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A internet a serviço do seu negócio

Cinco empreendedores contam como transformaram redes sociais, blogs e sites em laboratórios para melhorar seus produtos, aumentar as vendas e encontrar novos mercados

Alberto Osório, da Maria Filó: sem liquidação para queimar grandes estoques (Marcelo Correa)
DR

Da Redação

Publicado em 27 de outubro de 2011 às 05h00.

Nos últimos tempos, blogs, microblogs e redes sociais abriram as portas para que os empreendedores pudessem se comunicar diretamente com seus consumidores.

Agora, muitos donos de pequenas e médias empresas estão descobrindo que podem usar as ferramentas interativas disponíveis na internet como se fossem uma espécie de campo de testes para desenvolver novos produtos ou uma fonte de informações sobre as tendências do mercado.

"Sabendo usar, redes sociais, blogs e microblogs trazem informações valiosíssimas para o negócio", diz Natan Sztamfater, diretor da agência de marketing online CookieWeb.

"Dificilmente quem está no comando de um negócio emergente poderia pagar um instituto de pesquisas para obter o tipo de informação que hoje pode ter praticamente de graça na rede."

Nas próximas páginas, Exame PME apresenta cinco casos de empreendedores que estão conseguindo transformar a internet numa ferramenta de inteligência competitiva, capaz de ajudar a aperfeiçoar produtos, descobrir novos mercados, aumentar as vendas e conquistar clientes.


Consumidor-surpresa

No começo de 2010, a mineira Erlana de Castro, de 39 anos, criou um blog para divulgar uma nova linha de produtos de sua empresa, a fabricante de fertilizantes Biofert, de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. O público-alvo eram consumidores que cultivam flores e hortaliças em casa.

Erlana esperava tornar a marca mais conhecida entre donas de casa, pequenos agricultores e gente que fazia da jardinagem um hobby — mas foi surpreendida pelos comentários que passaram a ser deixados nos textos publicados no blog.

"Eu achava que as pessoas fariam perguntas sobre a dosagem e o modo de aplicar os fertilizantes nos canteiros", diz ela. "Mas a maioria usava os comentários para perguntar se nossos produtos podiam causar algum tipo de problema em animais domésticos, como gatos e cachorros."

O tipo de comentário deixado no blog ajudou Erlana a descobrir qual o canal de vendas mais adequado aos fertilizantes de uso doméstico.

"Comecei a pesquisar o assunto e percebi que os donos de bichos de estimação quase sempre também gostam de plantas", diz. Em mercados maiores, como os Estados Unidos, por exemplo, viceja um próspero nicho do varejo conhecido como pet garden, formado por  lojas que reúnem produtos para animais de estimação e jardinagem.

Há quatro meses, a Biofert passou a vender seus produtos em pet shops. Embora o trabalho ainda esteja no início, Erlana está satisfeita com os resultados colhidos até agora. "Já recebi ligações de donos de pet shop dizendo que querem dar mais espaço à nossa linha de produtos em suas lojas", afirma.


Ela prevê que, até o ano que vem, o novo canal de vendas represente 10% do faturamento da Biofert, atualmente em torno de 3 milhões de reais ao ano.

Usar os comentários deixados no blog para descobrir quem eram os consumidores em potencial foi fundamental para Erlana definir as estratégias de sua empresa no varejo. Até pouco tempo atrás, a empresa obtinha praticamente todas as suas receitas vendendo fertilizantes no atacado para empresas de paisagismo, botânica ou para agrônomos responsáveis por grandes lavouras.

Foi só há dois anos, quando herdou a empresa fundada pelo pai no começo dos anos 90, que Erlana começou a concentrar sua atenção no consumidor doméstico, mercado em que via um bom potencial para crescer.

"Muita gente que cultiva flores e hortaliças em casa tinha dificuldade de encontrar fertilizantes para uso", diz Erlana. "A maioria dos produtos é vendida em versões concentradas, que depois precisam ser diluídas em água."

Quase um ano depois, a Biofert havia desenvolvido a nova linha de fertilizantes e estruturado a logística de distribuição no varejo — só não sabia ao certo como chegar aos clientes em potencial. "As informações que obtive com os internautas estão sendo fundamentais para planejar a expansão da empresa nos próximos anos", afirma Erlana.

O blog não ajudou apenas na diversificação dos canais de venda da empresa, mas também na ampliação do portfólio de produtos. Há dois meses, a Biofert começou a produzir acessórios para o plantio de orquídeas, como arames e fios usados para o sustento da haste das flores.

