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Canteiro de oportunidades

Seis estratégias de pequenas e médias empresas que conseguiram aproveitar a expansão do setor imobiliário para crescer

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 17 de outubro de 2010 às 10h49.

Estar num setor aquecido, quando há oportunidades por toda parte, é uma forma eficaz de uma pequena ou média empresa com um modelo promissor de negócios pegar carona para crescer mais depressa. Um dos pedaços da economia brasileira que mais esquentaram nos últimos tempos é o da construção civil. Após quase duas décadas de muitas dificuldades, os empreendedores do setor viram as principais variáveis que afetam a temperatura de seus negócios mudar para melhor — o poder de compra dos brasileiros aumentou, a concessão de crédito para aquisição da casa própria cresceu e grandes empresas desse mercado que abriram o capital conseguiram mais de 13 bilhões de reais para investimentos apenas em 2007. Segundo as projeções, o setor vai crescer mais de 10% neste ano. “Imagine o poder gerador de negócios desse mercado”, diz Hugo Marques da Rosa, presidente da Método Engenharia, grande construtora de São Paulo. “Está havendo um efeito em cascata, que afeta positivamente fornecedores de materiais e serviços que fazem parte da cadeia produtiva.”
O aquecimento aumentou sobretudo a procura por pequenas e médias empresas que fornecem produtos e serviços ligados a demandas novas. É o caso, por exemplo, de tudo o que se destina ao público de baixa renda, que satisfaça o desejo de personalização dos usuários e que reforce a segurança pessoal e patrimonial. E, como não se pode perder tempo nem dinheiro com desperdício de recursos, cresceu a necessidade de encontrar mão-de-obra qualificada e fornecedores flexíveis e confiáveis do ponto de vista da sustentabilidade. Muitas pequenas e médias empresas estavam preparadas para atender a essas novas exigências. É o caso das seis empresas desta reportagem.
 

1. Todo mundo para a escola
A Doutores da Construção dá aulas para qualificar a mão-de-obra
A expansão tornou ainda mais evidentes alguns problemas que já faziam parte do cotidiano da construção civil. Talvez o mais sério deles seja a falta de mão-de-obra qualificada. Segundo pesquisa da Organização Internacional do Trabalho, 80% dos trabalhadores do setor no Brasil possuem menos de quatro anos de estudo e 72% nunca fizeram cursos ou treinamentos. Na época da estagnação, os bons profissionais existentes bastavam para colocar em pé os novos empreendimentos. Com o reaquecimento do setor, a mão-de-obra ficou escassa. Para as construtoras, essa é uma dor de cabeça enorme. Para a Doutores da Construção, de São Paulo, esse cenário representou o surgimento de um novo negócio. A Doutores da Construção resulta de cinco empresas e cinco entidades que se uniram, em março de 2007, para formar uma companhia especializada em treinamento de mão-de-obra. “O crescimento evidenciou o péssimo estado da capacitação desses profissionais”, diz o engenheiro Juan Agudo, de 42 anos, diretor da Doutores da Construção. “Enxergamos ali uma oportunidade.” A empresa faz parcerias com lojas de material de construção de todo o Brasil para dar treinamento aos profissionais de suas regiões. As aulas são transmitidas ao vivo pela TV Doutores numa estrutura montada pelas próprias lojas. Ao final dos cursos, os alunos são submetidos a uma avaliação e, se aprovados, passam a ser indicados pelo site da Doutores da Construção. A iniciativa já conta com quase 100 lojas parceiras e 30 000 profissionais treinados. O objetivo é chegar a 300 lojas até o final de 2008 e treinar 1 milhão de pessoas durante os próximos quatro anos. O novo negócio fatura o equivalente a 1,2 milhão de reais por ano. “Temos potencial para triplicar as receitas em um ano”, diz Agudo.
 

