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As empresas brasileiras começam a vincular metas socioambientais à remuneração variável de seus executivos

Funcionários da rede Dry Wash: bonus para os gerentes que estimulam o empregado a voltar para a escola (.)
DR

Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h11.

Atrelar a remuneração variável de executivos não só ao cumprimento de metas econômicas mas também a objetivos socioambientais é uma tendência que vem começando a ganhar espaço nas empresas brasileiras nos últimos anos. Um termômetro desse movimento é a análise das empresas que participaram desta edição do Guia EXAME de Sustentabilidade.

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Das 128 companhias que responderam a todas as perguntas do questionário, 29 declararam vincular a remuneração variável simultaneamente aos resultados econômicos, sociais e ambientais - o que significa 23% das empresas analisadas. "É um bom sinal, pois representa quase um quarto do universo. Mas ainda há um longo caminho a percorrer", diz Aron Belinky, secretário executivo do Grupo de Articulação das ONGs Brasileiras (GAO) na ISO 26000, a futura norma internacional de responsabilidade social.

Uma das pioneiras nessa área é a subsidiária brasileira da Unilever, que em 2001 adotou a política de vincular a remuneração variável a resultados socioambientais. As metas que servem de parâmetro para o cálculo da remuneração são definidas no planejamento estratégico anual da companhia. O programa se desdobra em dois conjuntos de objetivos: metade está vinculada ao resultado financeiro e se aplica a todos os funcionários; e a outra metade, que vale apenas para os executivos, inclui metas socioambientais. No aspecto social, um dos projetos que estão sendo levados em conta neste ano é o Infância Protegida, que visa coibir o trabalho infantil nas lavouras de tomate que seus fornecedores mantêm em cinco municípios goianos - quanto mais crianças na escola e menos na lavoura, mais pontos ganham os executivos responsáveis pela fábrica da Unilever da região. Além disso, a remuneração variável depende da redução do impacto no meio ambiente nas áreas em que a empresa atua. O programa já trouxe avanços, como a queda de 32% no consumo de água e de resíduos sólidos nas fábricas da companhia entre 2002 e 2007. Com isso, um gerente de fábrica que atingiu suas metas nesse período ganhou, em média, um bônus correspondente a 22% de seu salário anual. Quem excedeu as metas recebeu o dobro. "Nos últimos anos, os aspectos sociais e ambientais ganharam cada vez mais peso no cálculo da remuneração variável da companhia", diz Marcelo Willians, vice-presidente de recursos humanos da Unilever no Brasil.


Escola para todos

A adoção de uma política de remuneração variável atrelada ao desempenho socioambiental não é exclusividade das grandes empresas. Com faturamento anual em torno de 27 milhões de reais, a rede paulistana Dry Wash, especializada em lavagem de carros a seco, começou a implantar esse sistema em outubro de 2007. Para o primeiro ano, ficou estabelecido que os gerentes das nove lojas próprias da rede receberiam uma bonificação equivalente a um salário mensal caso cumprissem a meta social de colocar nas salas de aula 20% dos funcionários que ainda não tivessem concluído o ensino fundamental e médio. Como esse objetivo já foi cumprido - no total, 43 funcionários retomaram os estudos -, os executivos vão receber o bônus no fim deste ano. No plano ambiental, a meta traçada pela empresa é reciclar 100% dos panos usados na lavagem dos carros - uma montanha de 189 000 panos por mês nas nove lojas próprias. Esses tecidos são enviados a uma indústria de reciclagem, que transforma o material em feltros, utilizados pela indústria automobilística no acabamento de carros. O cumprimento desse objetivo não rende nenhum bônus extra aos gerentes, mas, se não for alcançado, os executivos serão penalizados. "Nesse caso, eles são multados em 20% do valor total do programa de participação nos resultados que é distribuído mensalmente", diz Roseli Santos Perez, sócia e gerente de operações da rede. Segundo ela, a decisão de vincular a remuneração a metas socioambientais foi tomada em razão de uma visão de longo prazo da empresa. "Acreditamos na sustentabilidade. No lado social, só o desenvolvimento das pessoas é capaz de garantir o sucesso do negócio. No lado ambiental, cuidamos da natureza para poder lavar carros a vida inteira", diz Roseli.

Para o consultor Leonardo Salgado, da Hay Group, assessoria especializada em remuneração de executivos, nem todas as empresas que adotam metas ambientais também traçam objetivos sociais. Nos planejamentos de remuneração que a consultoria faz para grandes empresas, por exemplo, a questão ambiental é sempre uma preocupação. “É uma forma de as companhias prevenirem acidentes ambientais, sujeitos a multas altíssimas", diz Salgado. Já no quesito social, a situação é diferente. "Como ainda é muito difícil mensurar os resultados sociais, traçar metas de remuneração fica também complicado", afirma. Embora a política de remuneração atrelada a questões socioambientais tenha tomado impulso nos últimos anos, essa não é uma preocupação nova. Desde os anos 80, há indústrias que premiam seus executivos pela redução do consumo de água e energia, por exemplo. "A diferença é que essa questão ganhou relevância e visibilidade. O que antes era uma simples meta industrial virou hoje uma preocupação estratégica para a companhia", diz Salgado.

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