"A sugestão partiu dos internautas que, no espaço de comentários do blog, diziam enfrentar dificuldades para encontrar esse tipo de material em kits individuais", diz Erlana. "Normalmente, esses acessórios são vendidos em grandes quantidades para floriculturas."

Em parte, Erlana foi capaz de tirar do blog conclusões importantes para o crescimento da Biofert por estar disposta a prestar atenção no que os internautas tinham a dizer — algo nem sempre frequente entre as empresas que mantêm esse canal de comunicação com o público.


"Muitos empreendedores acham que a internet é uma estrada de mão única, e só se importam com o cliente quando ele tem alguma reclamação ou elogio", afirma Natan Sztamfater, diretor da agência de marketing online CookieWeb.

Público no alvo

A família da mineira Grazielle Caetano, de 26 anos, sempre evitou mudar o que quer que fosse na receita da cachaça que deu origem à fabricante de bebidas Germana. Por mais de um século, a aguardente foi produzida em alambiques artesanais no município de Nova União, numa região montanhosa do interior de Minas Gerais, tal como nos tempos do avô de Grazielle, fundador da empresa.

Há dois anos, o negócio começou a dar mostras de que não poderia mais suportar o peso da tradição. Na época, o pai de Grazielle transferiu a ela o comando da cachaçaria. Ao avaliar as perspectivas para o futuro, ela chegou à conclusão de que era hora de mudar.

"A empresa havia parado de crescer", diz Grazielle. "Não estávamos conseguindo conquistar novos consumidores, principalmente entre o público jovem."

Grazielle decidiu que era hora de criar novos produtos, numa tentativa de rejuvenescer a marca. "O problema é que eu não sabia por onde começar", diz. Foi quando resolveu buscar a opinião dos consumidores mais jovens num ponto de encontro muito frequentado por esse público, como as redes sociais.

Grazielle montou uma comunidade da cachaça Germana no Orkut, na época a principal rede social no Brasil. "Ao abrir discussões sobre cachaça, muitos jovens diziam preferir bebidas de sabor mais suave", diz ela. "Havia uma forte rejeição para aguardentes mais fortes, como era o caso da Germana."

As discussões ajudaram os donos da Germana a descobrir quais eram as marcas de cachaça preferidas pelo público jovem que frequenta as baladas.

Com base nas características dos produtos concorrentes, a empresa começou a desenvolver uma receita adequada ao paladar desses consumidores — a conclusão foi que a bebida ideal teria de ser envelhecida em barris de cerejeira, madeira que imprime à aguardente um sabor mais suave que os tonéis de carvalho que a empresa usava na época.


Para chegar à fórmula ideal, Grazielle convidou dez dos participantes mais ativos nas discussões no Orkut para sessões de degustação — eles também puderam opinar sobre os novos rótulos e o formato das garrafas. Lançada em 2010, a nova cachaça já representa 8% do faturamento da Germana, que deve chegar a 15 milhões de reais em 2011, três vezes mais do que quando Grazielle assumiu os negócios.

Desde 2009, o contato com os consumidores nas redes sociais se transformou na principal fonte de informações para a empresa. A diferença é que, agora, boa parte das discussões acontece no Facebook, rede social que vem tomando o lugar do Orkut na preferência dos brasileiros.

O aprendizado na rede tem ajudado a Germana a entrar em novos negócios. Nos últimos dois anos, a empresa diversificou sua atuação no mercado ao abrir dois bares e três casas de shows em Belo Horizonte.

"Usamos o Facebook para saber se os frequentadores curtem os músicos que se apresentam nas nossas casas", afirma Grazielle. "Não gastamos com pesquisas. A rede social nos dá todas as informações de que precisamos."

Encalhe mínimo

O publicitário Alberto Osório, de 52 anos, encontrou no Twitter uma maneira de descobrir rapidamente se as novas coleções de sua grife de roupas femininas, a carioca Maria Filó, caem no gosto das consumidoras. Ao lançar novos modelos de vestidos, camisas e outros tipos de peças, ele divulga imagens de seu catálogo para as mais de 12.000 pessoas que seguem o perfil da empresa no Twitter.

"Pelos comentários que surgem espontaneamente, em poucas horas consigo saber se uma peça agradou ou se ela corre o risco de ficar esquentando a prateleira até a próxima estação", afirma Osório.


Desde 2009, Osório vem usando o burburinho causado pelas consumidoras no Twitter para agir a tempo de evitar que sua produção encalhe. Dependendo do tipo do comentário mais frequente, ele pode, por exemplo, interromper a produção para substituir a cor de uma roupa que não agradou muito ou alterar o tecido para melhorar o caimento.

