Empresas questionam cobrança de PIS/Cofins sobre receita cambial
Você pagaria um imposto sobre uma receita fictícia criada pela variação cambial? Receita essa que nunca virou dinheiro no caixa, pois representa apenas um número no livro contábil, escrito porque assim manda a lei? A Océ-Brasil, multinacional holandesa fabricantes de impressoras, com produtos e serviços espalhados por 30 países inclusive no Brasil está fazendo essa […]
Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h33.
Você pagaria um imposto sobre uma receita fictícia criada pela variação cambial? Receita essa que nunca virou dinheiro no caixa, pois representa apenas um número no livro contábil, escrito porque assim manda a lei? A Océ-Brasil, multinacional holandesa fabricantes de impressoras, com produtos e serviços espalhados por 30 países inclusive no Brasil está fazendo essa pergunta à Justiça Federal de São Paulo. A empresa tenta conseguir um mandado de segurança para não pagar alguns impostos sobre receitas geradas a partir da valorização do real sobre dívidas em moedas estrangeira mas receitas que não ocorreram de fato. A Océ não está sozinha na tentativa. A Globex, controladora das lojas Ponto Frio, faz o mesmo questionamento à Justiça Federal carioca. Escritórios de advocacia estimam que, apenas em São Paulo, 30 outras companhias, a maioria multinacionais, já entraram ou estudam entrar com ações do gênero.
Em síntese, as empresas questionam como o fisco trata a questão - e a forma como a contabilidade interna avalia receitas e despesas. Há dois sistemas para apurar os resultados das empresas, que servem de base para a cobrança de impostos: o regime de caixa e o regime de competência. No de caixa, os impostos recaem sobre receitas e despesas que efetivamente ocorreram - e foram liqüidadas - ao longo do ano. No de competência, os impostos são cobrados sobre apurações de fatos contábeis ou seja, do registro das operações, ainda que o dinheiro não tenha entrado nem saído na empresa. Nesse regime, o registro de despesas e receitas que ainda não ocorreram também tem de ser feito mensalmente.
Onde o dólar entra na história? A variação cambial também é tributável, porque, no entendimento do fisco, gera receita quando o real se valoriza diante do dólar. A interpretação vale também para as dívidas em moeda estrangeira. Suponha que uma empresa fez um empréstimo de 100 dólares em primeiro de janeiro, com o dólar cotado a 3,50 reais. Entram no caixa, portanto, 350 reais. Ao final do ano, no dia 31 de dezembro, o débito é quitado com outro valor, porque o câmbio mudou: 2,80 reais. Temos um pagamento de 280 reais. A diferença de 70 reais é considerada receita de variação cambial. Sobre ela recaem as alíquotas de inúmeras taxas: 9% da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), 25% do Imposto de Renda, 1,65% do Programa de Integração Social (PIS) e 3% da Cofins, por exemplo.
Suponha, agora, que ocorra o inverso: em primeiro de janeiro, o dólar estava a 2,80 reais, e no dia 31 de dezembro, a 3,50 reais. No regime de caixa, não há imposto a pagar a empresa não gerou receita no exercício, pelo contrário: houve uma despesa extra de 70 reais. Mas, no regime de competência, a coisa muda de figura, porque o registro das receita/despesa acompanha a variação da moeda todos os meses.
Quando o dólar sobe, a empresa registra uma despesa (que pode ser deduzida para efeito de cálculo do IR e da contribuição sobre o lucro). Quando o real sobe, a empresa contabiliza uma receita e paga os impostos. Mas essas receitas e despesas podem não corresponder à entrada e saída reais do caixa. No fim, tudo fica elas por elas para a cobrança do IR e da CSLL, porque a Receita Federal criou um sistema de créditos para compensar eventuais distorções. Mas dois outros tributos, o PIS e o Cofins, têm tratamento diferente. Eles não geram créditos, apenas débitos sobre receitas. Quando o real se valoriza, o imposto sobre a diferença vai para o fisco. Não há como reavê-la se o dólar subir outra vez no mês seguinte.
No ano passado, a montanha russa em que se transformou o câmbio fez do regime de competência uma grande fonte de arrecadação de PIS/Cofins. É nesse ponto que renasce a polêmica tributária entre as empresas e o leão, por conta da cobrança de impostos sobre as receitas cambiais. Essa cobrança causa perplexidade , diz Raquel Novais, especialista em direito tributário do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice. As empresas que optaram pelo regime de competência tiveram de pagar imposto sobre uma receita que nunca tiveram de fato. Raquel analisa diversos casos no momento. O advogado Roberto Pasqualin, especialista em direito tributário e societário da Demarest & Almeida, vai mais longe: Registro de variação cambial não é receita para efeito de tributação . A decisão final caberá aos tribunais.