Juan Agudo, Doutores da Construção, São Paulo, SP
O que faz - Capacitação de profissionais
Oportunidade - Treinar mão-de-obra num setor em que falta qualificação 


2. Querida, e a churrasqueira?
A Digital Light dá vida à imaginação do cliente
Adequar as características de um produto às preferências de cada consumidor é uma necessidade presente em todos os setores. A produção em grande escala possibilitou a redução de custos, mas encerrou a era de fabricação artesanal, quando o cliente tinha acesso a algo único. Hoje, o desafio das empresas é conseguir diferenciar seus produtos sem perder os benefícios da produção em larga escala. Com o crescimento do setor de construção civil, o comportamento dos consumidores deixou essa necessidade ainda mais clara. “As construtoras precisavam de mais rapidez para simular as alterações pedidas pelos clientes ainda durante o projeto”, diz Michel Nunes de Oliveira, de 29 anos, sócio da Digital Light, empresa de 5,2 milhões de reais de faturamento anual que faz maquetes virtuais desde 2000. “Eles eliminam um dormitório para aumentar a sala, trocam o acabamento do piso e acrescentam pontos de eletricidade novos em razão dos equipamentos que pretendem colocar nos ambientes.” Para automatizar a personalização dos imóveis, a empresa desenvolveu um software que possibilita fazer alterações na planta e visualizar as mudanças no mesmo momento em que o cliente as sugere. O resultado aparece em três dimensões num holograma que simula a realidade virtual. “Antes, as adaptações eram feitas em várias etapas e algumas construtoras levavam até dois meses para mostrar a nova planta para o cliente”, diz Oliveira. Em muitos casos, quando tudo ficava pronto, o consumidor já tinha mudado de idéia e era preciso incluir mais alterações. “Agora, tudo é feito de uma única vez”, afirma Oliveira. Na lista de clientes da Digital Light estão nomes como Cyrela, Klabin Segall e Gafisa. A boa aceitação do novo produto ajudou Oliveira a ampliar o raio de atuação da Digital Light. No ano passado, uma unidade foi inaugurada em Porto Alegre. Agora, ele está acertando os detalhes para abrir as portas em Salvador e considera a possibilidade de atuar em Portugal. Com isso, a Digital Light deve dobrar as receitas em 2008.


Michel Nunes Oliveira, Digital light, São Paulo, SP
O que faz
- Maquetes virtuais
Oportunidade - Desenvolver uma tecnologia para possibilitar a personalização de apartamentos para o cliente final
 


3. Betoneira de aluguel
A Casa do Construtor aluga o que os outros vendem
A aquisição de equipamentos, como compactadores de terreno, betoneiras e ferramentas elétricas, pode representar um custo alto, já que eles não são utilizados durante toda a obra. Isso acontece principalmente com as construtoras menores, que não têm escala para usá-los com freqüência. Os engenheiros civis Altino Cristofoletti Junior, hoje com 47 anos, e Expedito Arena, de 53 anos, eram donos de pequenas construtoras e viviam na pele esse problema. Com o tempo, enxergaram na dificuldade uma oportunidade de negócio. Foi assim que eles criaram, em 1993, a Casa do Construtor, loja dedicada ao aluguel de máquinas e equipamentos de construção sobretudo para outras pequenas e médias empresas. A empresa cresceu e transformou-se numa grande rede de franquias, que passou de três lojas próprias no estado de São Paulo para 40 unidades em sete estados brasileiros. “Com as franquias, foi possível transferir equipamentos entre as lojas e ter um aproveitamento melhor”, diz Cristofoletti. No ano passado, com o setor aquecido, a rede viveu o melhor período desde seu nascimento. O faturamento alcançou 14 milhões de reais — 42% mais do que no ano anterior —, e seis novas unidades foram inauguradas. O plano agora é acelerar a expansão e aproveitar o bom momento. A Casa do Construtor mudou a política de implantação das franquias para crescer mais rápido. Antes, não era permitido instalar duas lojas na mesma cidade para evitar sobreposição de clientes. “Estudamos algumas referências internacionais e vimos que redes parecidas chegam a ter 50 lojas na mesma cidade”, diz Cristofoletti. O teste do novo modelo foi positivo: a abertura de uma segunda loja própria na cidade paulista de Rio Claro em 2007 não alterou o desempenho da primeira unidade, que cresceu 13%. Agora, a estratégia é abrir diversas lojas nos grandes mercados. Até 2010, o objetivo é inaugurar 20 novas unidades em São Paulo e dez no Rio de Janeiro. Até lá, Cristofoletti espera que a rede de franquias atinja a marca das 100 lojas.
 