Em outras situações, a solução pode ser bem mais prática. "Às vezes, as consumidoras que nos seguem no Twitter dizem que não gostam de algum modelo por não saber exatamente como usá-lo", afirma Osório. Quando isso acontece, ele refaz as fotos das peças que não caíram no gosto do público, sugerindo combinações com outros acessórios, como sapatos, bolsas e bijuterias.

Desde que essas estratégias foram adotadas, o volume de peças que sobram para as duas liquidações de fim de estação que a empresa promove por ano caiu 30%. "Reduzimos a necessidade de baixar os preços para desovar os modelos que não faziam muito sucesso”, diz Osório. “O Twitter virou um termômetro instantâneo."

No ano passado, a Maria Filó faturou 100 milhões de reais — a empresa mantém uma rede de 40 lojas próprias, além de vender para varejistas multimarcas.

Usar o Twitter para antecipar que peças de uma coleção correm o risco de encalhar no varejo foi uma descoberta casual na Maria Filó. Ao criar o perfil da empresa no Twitter, Osório pretendia apenas manter um canal de comunicação com as clientes em potencial para divulgar as novidades da empresa e, no máximo, responder a perguntas e reclamações das consumidoras com mais agilidade.

Em pouco tempo, no entanto, ele percebeu que o microblog onde as pessoas podem postar comentários de até 140 caracteres poderia ser bem mais que um canal de diálogo. "Moda e estilo são o tipo de assunto que se alastra rapidamente no Twitter", diz Osório. "Percebi que podíamos usar a velocidade com que as internautas faziam comentários como uma poderosa ferramenta de pesquisa para nossa empresa."


Para aproveitar melhor esse potencial, Osório montou uma equipe de cinco pessoas que monitoram o que é dito a respeito da empresa no Twitter e nas redes sociais. Seu trabalho é identificar, entre as seguidoras do perfil da empresa, as consumidoras mais influentes e que atuam como formadoras de opinião.

São mulheres que entendem um pouco de moda, muitas vezes têm um blog sobre o assunto e costumam ter suas mensagens retwittadas por outras internautas. Geralmente, a opinião delas tem peso maior nas avaliações que a empresa faz sobre o modo com que suas coleções são recebidas pelo público.

"Aprendemos com as twitteiras mais influentes", diz Osório. "Dependendo de como avaliam uma peça, antevemos se haverá uma boa saída nas lojas ou se é preciso tomar alguma atitude."

Medir a receptividade de produtos e serviços é uma das aplicações que os empreendedores estão encontrando para os microblogs. "O Twitter é um ambiente ágil e informal, onde os usuários querem opinar sobre os assuntos do momento", diz Bruno Martinho, da Directa Click, consultoria paulistana especializada em marketing digital.

Fábrica de ideias

O catarinense Cláudio Grando, de 43 anos, vem conseguindo arregimentar um exército de gente disposta a ajudá-lo a aperfeiçoar seus produtos. Ele é dono da Audaces, fabricante de soft­wares para automação de confecções com sede em Florianópolis.

Em outubro, Grando pôs no ar uma rede social na qual estilistas, designers e estudantes de moda têm acesso a uma versão gratuita dos programas da empresa, que permite criar desenhos de roupas simulando formas, estampas e costuras.

Atualmente, a rede reúne mais de 30.000 membros. Ao desenhar moldes com as ferramentas online da Audaces, eles ajudam os técnicos da empresa a identificar problemas e a aperfeiçoar os softwares.


Grando encontrou uma maneira prática de acelerar o desenvolvimento de produtos que, de outra forma, poderia demorar anos. "Desde o começo, minha ideia era criar um campo de testes para o aperfeiçoamento dos softwares", diz ele.

Com a rede social, os técnicos da Audaces conseguem monitorar como os usuários lidam com os softwares, quais as dificuldades que encontram e o que funciona tão bem que é melhor não mudar em futuras versões.

Sem isso, seria preciso aguardar muito mais tempo — antes, a empresa tinha de lançar um novo software e aguardar a opinião dos clientes para só depois avaliar a necessidade de fazer alterações ou atualizações no programa.

Desde o lançamento da rede, batizada de Idea nas Nuvens, a Audaces já foi capaz de realizar algumas melhorias em seus principais produtos. Um exemplo é a ferramenta que reduz o tamanho dos desenhos dos modelos de roupas desenvol­vidos pelos internautas.

"Os usuários tinham muita dificuldade em ajustar os desenhos", afirma Grando. "Criamos um recurso que faz ajustes automáticos." Para fazer com que as informações coletadas no sistema possam ser rapidamente aproveitadas, a empresa destacou funcionários das principais áreas — como vendas, marketing e produção — para monitorar a rede social.

