"Chega de teatro": delegados da COP29 levam ultimato após dia morno em negociações
Em recado sobretudo para recém-chegados, ONU eleva o tom e exige que os países participantes comecem a trabalhar com seriedade
Editora ESG
Publicado em 19 de novembro de 2024 às 08h30.
Após mais um dia morno de negociações, que abriu a semana determinante na Conferência do Clima, em Baku, a ONU elevou o tom do debate ao exigir que os países participantes "cortem o teatro" e comecem a trabalhar com seriedade. O apelo surge em um contexto onde sinais recorrentes mostravam que as discussões sobre financiamento climático, tema focal desta COP, permanecem num impasse preocupante.
Além da bronca, outras ações foram tomadas no decorrer da segunda-feira, 18. O Reino Unido e o Brasil foram convocados para a desafiadora missão de mediar, junto com a presidência da COP29, as difíceis negociações que precisam estabelecer um compromisso de pelo menos US$ 1 trilhão anuais para apoiar países em desenvolvimento. Esta convocação específica demonstra a urgência em superar os obstáculos que caracterizaram a primeira semana do evento.
Em pronunciamento para imprensa, Simon Stiell, chefe do clima da ONU, manteve a linha dura de declarações anteriores, salientando que"blefes, jogadas temerárias e manuais premeditados estão queimando um tempo precioso."A mensagem foi endereçada sobretudo aos ministros recém-chegados, para quem avisou: "é hora de "arregaçar as mangas e mergulhar nas questões mais difíceis."
O quebra-cabeça quadridimensional
A divisão entre países ricos e pobres segue como um ponto nevrálgico. As nações em desenvolvimento necessitam urgentemente de recursos tanto para reduzir suas emissões q uanto para enfrentar os impactos climáticos extremos, enquanto os países desenvolvidos são criticados por sua aparente relutância em fornecer o suporte financeiro adequado.
No momento, quatro aspectos determinantes tem sido percebidos como entraves nas negociações, o que foi descrito ao The Guardian pelo ministro australiano Chris Bowen, um dos resposáveis por orientar a trilha financeira das negociações, como um "quebra-cabeça quadridimensional". O primeiro ponto focal envolve estabelecer claramente quanto cada país desenvolvido deve destinar de seus próprios orçamentos nacionais, um tema de frequentes tensões nas discussões.
Em paralelo, é necessário definir precisamente qual será o papel do setor privado no esquema de financiamento, incluindo mecanismos de incentivo e obrigações específicas. O terceiro aspecto, igualmente complexo, trata da necessária expansão da base de contribuintes para além dos países tradicionalmente doadores, buscando incluir tanto as economias emergentes, com maior capacidade financeira atualmente, quanto os petroestados, cuja responsabilidade nas emissões é histórica.
Por fim, mas não menos importante, será preciso estabelecer um cronograma claro e realista para o cumprimento dessas metas financeiras, definindo marcos intermediários e prazos finais que sejam tanto ambiciosos quanto factíveis.
Caso Paquistão é lembrete da inércia
Na busca por uma "zona de aterrissagem" para o acordo final, o Brasil e o Reino Unido devem enfrentar pontos críticos nos aspectos supracitados, com desafios adicionais para incluir economias emergentes como China e os petroestados, a exemplo da Arábia Saudita. A costura esperada também depende das mãos de outra dupla ministerial, formada por Chris Bowen e Yasmine Fouad, ministra do Meio Ambiente do Egito. Juntos, os representantes lideram as tratativas da Nova Meta Climática Global (NCQG,sigla em inglês para New Collective Quantified Goal ).
O entendimento e definição da NCQG é fundamental para destravar os diálogos, e abrange desde a necessária reforma da arquitetura financeira global - fundamental para garantir a efetiva distribuição do financiamento climático - até questões técnicas sobre o escopo da nova meta climática, incluindo se a NCQG reporta exclusivamente ao Acordo de Paris ou se incluirá também a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Clima (UNFCCC).
Em um alerta sobre as consequências da quase inércia que se observa, a senadora paquistanesa Sherry Rehman, lembrou as consequências das enchentes de agosto de 2022 no país. Shery era ministra do meio ambiente na época, quando um terço do Paquistão foi duramente impactado, deixando 8 milhões de pessoas desabrigadas e resultando em dezenas de bilhões de dólares em danos.