Altino Cristofoletti Junior, Casa do Construtor, Rio Claro, SP
O que faz -
Aluguel de máquinas
Oportunidade - Oferecer alternativas mais flexíveis para as pequenas e médias construtoras
 


4. Segurança desde o começo
A GR vende serviços antes de o imóvel ficar pronto
Antes mesmo de começar uma obra, grandes construtoras como Rossi e Cyrela costumam recorrer à paulistana GR para uma avaliação sobre a segurança dos edifícios que ainda estão na planta. O trabalho, gratuito, inclui sugestões para aperfeiçoar os projetos. Muitas vezes, os técnicos da GR recomendam mudar a posição das câmeras de segurança, substituir o tipo de iluminação ou reduzir o número de entradas, que exigem mais funcionários e aumentam os custos do condomínio. Quando o prédio fica pronto, a GR implanta o sistema que propôs e, com freqüência, é convidada a assumir a gestão terceirizada de portaria, limpeza e segurança. “Esse tipo de aconselhamento é ótimo para nós”, diz Carmem Lopes, gerente de incorporação da construtora Rossi, de São Paulo. “O pessoal da GR analisa cada detalhe do projeto e aponta soluções para problemas que nem havíamos previsto.”
A estratégia começou a ser aplicada nos anos 90, pouco depois de o empresário Maurice Braunstein, de 34 anos, tornar-se sócio majoritário. Na época, ele concluiu que o futuro da GR estava na oferta de serviços mais completos e não apenas na segurança para condomínios já existentes, como a concorrência fazia. Para colocar em prática a idéia de aperfeiçoar os projetos das construtoras e oferecer os principais serviços para o funcionamento dos edifícios, a GR precisou investir na qualificação da mão-de-obra. Para manter os melhores, há um setor da empresa incumbido de acompanhar os empregados de perto. Os responsáveis por essa área visitam a casa dos novos funcionários, conhecem suas famílias e explicam a elas como funciona a empresa e os benefícios oferecidos.
O bom momento do setor imobiliário esquentou o ritmo de crescimento da GR. “As empresas do setor estão trabalhando a mil”, diz Braunstein. “Elas criam projetos que acabam sendo replicados em várias cidades e precisam adaptá-los à realidade local e às exigências dos compradores por segurança e conforto.” No ano passado, a receita da GR cresceu 30%, chegando a 100 milhões de reais. Em média, são contratados 200 novos funcionários por mês — são eles que depois vão cuidar da segurança, limpeza e portaria dos condomínios. No final do ano passado, a GR contava com 600 clientes, 100 a mais em relação a 2006. Desse total, 80% são condomínios. Nos 20% restantes estão grupos como Siemens, Unip e a rede de concessionárias Chevrolet Carrera. Boa parte dos contratos com empresas foi fechada após 2003, quando Braunstein começou a diversificar a clientela e expandir a área de atuação da GR ao abrir filiais em nove cidades fora da Grande São Paulo. Com esse posicionamento, a explosão imobiliária pode dar o empurrão que faltava para a empresa galgar um novo patamar de crescimento.
 