A Audaces entrou no mundo da moda pouco depois que Grando e o sócio Ricardo Cunha, de 43 anos, criaram a empresa em 1992. Na época, os dois eram recém-formados em computação e pretendiam desenvolver softwares de automação para indústrias metalúrgicas e moveleiras.

Aos poucos, encontraram mais espaço para crescer com as confecções. Hoje, além dos softwares, a Audaces fabrica máquinas de corte e impressoras de moldes. A expectativa é fechar o ano com receitas de 45 milhões de reais, 30% mais do que em 2010. A rede social está ajudando a aumentar o faturamento.


Muitos dos membros que começaram usando o programa gratuito disponível na internet passaram a comprar versões mais avançadas do software, que custam de 300 a 20. 000 reais. De acordo com Grando, cerca de 5% dos usuários cadastrados no site já migraram para alguma versão paga. "As pessoas experimentam o programa gratuito, gostam e querem mais", diz.

Cliente localizado

Em julho do ano passado, uma movimentação atípica chamou a atenção do administrador Flávio Beretta, de 32 anos, dono da loja virtual Só Futebol, especializada na venda de camisas de times.

Dezenas de usuários entraram no site e digitaram no formulário de busca combinações de palavras como "camisa coreia do norte" e "seleção coreia do norte". O súbito interesse pelo uniforme da seleção coreana de futebol tinha explicação trivial.

O time seria o primeiro adversário do Brasil na Copa do Mundo da África do Sul. Depois de entrar em contato com a embaixada norte-coreana em Brasília, ele encontrou o fornecedor dos uniformes — uma fabricante italiana — e encomendou um lote de camisas, vendidas em poucos dias. "Vi uma boa oportunidade para aumentar as receitas e aproveitei", diz Beretta.

Garimpar informações sobre o que os clientes desejam com base nas pesquisa feitas no mecanismo de busca do site da Só Futebol vem trazendo bons resultados para o negócio.


Neste ano, 10% das receitas, estimadas em 20 milhões de reais, devem ser obtidos com a venda de camisas de times de futebol quase desconhecidos que, por um motivo ou outro, emergem do quase anonimato para seus 15 minutos de fama.

Em outro exemplo recente, os funcionários da Só Futebol identificaram um aumento nas buscas por uniformes do Ibis, clube do interior de Pernambuco que ficou conhecido nos anos 80 como o pior time do mundo devido a uma série de derrotas no campeonato pernambucano de futebol.

"O interesse pelo Ibis ressurgiu depois de uma reportagem num programa de esportes na televisão", diz Beretta. "Já tivemos de encomendar duas remessas de camisas."

Beretta descobriu que era importante prestar atenção no que os clientes buscavam no site logo no começo da empresa, fundada há dez anos por ele e por seu irmão, Felipe. Na época, os dois eram donos de uma vasta coleção de camisas de times de futebol e decidiram criar um blog para postar fotos de alguns exemplares.

"Começamos a receber uma enxurrada de e-mails de gente querendo comprar as camisas", diz Beretta. "Foi assim que surgiu a ideia de abrir a empresa."


Atualmente, o site vende mais de 30.000 tipos de uniforme, comprados em mais de 1.000 confecções espalhadas pelo Brasil e em outros países.

Boa parte das vendas do site é de camisas dos times de grandes torcidas, como os grandes clubes paulistas e cariocas. Para a Só Futebol, aproveitar a oportunidade de atender uma demanda pontual por uniformes de equipes menos badaladas é uma das maneiras de aumentar as receitas do negócio.

"Sem o mecanismo de buscas no site, jamais saberíamos quando há demanda por camisas de times desconhecidos", afirma Beretta.

Em alguns casos, o modo como os consumidores fazem pesquisas ajuda o empreendedor a descobrir como melhorar um site de comércio eletrônico. "As palavras-chave mais utilizadas quase sempre dão pistas sobre a melhor forma de organizar uma loja virtual", diz Gil Giardeli, consultor de marketing digital.

"É bastante comum, por exemplo, que os empreendedores descubram que é preciso abrir novas seções no site ou mudar o modo como os produtos são oferecidos com base na maneira que os clientes fazem as pesquisas."

É o que está acontecendo na Só Futebol. Recentemente, Beretta percebeu um aumento no número de buscas por camisas e cachecóis femininos com as cores dos times de futebol — os dois itens já estão entre os 50 produtos mais pesquisados no site. "Deduzi que existe um público formado por mulheres ávidas em consumir acessórios esportivos", diz ele.

