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Quantos likes merece seu médico?

A pandemia acelerou uma tendência que promete mudar nossa relação com os profissionais da saúde: entramos na era dos médicos influenciadores

 (Germano Lüders/Exame)

(Germano Lüders/Exame)

A cada informação falsa, desencontrada ou distorcida de autoridades sobre o coronavírus, pode apostar: médicos estarão em suas mídias sociais acalmando os ânimos e apresentando explicações embasadas na ciência. A atual pandemia de covid-19 acelerou uma tendência: a de profissionais de saúde compartilhando conhecimento nas redes como influenciadores digitais. “Em nossa base de dados temos mais de 400.000 influenciadores. Desses, mais de 5.000 são médicos”, diz Rodrigo Azevedo, CEO da Influency.me, plataforma de marketing de influência. Para alguns, essa era uma lacuna. Personalidades da internet, blogueiras e musas fitness angariaram seguidores por anos disseminando por sua conta informações — e desinformações — de saúde. Agora profissionais mais qualificados e com talento para a nova narrativa estão ocupando esses espaços.

Alguns médicos já trafegavam pelas redes havia algum tempo. É o caso da ginecologista Cidinha Ikegiri, a @cidinha. Seus mais de 26.000 seguidores no Instagram são disseminadores orgânicos de seu trabalho. O feed de sua conta, por sinal, é uma extensão de seu consultório. Em vídeos, animações e clipes com pop art ao fundo, ela aborda temas como masturbação, menstruação, métodos contraceptivos, body positivity e coronavírus. Muitas vezes está de tênis Converse, paetês e delineador nos olhos, num consultório para lá de moderno. “A imagem do médico inatingível ainda existe e esse é um meio muito preconceituoso, é difícil ser diferente. Acredito que minha maneira mais informal acabe criando uma conexão com minhas pacientes. Elas entendem o que eu falo e se identificam com meu jeito. A comunicação com o paciente deve ser mais horizontal, e as redes sociais são um ótimo espaço para isso”, diz.

Os médicos influenciadores preocupam-se não apenas com o conteúdo da informação mas também com a forma. Assim como a ginecologista Cidinha, a fisioterapeuta especializada em assoalho pélvico Laura Della Negra (@assoalhopelvico) tem uma ilustradora para fazer as imagens de seus posts. “Também tenho a ajuda de uma jornalista com os textos. É comum os médicos falarem uma língua própria, e isso acaba atrapalhando a comunicação”, explica. Entre os quase 52.000 seguidores de seu Instagram, Della Negra percebeu que as maiores taxas de engajamento vêm dos posts com dicas práticas, mensagens positivas e bem-humoradas.

Lucas Liedke (@psicanaliedke): temas sobre saúde mental debatidos com bom humor (Germano Lüders/Exame)

Contrariando expectativas, foi exatamente com o bom humor que o psicanalista Lucas Liedke (@psicanaliedke) conquistou mais de 27.000 seguidores. Dá para falar de solidão fazendo piada? Dá. E de controle emocional usando memes? Com certeza. “Ainda existe muito tabu em torno dos temas relacionados à saúde mental. Para quebrar esses estigmas, nós, profissionais de saúde, precisamos aumentar nosso repertório, falar sobre esses temas de maneira simples, com uma estética interessante e uma linguagem engraçada. Para mim, o meme surgiu como uma ferramenta capaz de ajudar as pessoas a desmistificar assuntos difíceis de falar”, explica Liedke.

Narrativas sérias e delicadas também têm espaço nessa nova onda conectada da medicina. A nutricionista Fernanda Iamamura (@nutrifernandaiamamura) viralizou nas redes sociais com um post que carregava a seguinte frase: “Não se destrói o patriarcado com fome”. Com mais de 28.000 seguidores, Iamamura compartilha em suas redes mensagens pouco comuns entre outros profissionais de sua categoria. Por exemplo: “Não existe dieta no mundo que te conheça melhor do que você mesma”. Ou: “O tamanho do seu corpo não define sua competência profissional, seu sucesso ou sua felicidade”.

Se antes escolher um médico novo era uma loteria ou uma peregrinação de pedidos de indicação, com as redes sociais ficou mais fácil encontrar um profissional de saúde que compartilhe de suas crenças e valores. Para quem considera pouco sério o médico com destaque nas redes sociais, Rodrigo Azevedo, CEO da Influency.me, lembra que médicos irresponsáveis sempre encontraram terreno fértil para se autopromover. A nutricionista Iamamura lembra que a internet sempre esteve cheia de pessoas falando sobre saúde sem necessariamente estarem pautadas por parâmetros éticos. “Por que não deveria ser nosso papel, como profissionais da saúde, estar nesse lugar, divulgando informação de qualidade?” Quantos likes merece seu médico?

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