Juros: a precificação embutida na curva de juros já acumula até o final do ano uma redução de mais de 25 pontos percentuais (thiagonori/Getty Images)
Ligia Tuon
Publicado em 5 de junho de 2019 às 06h00.
Última atualização em 5 de junho de 2019 às 06h00.
O mercado financeiro amplia as apostas em alívio monetário, em contraste com o discurso cauteloso do Banco Central, interpretado por economistas como sinal de manutenção da Selic no curto prazo. A precificação embutida na curva de juros já acumula até o final do ano uma redução de mais de 25 pontos percentuais.
Segundo dados compilados pela Bloomberg, o corte já está parcialmente precificado para entre setembro e outubro, que são os meses nos quais os investidores esperam a aprovação da reforma da Previdência na Câmara.
Além dos sinais recentes de melhora na coordenação política do governo, as apostas do mercado também refletem a deterioração da atividade econômica no Brasil e no exterior, a queda generalizada dos juros dos títulos soberanos no mundo e a desaceleração da inflação.
O IPCA de maio deve desacelerar para 0,2% e, para junho, já surge expectativa de deflação mensal, o que poderia levar a inflação em 12 meses para abaixo do centro da meta.
O BC terá espaço para cortar a Selic se a reforma for aprovada e o dólar cair, diz Gustavo Rangel, economista-chefe para América Latina do ING, em Nova York.
As apostas em cortes da Selic ocorrem em um cenário global de busca por alívio monetário, onde cresce a visão de que o Federal Reserve terá de voltar a reduzir as taxas, sob os riscos trazidos pela guerra comercial entre EUA e China. Na América Latina, o Chile recentemente surpreendeu dizendo que pode reduzir os juros, ao contrário da indicação anterior. “Tendência global é crescimento e inflação baixos”, disse Rangel.
Para ele, o fato de o BC persistir com um discurso conservador é explicado em parte pela intenção de se contrapor a algumas visões mais explicitamente favoráveis à redução da Selic, até mesmo desatreladas da aprovação das mudanças na Previdência. O economista considera que o Copom deve sim esperar a reforma e está adotando uma cautela típica de banqueiro central.
A ata da última reunião do Copom disse que, embora o risco associado à atividade tenha se elevado, o balanço de riscos para a inflação ainda se mostrava simétrico - ou seja, sugeria possibilidades equivalentes tanto de alta quando de baixa da inflação, indicando que os juros não precisariam ser alterados. O BC também reiterou o que tem sido sua tônica desde antes da atual gestão de Roberto Campos Neto: a consolidação do quadro favorável para a inflação depende das reformas.
A linha de discurso sustentada pelo BC em seus últimos documentos e declarações não poderá mais ser mantida na decisão de 19 de junho, porque muita coisa mudou, diz José Francisco Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator. Por isso, segundo ele, o discurso será alterado, numa sinalização para que o corte aconteça na reunião seguinte, em julho. “Não há como falar em recuperação gradual da economia.”
Para ele, a percepção sobre as reformas estará bem mais consolidada e o ambiente de avanço no processo será suficiente para reverter o balanço de riscos, mesmo antes da aprovação pelo plenário da Câmara.
Já na avaliação de Solange Srour, economista-chefe da ARX Investimentos, o discurso do BC não poderia ter outro tom que não o de cautela - o que deve ser mantido até a aprovação da reforma em 1º turno na Câmara. “O BC tem sinalizado que a incerteza fiscal é preponderante e isso não estará resolvido até a próxima reunião do Copom."
Segundo Solange, que não conta com corte de juros neste ano, é difícil mensurar imediatamente o impacto da reforma nas projeções de inflação. “Mas, obviamente, o mercado está aí para apostar."
O BC disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que não iria comentar