Agora, Beretta estuda como dar mais visibilidade aos produtos para torcedoras. "Acredito que temos muito o que crescer vendendo para o público feminino", afirma ele.

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Nos últimos tempos, blogs, microblogs e redes sociais abriram as portas para que os empreendedores pudessem se comunicar diretamente com seus consumidores.

Agora, muitos donos de pequenas e médias empresas estão descobrindo que podem usar as ferramentas interativas disponíveis na internet como se fossem uma espécie de campo de testes para desenvolver novos produtos ou uma fonte de informações sobre as tendências do mercado.

"Sabendo usar, redes sociais, blogs e microblogs trazem informações valiosíssimas para o negócio", diz Natan Sztamfater, diretor da agência de marketing online CookieWeb.

"Dificilmente quem está no comando de um negócio emergente poderia pagar um instituto de pesquisas para obter o tipo de informação que hoje pode ter praticamente de graça na rede."

Nas próximas páginas, Exame PME apresenta cinco casos de empreendedores que estão conseguindo transformar a internet numa ferramenta de inteligência competitiva, capaz de ajudar a aperfeiçoar produtos, descobrir novos mercados, aumentar as vendas e conquistar clientes.


Consumidor-surpresa

No começo de 2010, a mineira Erlana de Castro, de 39 anos, criou um blog para divulgar uma nova linha de produtos de sua empresa, a fabricante de fertilizantes Biofert, de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. O público-alvo eram consumidores que cultivam flores e hortaliças em casa.

Erlana esperava tornar a marca mais conhecida entre donas de casa, pequenos agricultores e gente que fazia da jardinagem um hobby — mas foi surpreendida pelos comentários que passaram a ser deixados nos textos publicados no blog.

"Eu achava que as pessoas fariam perguntas sobre a dosagem e o modo de aplicar os fertilizantes nos canteiros", diz ela. "Mas a maioria usava os comentários para perguntar se nossos produtos podiam causar algum tipo de problema em animais domésticos, como gatos e cachorros."

O tipo de comentário deixado no blog ajudou Erlana a descobrir qual o canal de vendas mais adequado aos fertilizantes de uso doméstico.

"Comecei a pesquisar o assunto e percebi que os donos de bichos de estimação quase sempre também gostam de plantas", diz. Em mercados maiores, como os Estados Unidos, por exemplo, viceja um próspero nicho do varejo conhecido como pet garden, formado por  lojas que reúnem produtos para animais de estimação e jardinagem.

Há quatro meses, a Biofert passou a vender seus produtos em pet shops. Embora o trabalho ainda esteja no início, Erlana está satisfeita com os resultados colhidos até agora. "Já recebi ligações de donos de pet shop dizendo que querem dar mais espaço à nossa linha de produtos em suas lojas", afirma.


Ela prevê que, até o ano que vem, o novo canal de vendas represente 10% do faturamento da Biofert, atualmente em torno de 3 milhões de reais ao ano.

Usar os comentários deixados no blog para descobrir quem eram os consumidores em potencial foi fundamental para Erlana definir as estratégias de sua empresa no varejo. Até pouco tempo atrás, a empresa obtinha praticamente todas as suas receitas vendendo fertilizantes no atacado para empresas de paisagismo, botânica ou para agrônomos responsáveis por grandes lavouras.

Foi só há dois anos, quando herdou a empresa fundada pelo pai no começo dos anos 90, que Erlana começou a concentrar sua atenção no consumidor doméstico, mercado em que via um bom potencial para crescer.

"Muita gente que cultiva flores e hortaliças em casa tinha dificuldade de encontrar fertilizantes para uso", diz Erlana. "A maioria dos produtos é vendida em versões concentradas, que depois precisam ser diluídas em água."

Quase um ano depois, a Biofert havia desenvolvido a nova linha de fertilizantes e estruturado a logística de distribuição no varejo — só não sabia ao certo como chegar aos clientes em potencial. "As informações que obtive com os internautas estão sendo fundamentais para planejar a expansão da empresa nos próximos anos", afirma Erlana.

O blog não ajudou apenas na diversificação dos canais de venda da empresa, mas também na ampliação do portfólio de produtos. Há dois meses, a Biofert começou a produzir acessórios para o plantio de orquídeas, como arames e fios usados para o sustento da haste das flores.

"A sugestão partiu dos internautas que, no espaço de comentários do blog, diziam enfrentar dificuldades para encontrar esse tipo de material em kits individuais", diz Erlana. "Normalmente, esses acessórios são vendidos em grandes quantidades para floriculturas."