5. A proposta da Ecotelhado
Uma cobertura contra o aquecimento global
Imersos em um ambiente carente de fornecedores, o engenheiro civil Paulo Renato Guimarães, de 51 anos, e o engenheiro agrônomo João Manuel Feijó, de 54 anos, encontraram espaço para inovar. Ao unirem suas habilidades à crescente demanda por produtos sustentáveis, os dois empreendedores criaram um novo produto: o Ecotelhado. Trata-se de um módulo de concreto leve coberto de vegetação que é colocado por cima dos telhados de casas e edifícios. “Queríamos aproveitar a maior demanda do setor com um produto que correspondesse às preocupações relacionadas ao aquecimento global”, diz Guimarães. O novo telhado, que começou a ser comercializado em 2005, funciona como um isolante térmico, retardando o aquecimento dos ambientes durante o dia e conservando a temperatura durante a noite. Além de isolar o calor, o Ecotelhado também absorve cerca de 30% da água da chuva, reduzindo a possibilidade de enchentes nas cidades. Apesar de ser uma empresa nova, a Ecotelhado já está presente em mais de 200 empreendimentos em Porto Alegre. Na metade do ano passado, a empresa entrou nos mercados de Santa Catarina e São Paulo, por meio de representações comerciais. A novidade despertou interesse de grandes clientes, como Cyrela e Goldstein. A construtora paulista Esfera, especializada na construção de empreendimentos sustentáveis, pretende colocar o Ecotelhado em todos os seus próximos projetos. Para continuar crescendo, a empresa — que está faturando 1 milhão de reais por ano e atua apenas no Sul e no Sudeste — está desenvolvendo uma variação do Ecotelhado específica para a Região Nordeste. O novo sistema traz embutido uma espécie de reservatório de água, o que permitirá instalar o telhado em regiões de clima mais seco. No longo prazo, Guimarães acredita que pode ganhar mercado com as mudanças na legislação que regula os empreendimentos em algumas cidades, como Porto Alegre. “A tendência é que as prefeituras exijam um mínimo de área permeável para evitar o efeito devastador das chuvas, como já acontece na Europa”, diz. “O potencial de crescimento desse mercado é enorme.”


João Manuel Feijó e Renato Guimarães, Ecotelhado, Porto Alegre, RS
O que faz - Telhados ecológicos
Oportunidade - Fornecer produtos que atendam às exigências por sustentabilidade
 


6. Baixa renda no Nordeste
A Norcon encontrou um mercado inteiro para desbravar
Há no Nordeste uma carência muito grande de novos empreendimentos residenciais. Dados do IBGE apontam que a região responde por 34% do atual déficit habitacional brasileiro, de 7,9 milhões de domicílios. Ao mesmo tempo, a economia nordestina está em um momento de grande crescimento, expandindo mais do que a média nacional. A construtora sergipana Norcon, de Aracaju, enxergou uma oportunidade ao unir esses indicadores para atender a parte de baixo da pirâmide social que ganhou poder de compra. Em vez de limitar-se aos empreendimentos de alto padrão — sua grande especialidade —, a Norcon entrou no terreno das classes de renda mais baixa na região. “Foi a estratégia encontrada para ingressar de forma rápida em novos mercados e aproveitar a conjuntura do setor”, diz o diretor Cristiano Teixeira, de 30 anos, filho de um dos fundadores da Norcon. A expansão começou pelos estados de Alagoas e Bahia, com base na proximidade territorial. Para reduzir o custo de produção e viáveis as construções destinadas ao novo público, a construtora passou a fabricar as próprias peças pré-moldadas em miniusinas implantadas dentro dos canteiros de obras dos empreendimentos. “Assim, não há custos com transporte nem desperdício de materiais, porque é só encaixar as peças que já estão previamente montadas”, diz Teixeira. Segundo ele, o novo sistema proporciona uma redução de 10% a 12% nos custos, mas seria difícil implantá-lo nas obras de alto padrão, que utilizam menos peças pré-moldadas. A expansão para outros estados refletiu no faturamento da Norcon, que passou de 60 milhões para 130 milhões de reais nos últimos dois anos. A estratégia de construir casas para o público de baixa renda deu tão certo nos novos mercados que a construtora quer continuar avançando. A Norcon já está entrando no Ceará e em Pernambuco e planeja ingressar no Maranhão e no Pará até 2009.
 

Cristiano Teixeira, Norcon, Aracaju, SE
O que faz - Empreendimentos habitacionais no Nordeste
Oportunidade - Atender a parte de baixo da pirâmide social

 


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