim” e quando diz “não”. Não é fácil encontrar o equilíbrio entre o freio e o acelerador, e não é possível evitar todos os riscos. A saída, é consenso, passa por analisar claramente cada nova decisão e construir uma estratégia ao redor dela. Como empreendedor e como investidor, concordo com Bancel quando ele diz que um dos maiores desafios enfrentados por quem comanda uma startup, em especial alguém que tenha em mãos um moonshot, é fazer previsões corretas.

Como líder, frequentemente o CEO faz uma aposta de como uma situação vai se desenvolver. Mas o trabalho não para por aí. É preciso fazer com que o time “compre” a sua aposta. Sócios, colaboradores, todos precisam conhecer, entender e comprar a visão de futuro. Essa é a única forma de fazer a mágica acontecer e aumentar as chances de sucesso.

É nesse ponto que alinhamento e cultura — sim, ela outra vez — fazem a diferença. Se o time não está trabalhando com o mesmo objetivo, se não tem a mesma mentalidade sobre risco, se não vibra com um erro que trouxe um aprendizado importante, dificilmente o CEO sozinho conseguirá navegar na direção de sua visão de futuro.

Na Loft, temos uma ferramenta importante de alinhamento que se chama rooftop. É uma reunião das lideranças com todo o time na qual compartilhamos o nosso direcional para cada trimestre, acompanhamos as nossas metas e apresentamos projetos em andamento nas mais diferentes áreas. Ao fim, abrimos um espaço para perguntas e respostas, e qualquer colaborador pode enviar dúvidas. Digo enviar dúvidas porque, desde 2020, esse encontro, que era presencial, se tornou virtual.

Em diferentes momentos da nossa trajetória, esse compromisso com o time, de dividir com todos a nossa visão, foi fundamental para que alcançássemos as nossas metas. Se alguma equipe, por qualquer motivo, estivesse trabalhando para um objetivo diferente, o rooftop nos ajudava a realinhar as prioridades. Não é pouco.

Se você está na outra ponta dessa relação e é um investidor, as perguntas que você deveria estar se fazendo sobre esse tema são: “Estou tomando risco suficiente?”; “Estou pronto para tomar riscos?”. Se o seu foco está em empresas em estágio inicial, que buscam investimento seed, a ideia deveria ser tomar muito risco.

Na Canary (fundo de investimento em startups do qual sou sócio), quando a gente tomou a decisão de investir na Buser, a apresentação da empresa era um ­PowerPoint que pedia meio milhão de dólares. Algumas pessoas acharam um erro a gente fazer esse cheque, mas eu acho que é exatamente esse tipo de risco que um fundo seed tem de tomar. Os fatos mostraram que estávamos certos, inclusive nesse caso.

Na minha opinião, não há meio-termo quando se investe em startups. Ou o empreendedor tem sucesso e o investidor ganha junto, ou nenhum dos dois ganha. O fracasso faz parte do jogo e o sucesso depende, em parte, dos riscos que assumimos.

 

(Arte/Exame)


 

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