Em parte, Erlana foi capaz de tirar do blog conclusões importantes para o crescimento da Biofert por estar disposta a prestar atenção no que os internautas tinham a dizer — algo nem sempre frequente entre as empresas que mantêm esse canal de comunicação com o público.


"Muitos empreendedores acham que a internet é uma estrada de mão única, e só se importam com o cliente quando ele tem alguma reclamação ou elogio", afirma Natan Sztamfater, diretor da agência de marketing online CookieWeb.

Público no alvo

A família da mineira Grazielle Caetano, de 26 anos, sempre evitou mudar o que quer que fosse na receita da cachaça que deu origem à fabricante de bebidas Germana. Por mais de um século, a aguardente foi produzida em alambiques artesanais no município de Nova União, numa região montanhosa do interior de Minas Gerais, tal como nos tempos do avô de Grazielle, fundador da empresa.

Há dois anos, o negócio começou a dar mostras de que não poderia mais suportar o peso da tradição. Na época, o pai de Grazielle transferiu a ela o comando da cachaçaria. Ao avaliar as perspectivas para o futuro, ela chegou à conclusão de que era hora de mudar.

"A empresa havia parado de crescer", diz Grazielle. "Não estávamos conseguindo conquistar novos consumidores, principalmente entre o público jovem."

Grazielle decidiu que era hora de criar novos produtos, numa tentativa de rejuvenescer a marca. "O problema é que eu não sabia por onde começar", diz. Foi quando resolveu buscar a opinião dos consumidores mais jovens num ponto de encontro muito frequentado por esse público, como as redes sociais.

Grazielle montou uma comunidade da cachaça Germana no Orkut, na época a principal rede social no Brasil. "Ao abrir discussões sobre cachaça, muitos jovens diziam preferir bebidas de sabor mais suave", diz ela. "Havia uma forte rejeição para aguardentes mais fortes, como era o caso da Germana."

As discussões ajudaram os donos da Germana a descobrir quais eram as marcas de cachaça preferidas pelo público jovem que frequenta as baladas.

Com base nas características dos produtos concorrentes, a empresa começou a desenvolver uma receita adequada ao paladar desses consumidores — a conclusão foi que a bebida ideal teria de ser envelhecida em barris de cerejeira, madeira que imprime à aguardente um sabor mais suave que os tonéis de carvalho que a empresa usava na época.


Para chegar à fórmula ideal, Grazielle convidou dez dos participantes mais ativos nas discussões no Orkut para sessões de degustação — eles também puderam opinar sobre os novos rótulos e o formato das garrafas. Lançada em 2010, a nova cachaça já representa 8% do faturamento da Germana, que deve chegar a 15 milhões de reais em 2011, três vezes mais do que quando Grazielle assumiu os negócios.

Desde 2009, o contato com os consumidores nas redes sociais se transformou na principal fonte de informações para a empresa. A diferença é que, agora, boa parte das discussões acontece no Facebook, rede social que vem tomando o lugar do Orkut na preferência dos brasileiros.

O aprendizado na rede tem ajudado a Germana a entrar em novos negócios. Nos últimos dois anos, a empresa diversificou sua atuação no mercado ao abrir dois bares e três casas de shows em Belo Horizonte.

"Usamos o Facebook para saber se os frequentadores curtem os músicos que se apresentam nas nossas casas", afirma Grazielle. "Não gastamos com pesquisas. A rede social nos dá todas as informações de que precisamos."

Encalhe mínimo

O publicitário Alberto Osório, de 52 anos, encontrou no Twitter uma maneira de descobrir rapidamente se as novas coleções de sua grife de roupas femininas, a carioca Maria Filó, caem no gosto das consumidoras. Ao lançar novos modelos de vestidos, camisas e outros tipos de peças, ele divulga imagens de seu catálogo para as mais de 12.000 pessoas que seguem o perfil da empresa no Twitter.

"Pelos comentários que surgem espontaneamente, em poucas horas consigo saber se uma peça agradou ou se ela corre o risco de ficar esquentando a prateleira até a próxima estação", afirma Osório.


Desde 2009, Osório vem usando o burburinho causado pelas consumidoras no Twitter para agir a tempo de evitar que sua produção encalhe. Dependendo do tipo do comentário mais frequente, ele pode, por exemplo, interromper a produção para substituir a cor de uma roupa que não agradou muito ou alterar o tecido para melhorar o caimento.

Em outras situações, a solução pode ser bem mais prática. "Às vezes, as consumidoras que nos seguem no Twitter dizem que não gostam de algum modelo por não saber exatamente como usá-lo", afirma Osório. Quando isso acontece, ele refaz as fotos das peças que não caíram no gosto do público, sugerindo combinações com outros acessórios, como sapatos, bolsas e bijuterias.

