ESG

O que o design e a moda podem fazer pela economia circular? Debate na USP busca respostas

"A moda tem uma habilidade e uma certa queda para a inovação e mudanças”, afirma a professora Júlia Valle Noronha, da Estonian Academy of Arts

Cadeia de moda: pesquisadores, alunos e players do mercado se unem para discutir alternativas de diminuição de resíduos e circularidade na produção têxtil (MARTIN BERNETTI/Getty Images)

Cadeia de moda: pesquisadores, alunos e players do mercado se unem para discutir alternativas de diminuição de resíduos e circularidade na produção têxtil (MARTIN BERNETTI/Getty Images)

Segundo o pesquisador Malcolm Barnard, moda é o que as pessoas vestem. O conceito parece simplista, mas quer dizer que a moda, enquanto produção e negócio, é regida por sistemas e restrições industriais, envolvendo aspectos sociais, culturais e ambientais. “A gente pode afirmar que a moda tem uma habilidade e uma certa queda para a inovação e mudanças”, afirma a professora Júlia Valle Noronha, doutora em design pela Aalto University e professora associada na Estonian Academy of Arts.

Essa particularidade de estar constantemente desafiando o status quo junto com o fato de tocar profundamente as emoções e relações socioculturais e ambientais, podem sugerir direções futuras muito promissoras. “Para tentar entender algumas dessas inovações, no entanto, a pergunta importante a ser feita pode não ser exatamente o que é o design de moda,  mas o que o design de moda pode fazer? Quais são seus afetos e suas habilidades, no sentido do que ele pode afetar?”, explica Noronha.

Este e outros assuntos estão sendo debatidos no III Congresso Internacional de Sustentabilidade em Têxtil e Moda, que acontece até o dia 11 de novembro na Universidade de São Paulo. O evento é uma iniciativa do Sustexmoda, grupo engajado com a educação sustentável e na busca de soluções para lidar com os impactos gerados pela cadeia têxtil e a indústria da moda nos âmbitos econômicos, ambientais e sociais, coordenado pela Profa. Dra. Francisca Dantas Mendes (Tita). O evento é presencial e gratuito, tem transmissão ao vivo e conta com diversas rodas de conversa, exposições, apresentações de trabalhos acadêmicos, além de um concurso de upcycling dos alunos da graduação.

Nesta quarta-feira, durante o primeiro dia do evento, foram discutidos os impactos da Agenda 2030 na cadeia de moda e a importância da economia circular. Na roda de conversa sobre economia circular, estiveram, além da professora Noronha, Niki de Schryver, gerente de desenvolvimento de negócios e gestão da cadeia de suprimentos na plataforma online COSH, Denilson do Carmo, modelista especializado em alfaiataria e curador do brechó Gerruza, e Paulo Borges, fundador do IN-MOD, Instituto Nacional de Moda e Design e Economia Criativa.

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“Estou aqui subvertendo o raciocínio para entrar em uma discussão que acho que é o mais importante que tem a ver com a questão [da circularidade]: a do descarte do resíduo. Essa é uma questão que a gente não enfrenta de frente”, afirmou Paulo Borges. Segundo ele, a era industrial de produção e a globalização aumentaram o desejo de consumo, gerando, assim, um desequilíbrio produtivo. “Não é só da moda, não é só uma questão de indústria, é um desequilíbrio que está afetando o mundo em todas as áreas. E o ponto é o que que a gente faz com isso? O que que a gente pode fazer?”, provocou Borges. Para ele é necessário ser provocador e agente consumidor ao mesmo tempo para gerar mudanças efetivas, fazer algo a respeito e deixar de ser apenas um discurso.

O futuro começa hoje

O painel também tratou sobre os microplásticos e a exploração humana na moda, duas realidades que precisam ser solucionadas na cadeia produtiva. Segundo o Fórum Econômico Mundial, a indústria de têxtil e moda representa até 5% das emissões globais de gases de efeito estufa, sendo o terceiro setor mais poluente do mundo, apenas atrás das indústrias de alimentos e de construção. Existe a necessidade urgente para que o próprio setor procure opções mais sustentáveis para produzir, respeitando o meio ambiente e as pessoas envolvidas. A tecnologia pode ser uma ferramenta para auxiliar nas adaptações a caminho de um futuro mais sustentável.

"Se olharmos para toda a informação dos produtos de diferentes materiais presentes em toda a cadeia produtiva, a gente vai começar a coletar tantos dados que o custo, o custo ecológico, de guardar essas informações e reciclar não sairá do custo de produção, irá além das economias ecológicas. Eu gostaria que os estudantes pesquisassem mais sobre isso", compartilhou Niki de Schryver, gerente de desenvolvimento da COSH.

"Uma coisa que eu tenho orgulho de fazer parte é dessa circularidade: Eu vou lá, eu ajudo as instituições da minha região. Eles me ajudam fornecendo a matéria-prima para o meu trabalho e eu ajudo as pessoas a terem acesso a moda em um valor mais acessível. Uma coisa que eu gostaria de sustentar é essa circularidade", concluiu Denilson do Carmo, curador do brechó Gerruza.

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O que é circularidade? 

A circularidade é uma ferramenta para diminuir resíduos produzidos e emissões de CO2. Uma das propostas do SUSTEXMODA foi permitir as discussões sobre a efetividade desse modelo para frear o impacto climático. Muitos teóricos da física, segundo Noronha, estudam a questão da entropia e são críticos à forma como a economia se dá atualmente. Seguindo este raciocínio, um sistema entrópico tem um certo nível de desordem como acontece no sistema atual de produção, onde muitas consequências como o descarte, o uso de energia e a criação de resíduos têxteis cresce exponencialmente.

Por esse motivo, muitos cientistas da sustentabilidade propõem um modelo que sugere uma hierarquia de níveis de transformação para combater a crise climática. No topo, estão as intervenções de baixo impacto, as mais abordadas na pesquisa e também na indústria, pois são bem fáceis de implementar. Um exemplo seria mudar o material de um lote de camisetas de poliéster para algodão orgânico. Embora haja um impacto, a indústria permanece praticamente a mesma.

Existem também as intervenções de médio impacto com uma capacidade de transformação mediana. Por exemplo, o design para circularidade costuma se configurar nessa categoria, pois ele impactará além da indústria da moda e existem mudanças nas abordagens do design também. E a última etapa seriam as intervenções mais difíceis de alcançar, mas que são capazes de realmente efetivar uma transformação, incluindo mudanças de modo de pensar, valores e percepções estéticas – tópicos bastante centrais para a moda. Na discussão, os palestrantes incentivaram os telespectadores a refletir como essa proposta pode agir também nas camadas mais profundas de transformação.

Para participar do evento basta se inscrever neste link.

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