Desde que essas estratégias foram adotadas, o volume de peças que sobram para as duas liquidações de fim de estação que a empresa promove por ano caiu 30%. "Reduzimos a necessidade de baixar os preços para desovar os modelos que não faziam muito sucesso”, diz Osório. “O Twitter virou um termômetro instantâneo."

No ano passado, a Maria Filó faturou 100 milhões de reais — a empresa mantém uma rede de 40 lojas próprias, além de vender para varejistas multimarcas.

Usar o Twitter para antecipar que peças de uma coleção correm o risco de encalhar no varejo foi uma descoberta casual na Maria Filó. Ao criar o perfil da empresa no Twitter, Osório pretendia apenas manter um canal de comunicação com as clientes em potencial para divulgar as novidades da empresa e, no máximo, responder a perguntas e reclamações das consumidoras com mais agilidade.

Em pouco tempo, no entanto, ele percebeu que o microblog onde as pessoas podem postar comentários de até 140 caracteres poderia ser bem mais que um canal de diálogo. "Moda e estilo são o tipo de assunto que se alastra rapidamente no Twitter", diz Osório. "Percebi que podíamos usar a velocidade com que as internautas faziam comentários como uma poderosa ferramenta de pesquisa para nossa empresa."


Para aproveitar melhor esse potencial, Osório montou uma equipe de cinco pessoas que monitoram o que é dito a respeito da empresa no Twitter e nas redes sociais. Seu trabalho é identificar, entre as seguidoras do perfil da empresa, as consumidoras mais influentes e que atuam como formadoras de opinião.

São mulheres que entendem um pouco de moda, muitas vezes têm um blog sobre o assunto e costumam ter suas mensagens retwittadas por outras internautas. Geralmente, a opinião delas tem peso maior nas avaliações que a empresa faz sobre o modo com que suas coleções são recebidas pelo público.

"Aprendemos com as twitteiras mais influentes", diz Osório. "Dependendo de como avaliam uma peça, antevemos se haverá uma boa saída nas lojas ou se é preciso tomar alguma atitude."

Medir a receptividade de produtos e serviços é uma das aplicações que os empreendedores estão encontrando para os microblogs. "O Twitter é um ambiente ágil e informal, onde os usuários querem opinar sobre os assuntos do momento", diz Bruno Martinho, da Directa Click, consultoria paulistana especializada em marketing digital.

Fábrica de ideias

O catarinense Cláudio Grando, de 43 anos, vem conseguindo arregimentar um exército de gente disposta a ajudá-lo a aperfeiçoar seus produtos. Ele é dono da Audaces, fabricante de soft­wares para automação de confecções com sede em Florianópolis.

Em outubro, Grando pôs no ar uma rede social na qual estilistas, designers e estudantes de moda têm acesso a uma versão gratuita dos programas da empresa, que permite criar desenhos de roupas simulando formas, estampas e costuras.

Atualmente, a rede reúne mais de 30.000 membros. Ao desenhar moldes com as ferramentas online da Audaces, eles ajudam os técnicos da empresa a identificar problemas e a aperfeiçoar os softwares.


Grando encontrou uma maneira prática de acelerar o desenvolvimento de produtos que, de outra forma, poderia demorar anos. "Desde o começo, minha ideia era criar um campo de testes para o aperfeiçoamento dos softwares", diz ele.

Com a rede social, os técnicos da Audaces conseguem monitorar como os usuários lidam com os softwares, quais as dificuldades que encontram e o que funciona tão bem que é melhor não mudar em futuras versões.

Sem isso, seria preciso aguardar muito mais tempo — antes, a empresa tinha de lançar um novo software e aguardar a opinião dos clientes para só depois avaliar a necessidade de fazer alterações ou atualizações no programa.

Desde o lançamento da rede, batizada de Idea nas Nuvens, a Audaces já foi capaz de realizar algumas melhorias em seus principais produtos. Um exemplo é a ferramenta que reduz o tamanho dos desenhos dos modelos de roupas desenvol­vidos pelos internautas.

"Os usuários tinham muita dificuldade em ajustar os desenhos", afirma Grando. "Criamos um recurso que faz ajustes automáticos." Para fazer com que as informações coletadas no sistema possam ser rapidamente aproveitadas, a empresa destacou funcionários das principais áreas — como vendas, marketing e produção — para monitorar a rede social.

A Audaces entrou no mundo da moda pouco depois que Grando e o sócio Ricardo Cunha, de 43 anos, criaram a empresa em 1992. Na época, os dois eram recém-formados em computação e pretendiam desenvolver softwares de automação para indústrias metalúrgicas e moveleiras.

Aos poucos, encontraram mais espaço para crescer com as confecções. Hoje, além dos softwares, a Audaces fabrica máquinas de corte e impressoras de moldes. A expectativa é fechar o ano com receitas de 45 milhões de reais, 30% mais do que em 2010. A rede social está ajudando a aumentar o faturamento.


Muitos dos membros que começaram usando o programa gratuito disponível na internet passaram a comprar versões mais avançadas do software, que custam de 300 a 20. 000 reais. De acordo com Grando, cerca de 5% dos usuários cadastrados no site já migraram para alguma versão paga. "As pessoas experimentam o programa gratuito, gostam e querem mais", diz.

Cliente localizado

Em julho do ano passado, uma movimentação atípica chamou a atenção do administrador Flávio Beretta, de 32 anos, dono da loja virtual Só Futebol, especializada na venda de camisas de times.

Dezenas de usuários entraram no site e digitaram no formulário de busca combinações de palavras como "camisa coreia do norte" e "seleção coreia do norte". O súbito interesse pelo uniforme da seleção coreana de futebol tinha explicação trivial.

O time seria o primeiro adversário do Brasil na Copa do Mundo da África do Sul. Depois de entrar em contato com a embaixada norte-coreana em Brasília, ele encontrou o fornecedor dos uniformes — uma fabricante italiana — e encomendou um lote de camisas, vendidas em poucos dias. "Vi uma boa oportunidade para aumentar as receitas e aproveitei", diz Beretta.

Garimpar informações sobre o que os clientes desejam com base nas pesquisa feitas no mecanismo de busca do site da Só Futebol vem trazendo bons resultados para o negócio.


Neste ano, 10% das receitas, estimadas em 20 milhões de reais, devem ser obtidos com a venda de camisas de times de futebol quase desconhecidos que, por um motivo ou outro, emergem do quase anonimato para seus 15 minutos de fama.

Em outro exemplo recente, os funcionários da Só Futebol identificaram um aumento nas buscas por uniformes do Ibis, clube do interior de Pernambuco que ficou conhecido nos anos 80 como o pior time do mundo devido a uma série de derrotas no campeonato pernambucano de futebol.

"O interesse pelo Ibis ressurgiu depois de uma reportagem num programa de esportes na televisão", diz Beretta. "Já tivemos de encomendar duas remessas de camisas."

Beretta descobriu que era importante prestar atenção no que os clientes buscavam no site logo no começo da empresa, fundada há dez anos por ele e por seu irmão, Felipe. Na época, os dois eram donos de uma vasta coleção de camisas de times de futebol e decidiram criar um blog para postar fotos de alguns exemplares.

"Começamos a receber uma enxurrada de e-mails de gente querendo comprar as camisas", diz Beretta. "Foi assim que surgiu a ideia de abrir a empresa."


Atualmente, o site vende mais de 30.000 tipos de uniforme, comprados em mais de 1.000 confecções espalhadas pelo Brasil e em outros países.

Boa parte das vendas do site é de camisas dos times de grandes torcidas, como os grandes clubes paulistas e cariocas. Para a Só Futebol, aproveitar a oportunidade de atender uma demanda pontual por uniformes de equipes menos badaladas é uma das maneiras de aumentar as receitas do negócio.

"Sem o mecanismo de buscas no site, jamais saberíamos quando há demanda por camisas de times desconhecidos", afirma Beretta.

Em alguns casos, o modo como os consumidores fazem pesquisas ajuda o empreendedor a descobrir como melhorar um site de comércio eletrônico. "As palavras-chave mais utilizadas quase sempre dão pistas sobre a melhor forma de organizar uma loja virtual", diz Gil Giardeli, consultor de marketing digital.

"É bastante comum, por exemplo, que os empreendedores descubram que é preciso abrir novas seções no site ou mudar o modo como os produtos são oferecidos com base na maneira que os clientes fazem as pesquisas."

É o que está acontecendo na Só Futebol. Recentemente, Beretta percebeu um aumento no número de buscas por camisas e cachecóis femininos com as cores dos times de futebol — os dois itens já estão entre os 50 produtos mais pesquisados no site. "Deduzi que existe um público formado por mulheres ávidas em consumir acessórios esportivos", diz ele.

Agora, Beretta estuda como dar mais visibilidade aos produtos para torcedoras. "Acredito que temos muito o que crescer vendendo para o público feminino", afirma ele.

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